As taxas condominiais, a inadimplência e o coronavírus

taxas condominiais inadimplencia coronavirus sindico competencia
bit.ly/2wHRpMU | Sobre o tema, abordo de maneira sucinta a responsabilidade e as limitações do Síndico para negociações com condôminos inadimplentes, trazendo, ao final, uma reflexão sobre a importância dos acordos.

DA RESPONSABILIDADE DO SÍNDICO

É do síndico a responsabilidade pela gestão do patrimônio do condomínio, competência essa que, dentre outras, encontra-se prevista especialmente no artigo 1.348 do Código Civil.

Art. 1.348. Compete ao síndico:

I - convocar a assembleia dos condôminos;

II - representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns;

III - dar imediato conhecimento à assembleia da existência de procedimento judicial ou administrativo, de interesse do condomínio;

IV - cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia;

V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores;

VI - elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano;

VII - cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas;

VIII - prestar contas à assembleia, anualmente e quando exigidas;

No entanto, é importante apontar que, sendo o patrimônio do condomínio também de cada condômino, dentro de sua fração ideal, o Síndico, apesar de ter o dever de observar a Convenção do Condomínio, executa as determinações da Assembleia dos Condôminos.

Diante desses aspectos e das questões relativas à pandemia que estamos enfrentando, os síndicos, ainda que estejam agindo de boa-fé e com espírito comunitário, não poderão contrariar o disposto na Convenção do Condomínio.

Assim, caso alguma decisão a ser tomada, em medida de urgência, contrarie a Convenção, o Síndico precisará convocar uma Assembleia e abrir votação sobre o tema.

DA CONVOCAÇÃO DA ASSEMBLEIA EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS

O Síndico deverá convocar a Assembleia de Condôminos seguindo as regras previstas na convenção do condomínio ou, na sua falta, na lei civil.

Em razão da pandemia, o artigo 16 do Projeto de Lei nº 1.179/2020, traz a possibilidade da Assembleia condominial, seja ordinária ou extraordinária, ocorrer em caráter emergencial e por meios virtuais, considerando a manifestação de vontade do condômino equiparada à sua assinatura presencial.

NOTA DE ESCLARECIMENTO: O referido Projeto de Lei, até a publicação deste artigo (13/04/2020), encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados para votação, após ter sido aprovado pelo Senado Federal, e posteriormente seguirá para sanção ou veto do atual Presidente da República.

DA CONCESSÃO DE DESCONTOS

Em análise à competência do Síndico, entendemos, que, EM REGRA, ele não pode conceder descontos por si mesmo, pois estaria renunciando créditos de terceiros, o que é ilícito, e poderia então ser condenado a indenizar o condomínio em razão do desconto indevidamente concedido.

De acordo com o artigo 1.350 do Código Civil, as despesas do condomínio devem ser apresentadas em Assembleia, seguido de aprovação do rateio e das contas.

Art. 1.350. Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembleia dos condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno.

Também sobre o tema, dispõe o artigo 24 da Lei 4.591/64, bem como corrente majoritária:

- COTAS. REAJUSTE PELO SÍNDICO -"A fixação das contribuições mensais dos Condôminos é privativa da Assembléia Geral para tanto convocada, não podendo ser elevada ao alvedrio do Síndico. O art. 24 da Lei 4.591/64,"Lei de Condomínios", estabelece como atribuição da Assembléia Geral a aprovação, por reunião ordinária anual, das verbas para as despesas do Condomínio, não se incluindo tal decisão no rol das atribuições e dos poderes do Síndico. Assim, não há como possa o Síndico aumentar o valor das contribuições a ele devidas pelos Condôminos sem a convocação da Assembléia, o que torna ilegais os aumentos havidos." (TA-RJ - Ap. 81.635 - Rel. Juiz Eduardo Rabello - cf. D. Villas Boas - "Condomínio e Locação"op. Cit. P. 74).

Assim, há grande divergência quanto à possibilidade de concessão de desconto, mesmo diante da aprovação por 2/3 dos Condôminos em Assembleia, pois, quando um desconto é concedido a algum condômino, o custo das contas do condomínio aumenta proporcionalmente para os demais. Desta forma, com o rateio, o valor que o inadimplente deixaria de pagar sobraria para o adimplente.

DA CONCESSÃO DE PARCELAMENTOS

Já para a concessão de um parcelamento, o entendimento jurisprudencial é de que o Síndico não precisa convocar a Assembleia em razão de sua competência como representante do condomínio, prevista no Artigo 1348, II do CC, desde que não viole disposição da Convenção Condominial.

Importante, no entanto, que cada caso seja analisado à luz da Convenção específica, especialmente no capítulo que versa sobre as atribuições do síndico, embora existam regras gerais que devam ser observadas.

Cabe ainda destacar que o parcelamento concedido deve ter início e término dentro o período de seu mandato.

DOS JUROS E MULTAS

Apesar de ser competência do síndico impor e cobrar as multas devidas (artigo Art. 1.348, VII do CC), ele não possui autonomia para liberar o condômino quanto ao pagamento de multas e juros, devendo impô-las nos termos do artigo 1.336, I, § 1º do Código Civil.

"Art. 1.336. São deveres do condômino:

I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;

1º. O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito."

