“É imperioso que se demonstre que a conduta gerou algum perigo que implique violação ao bem jurídico tutelado, que é a incolumidade pública e a segurança viária”, ponderou a magistrada, ao absolver o réu com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal (não constituir o fato infração penal).
De acordo com os autos, o acusado foi abordado de forma aleatória por dois policiais militares na praça de pedágio da Rodovia Cônego Domênico Rangoni. Convidado a se submeter ao teste do bafômetro, ele não se opôs e o resultado acusou a concentração de 0,4 miligrama de álcool por litro de ar alveolar — superior ao limite legal de 0,3 ml/l.
Com base no caput e no parágrafo 1º do artigo 306 da Lei 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), que considera crime a condução de veículo automotor “com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência”, os patrulheiros conduziram o motorista à delegacia.
Autuado em flagrante, o acusado foi liberado após pagar fiança. O Ministério Público o denunciou e pleiteou em alegações finais a sua condenação com base no resultado do teste de bafômetro. Na hipótese de condenação, ele estaria sujeito a pena de detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão da habilitação para dirigir.
Perigo abstrato
Segundo a juíza, apenas pela concentração de álcool constatada em teste de etilômetro, “inclusive pouco acima do previsto em lei”, não é possível afirmar que a capacidade psicomotora estivesse alterada por embriaguez. “Logo, ainda que se trate de crime de perigo abstrato, é indispensável a constatação de um mínimo de risco à coletividade”.
Lívia Costa reconheceu que o tipo penal do artigo 306 do CTB, por ser de perigo abstrato, não exige a existência de vítimas específicas ou a ocorrência de acidente para se vislumbrar a lesividade da conduta do agente. Contudo, sustentou que o réu deve ser absolvido se não for gerado risco ao bem jurídico tutelado pela norma.
“A expressão ‘perigo abstrato’ revela que deve haver algum perigo no cenário delitivo, o que não se pode presumir sem qualquer evidência fática”, destacou a juíza. Ela anotou que os próprios PMs afirmaram ter abordado o réu sem que ele dirigisse de modo imprudente ou apresentasse sinais visíveis e inequívocos de embriaguez.
Com a ressalva de que não defende o comportamento de quem ingere bebida alcóolica e assume a direção de veículo, a julgadora concluiu que “a conduta do acusado não expôs a segurança viária a risco algum, o que, diante do princípio da intervenção mínima do Direito Penal, indica como suficiente a punição no campo administrativo”.
O promotor Geraldo Márcio Gonçalves Mendes recorreu da absolvição. Nas razões de sua apelação, ele argumentou que, sendo a segurança viária o objeto jurídico do delito, não se exige a demonstração de risco real para a sua configuração, bastando o agente dirigir sob efeito de álcool em quantidade superior à permitida para o crime se consumar.
- Processo 1501272-59.2024.8.26.0536
Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: @consultor_juridico
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