Os desembargadores estavam numa sessão da Câmara Única que julgava uma ação por posse de terras movida pela empresa Cachoeira Caldeirão contra o advogado Adaian Lima de Souza, de 47 anos. O advogado, que faria a própria defesa, estava inscrito para fazer a sustentação oral. Durante a fala, ele revelou que o filho caçula foi diagnosticado com autismo há dois anos, e, há algumas semanas, ele próprio também foi identificado com o TEA.
“Percebendo algumas características peculiares dele, resolvi investigar a mim. Para a minha surpresa, no dia 1º de novembro deste ano, também fui diagnosticado com autismo e TDAH nível 2. Minha mãe foi quem mais lutou quando eu tinha as minhas dificuldades escolares”, comentou ele.
Adaian e a família moram em Porto Grande e o tratamento é realizado em Macapá. A mãe é servidora pública, e, mesmo com a redução de horários, não consegue estar em todas as terapias. É o pai quem tem que trazer o menino. Ontem, ele tinha terapia, e o pai tentava adiar a sessão no Tjap.
“Repasso isso para fazer um pleito a vossas excelências. Houve pedido meu dentro do processo para que essa arguição não seja hoje. Com respeito à decisão (que negou adiamento), me senti discriminado em nome de toda comunidade autista. As terapias são urgentes e necessárias. Meu filho não falava ‘papai’ até os 3 anos. Hoje, depois das terapias, ele fala pelos cotovelos”, brincou.
Direito individual
O desembargador Carlos Tork, que é o relator do processo, entendeu que não era cabível o adiamento porque o Regimento Interno do Tribunal estipula o dia da semana para julgamentos na Câmara Única.
“O nosso regimento interno dispõe que é a terça-feira de manhã (julgamentos). Verifiquei que mediante os interessantes coletivos e públicos não poderia sobrevir o direito individual, ainda que com característica especial”, justificou o relator.
O desembargador Rommel Araújo, no entanto, levantou uma questão de ordem citando os direitos constitucionais de proteção à criança e o adolescente. Para ele, a questão envolve a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente e também a Lei 12.664/2012, que instituiu a política nacional de proteção da pessoa com transtorno do espectro autista (TEA).
“Para motivos menos importantes fizemos aqui na Câmara (Única) sessões extraordinárias. Vejo que o motivo aqui trazido é muito mais relevante, e que esse processo seja pautado em uma sessão extraordinária, mesmo que seja para julgar um único processo, mas observando os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e proteção das pessoas com deficiência”, ressaltou Rommel Araújo.
Com exceção de Carlos Tork, que já presidiu o Tribunal, todos os desembargadores concordaram que, no caso deste processo, a sessão não seja realizada às terças-feiras para não atrapalhar a terapia do menino. O desembargador João Lages foi além, e sugeriu que o Pleno do Tribunal discuta uma mudança no regime interno para abrir exceções em casos semelhantes.
O julgamento de ontem acabou sendo adiado com os pedidos de vistas de Rommel Araújo e João Lages.
Por Seles Nafes
Fonte: @seles_nafes
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