Como será a volta às aulas presenciais no Brasil?

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bit.ly/3fhxZiG | A reabertura das escolas foi assunto na reunião ministerial da última terça-feira (9). O presidente Jair Bolsonaro afirmou que, agora, pode haver menos resistência à volta das atividades escolares, usando como argumento um estudo divulgado pela Organização Mundial da Saúde, que definiu transmissões assintomáticas como “raras” .

A justificativa usada pelo presidente, entretanto, já foi rebatida por epidemiologistas de vários países, com estudos que apontaram para a transmissibilidade do Sars-CoV-2 por pacientes que não expressam sintomas. A própria OMS se retratou depois e alertou que há perigo de pessoas pré-sintomáticas transmitirem o vírus. A agência reforçou que os estudos sobre assintomáticos ainda não são muito abrangentes.

Com discussões como essas, muito se fala sobre as voltas às aulas presenciais, depois de cerca de três meses de quarentena. Apesar dos planos, o cenário ainda é de incerteza, marcado pelo embate de autoridades, professores e especialistas, entre argumentos econômicos, educacionais e de saúde.

Em São Paulo, estado com maior número de mortes por conta do coronavírus, ainda não há uma data definida para o retorno. Segundo a Secretaria Estadual de Educação, “a retomada será gradual e regionalizada, seguindo o que os dados científicos sobre a epidemia indicarem em cada região do Estado. As diretrizes devem ser apresentadas à sociedade nas próximas semanas”, informou, em nota. A pasta vem realizando reuniões com instituições públicas e privadas para organizar a retomada planejada das aulas presenciais.

Já no Tocantins, outro estado muito afetado pelo vírus, o governo estuda um plano de retomada das atividades presenciais, começando pelos alunos do terceiro ano do Ensino Médio, no dia 3 de agosto. A ideia é fazer um revezamento: uma semana, metade da turma participa presencialmente, enquanto a outra metade desenvolverá atividades em casa, seguindo os roteiros de estudos, que serão validados na semana seguinte, quando estarão fisicamente na escola. Depois, o formato será ampliado para as outras etapas de ensino até 31 de agosto.

Rede municipal

O prefeito Marcelo Crivella, do Rio de Janeiro, divulgou no dia primeiro de junho um programa de retomada das atividades na cidade que determina para uma terceira fase de abertura (prevista para julho) a volta das atividades presenciais em creches e escolas do Ensino Fundamental das redes pública e privada. A medida foi alvo de crítica de professores e especialistas.

Em nota, o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro (Sepe-RJ) afirmou que “a reabertura das unidades públicas de ensino é uma afronta ao bom senso e às medidas preconizadas pela OMS e outros órgãos ligados ao setor de Saúde”. A escolha de Crivella de começar com a educação infantil foi outro ponto criticado pelo sindicato, que ressaltou a impossibilidade de se evitar contato físico nessa idade. O Ministério Público e a Defensoria Pública do Rio de Janeiro também repudiaram a abertura de escolas, conforme vem denunciando o Sepe-RJ.

A Aprofem, Sindicato dos Professores e Funcionários Municipais de São Paulo, também se posicionou em relação ao retorno das aulas presenciais. Em ofício à Secretária Municipal da Educação da cidade, na segunda-feira (8), a instituição solicitou que o órgão “assegure o diálogo com as Entidades Representativas, bem como canais de recepção de sugestões dos professores e demais servidores da Rede Municipal de Ensino, preliminarmente à formatação do esperado plano de retorno no âmbito da Educação Municipal de São Paulo”.

Rede particular

Para as escolas particulares o futuro também ainda é incerto, mas enquanto aguardam o decreto que vai autorizar a retomada das aulas presenciais, algumas escolas particulares já começaram a desenvolver medidas de prevenção contra o coronavírus. É o caso da Luminova, uma rede de ensino particular.

“Criamos um grupo de trabalho com representantes das diversas áreas da escola, para discutir temas nos pilares operacionais, serviços, estrutura física e pedagógica. Cada representatividade participa do todo, mas influencia claramente mais a sua área de atuação”, explica o diretor acadêmico da Luminova, Luiz Magalhães.

A equipe, então, já começou a preparar uma série de recomendações para o retorno das atividades sem comprometer a saúde de funcionários, professores, pais e alunos. Entre as ações estão, por exemplo, medição de temperatura na entrada, álcool gel em todos os corredores e salas de aula, nova disposição das carteiras respeitando a orientação de maior espaçamento entre alunos. Além das adaptações dos bebedores e distribuição de garrafas para consumo de água, e o um novo esquema de entrega da cantina para a sala de aula, evitando maiores aglomerações.

