Na grande maioria dos imbróglios imobiliários que recebemos podemos observar que a falta de averbação costuma ser um fato muito comum. Por certo, parece regra a falta de averbação das construções. Não existe mesmo um bom hábito em manter regular no Registro Imobiliário a propriedade, com isso sempre temos mais trabalho para regularizar um cadastro registral. Isso é muito comum em Inventários e na Usucapião o problema da falta de averbação de construções também pode estar presente.
Não podemos perder de vista a regra clássica do Código Civil que informa aderirem ao principal os acessórios (art. 92). Corolário disso é a regra do art. 1.253 segundo a qual "Toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário". Em sede de Usucapião desimporta o fato de as construções edificadas sobre o terreno estarem ou não averbadas no Registro Imobiliário: repousada a prescrição aquisitiva (que é inegável situação fática) sobre a coisa como se encontre, se mostrará irrelevante o fato de as edificações não estarem averbadas no fólio registral, já que uma vez edificadas sobre o terreno seguirão este "principal", a ele se incorporando, devendo registrado pelo Oficial do RGI a situação como se encontrar, sob o véu da prescrição aquisitiva, como sinaliza a doutrina especializada de KÜMPBEL e FERRARI (Tratado Notarial e Registral. 2020):
"(...) A despeito de posicionamentos em contrário, entende-se que o CARÁTER ORIGINÁRIO DA USUCAPIÃO sobrepor-se-ia à observância da FORMALIDADE REGISTRÁRIA pelo titular primitivo, de modo que, atendidos os REQUISITOS LEGAIS para a aquisição da propriedade por usucapião, a REALIDADE DE FATO deve ditar a realidade registral, e não o contrário. (...) O mesmo raciocínio se estende à usucapião de imóvel constituído por terreno e construção. Mesmo que na matrícula originária conste APENAS O TERRENO, e a usucapião englobe construção nele acedida e NÃO REGULARIZADA, não deve ser exigida a averbação da construção para o devido registro da usucapião. Sendo a usucapião modalidade ORIGINÁRIA de aquisição da propriedade, rompe com o PRINCÍPÍO DA CONTINUIDADE OBJETIVA".
Efetivamente temos que a solução se coaduna com perfeição - como deveria mesmo ser - à USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL, que é aquela resolvida sem processo judicial, com assistência obrigatória de ADVOGADO. A regra também consta do Provimento CNJ 65/2017 que regulamenta a Usucapião em Cartório e permite a usucapião de imóveis edificados independentemente de apresentação de "habite-se" (art. 20, par.3º).
No pedido (seja ele judicial ou extrajudicial) deverão ser demonstrados todos os requisitos exigidos por Lei para a modalidade pretendidade de Usucapião e, se for o caso de usucapião sobre imóvel que no RGI conste ainda como TERRENO e existentes edificações sobre ele, igualmente deverão ser demonstradas a existência das acessões.
POR FIM, a jurisprudência do TJSP que com o acerto de sempre lapidou a sentença do juiz de piso para esclarecer que as acessões (acessórios) devem estar incluídas na aquisição do terreno (principal), sendo certo sua inscrição no fólio registral deve ser dar por conta do título aquisitivo (no caso a sentença que reconheceu a prescrição aquisitiva) e não de forma administrativa:
"TJSP. 9000021-38.2005.8.26.0100. J. em: 19/03/2015. APELAÇÃO – Ação de Usucapião Extraordinário. Sentença de procedência, que declarou o domínio dos autores sobre o terreno descrito na inicial e determinou que a averbação da construção fosse feita de forma administrativa. Inconformismo dos autores. Pretensão ao descerramento da matrícula, com a averbação da construção existente. Aquisição de domínio pela usucapião do terreno que deve incluir as acessões existentes nele. Averbação da edificação que deve decorrer do título aquisitivo já obtido pelos autores, e não de forma administrativa. Recurso provido".
Por Julio Martins
Fonte: www.juliomartins.net
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