O diretor conta que, apesar das ações, é claro que existem dúvidas em relação ao retorno, desde a insegurança dos pais para mandar os filhos para a escola até as dificuldades que cada um terá com o currículo, quando os conteúdos ensinados agora forem retomados. Outra preocupação envolve o distanciamento das crianças menores, que não têm dimensão do perigo e da importância de não se abraçarem quando retornarem as atividades. “Nosso papel é ir construindo respostas na incerteza”, afirma.

Em conjunto com a Clínica Infantil Santa Isabela, Sociedade Brasileira de Pediatria, Associação Paulista de Medicina, Sindicato dos Hospitais e Clínicas de São Paulo e Federação dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo, o Sindicato dos Estabelecimentos Privados do Estado criou um plano de retorno às aulas. Mas o protocolo, em função da vigência da Lei de Calamidade Pública, só poderá ser colocado em prática após aprovação do Estado.

“Há webinars, conferências, congressos que nos mantêm em contato para a troca constante de aprendizados e experiências dessa quarentena. É hora de somar esforços e, embora haja concorrência, é preciso frisar que não existe inimizade entre as instituições”, afirma Magalhães.

Exemplos de fora

Muitos países já conseguiram retornar às atividades escolares e podem serem observados por educadores brasileiros, que estão pensando no planejamento de volta às aulas. Claro que é necessário considerar as diferentes realidades e estruturas de cada país e como ele foi afetado pela pandemia.

Na Alemanha, as escolas reabriram parcialmente para crianças pequenas, com regras de distanciamento social e desinfecção. Na Bélgica, por exemplo, eles permitem apenas 10 crianças por sala. Já a Grécia optou pela volta presencial apenas para os estudantes de final de curso, fazendo rodízio entre as classes, com aulas em dias alternados. Nos Estados Unidos, as regras são definidas particularmente por cada estado.

O caso da França alerta todos os países sobre a complexidade de reabrir os espaços escolares físicos. Uma semana após o retorno de um terço das crianças do país, foram mapeados novos casos de coronavírus em 70 escolas reabertas. O governo decidiu, então, fechá-las como precaução.

Recuperação da aprendizagem

É evidente: a pandemia afetou fortemente a educação no Brasil. Escolas e professores, alunos e famílias, sem ensaios ou experiências prévias, precisaram se adaptar ao ensino emergencial remoto. Se não bastassem a mudança repentina e o despreparo, os números do acesso à internet e equipamentos no país mostraram que essa nova realidade afastou ainda mais jovens periféricos do direito ao conhecimento: segundo a pesquisa TIC Educação 2019, divulgada recentemente, 39% dos estudantes de escolas públicas urbanas não têm computador ou tablet em casa.

O Todos Pela Educação lançou uma nota técnica com as questões relevantes a serem consideradas na futura reabertura das escolas, entre elas, as lacunas significativas no aprendizado, especialmente daqueles alunos em situação de maior vulnerabilidade. Segundo o estudo, as evidências mostram “a necessidade de a reorganização do calendário escolar prever, com bastante ênfase, ações pedagógicas para promover a recuperação da aprendizagem dos alunos”.

Nesse sentido, um ponto central a ser considerado, logo após a reabertura das escolas é a aplicação de avaliações diagnósticas, que apontarão as matérias a serem priorizadas e como os professores deverão se organizar para realização dos projetos de recuperação. Para isso, os profissionais precisam de um suporte e de uma formação especial. Essa avaliação e esse acompanhamento com o aluno se estenderiam, tornando-se frequente, como um processo.

Outra preocupação são com os impactos psicológicos da pandemia e do ensino a distância. O pesquisador do Massachusetts Institute of Technology (MIT) Justin Reich, responsável pelo estudo que acompanha as escolas americanas durante a pandemia, acredita que o papel da educação na volta às aulas deve ser mais de acolhimento do que de passar novos conteúdos.

Em entrevista ao Estado de S.Paulo, Reich afirmou que “o ideal seria que elas se concentrassem em celebrar a resiliência e o aprendizado dos alunos durante o isolamento, construindo comunidades, atendendo às necessidades de saúde e emocional dos alunos, identificando o que precisa ser revisto ou retomado”.

Por Juliana Morales
Fonte: guiadoestudante.abril.com.br

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