Desta forma, esse tema também deverá ser analisado e votado em Assembleia.

DA UTILIZAÇÃO DO FUNDO DE RESERVA

Muitos têm sido os questionamentos sobre a possibilidade ou não de utilização dos Fundos de Reserva nesse momento de crise geral.

Ocorre que, em síntese, o fundo de reserva é um estoque de dinheiro feito para dar suporte financeiro a futuros investimentos do condomínio, como obras e manutenções ou pagamento de despesas emergenciais, não tendo, portanto, o condão de ser utilizado para conceder alívio financeiro aos condôminos, mas sim para manutenção do próprio condomínio.

Nesse sentido, o doutrinador Arnado Rizzardo entende que esses fundos são:

“Para atender despesas especiais, não previstas, e que sempre aparecem, sendo que, às vezes, inesperadamente, tem-se adotado a cobrança de um valor destinado a atender essas situações, de sorte, a não se precisar acrescer o valor da taxa condominial através de chamadas extraordinárias. Cobra-se de cada condômino uma quantia mensal própria, que não se destina a satisfazer uma obrigação vencida e exigível, para a cobertura de gastos ocorridos, mas tem por escopo constituir uma reserva para fazer frente a certas eventualidades que impõe gastos urgentes e inadiáveis, sem necessidade de acorrer subitamente aos condôminos”. (Condomínio edilício e incorporação imobiliária / Arnaldo Rizzardo. – 6. ed.,rev.,atual. e ampl. – Rio de Janeiro, 2018).

O entendimento do Tribunal de Justiça é no mesmo sentido, conforme desta:

Despesas de condomínio. Fundo de reserva. Natureza extraordinária, eis que destinado a atender despesas urgentes e imprevistas. Embora a condômina tenha sido nomeada síndica, ficando isenta do pagamento das despesas ordinárias, subsiste a obrigação de pagamento da quota relativa ao fundo de reserva, eis que tal verba tem natureza extraordinária. Sentença mantida Recurso não provido.

(TJ-SP - APL: 00835629220098260000 SP 0083562-92.2009.8.26.0000, Relator: Manoel Justino Bezerra Filho, Data de Julgamento: 10/04/2013, 28ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 10/04/2013).

A utilização do fundo de reserva deve estar regulamentado na Convenção do Condomínio.

Caso não haja menção sobre o tema, quando houver necessidade do uso dessa arrecadação, uma Assembleia deverá ser convocada para que seja votada sua utilização e ratifica-la em Ata.

CASO A PROPOSTA DE ACORDO SEJA NEGADA

Caso não haja possibilidade de acordos, com base no artigo do CPC, o condômino que não deseja ficar inadimplente, mas deseja efetuar pagamento dentro de suas condições afetadas em razão da pandemia, poderá apresentar sua proposta de acordo a juízo, onde será apreciada de forma específica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, imperioso destacar que um acordo, ainda que tenha que ser levado a uma Assembleia de Condôminos, vale a pena para ambas as partes.

Isto porque, para o condômino, ficar inadimplente trará perdas materiais significativas, tanto pelo montante de juros e mora com o qual deverá arcar, quanto pelo risco da perda de seu imóvel através de uma futura ação judicial.

Ademais, em razão do Código de Processo Civil de 2015 ter caracterizado as cotas condominiais como títulos executivos, é possível leva-las a protesto e incluir o nome do condômino devedor nos serviços de proteção ao crédito.

Inclusive, destaco não ser juridicamente possível a ideia que algum condômino poderá simplesmente parar de pagar a taxa condominial em razão da pandemia.

Existe uma grande quantidade de despesas que o condomínio não pode simplesmente deixar de arcar, sob pena de causar maior prejuízo diante da falta de manutenção e conservação das áreas comuns, colocando em risco a saúde e segurança dos próprios moradores.

Apesar da viabilidade de suspender ou adiar as despesas "não essenciais" ser uma alternativa válida para o atual cenário, "cortar" todas as despesas é impossível.

Por seu turno, aponto que firmar um acordo com o condômino de boa-fé que está realmente sofrendo depreciação econômico-financeira em razão da pandemia, ainda que tenha que ser levado a uma Assembleia de Condôminos, vale a pena para o condomínio.

Isto porque, contextualizando a situação, o condômino que ficou desempregado ou teve sua renda significativamente afetada em razão da pandemia, certamente preferirá pagar outras contas com juros e taxas maiores do que a cota condominial, a qual, legalmente só pode ser corrigida monetariamente, com juros de até 1% e multa de 2% ao mês.

Ademais, ações judicias de cobrança de cotas condominiais se arrastam por anos.

Por fim, é importante que síndicos, administradores e toda a assembleia de condôminos entendam que a inadimplência em condomínios causa desequilíbrio nas contas e pode, nos casos mais severos, levar à interrupção da prestação de serviços básicos, trazendo prejuízos a todas as partes envolvidas na relação. Motivo principal pelo qual nota-se a importância da formalização de acordos.

#coronavirus #covid19 #brasil #china #advocacia #direitoimobiliário #direito #condominios #sindico #sindicos #administradoradecondominio #locações #aluguéis #locador #locatário #proprietario #códigocivil #crise #pandemia #acordos

FONTE:

LEI Nº 4.591, DE 16 DE DEZEMBRO DE 1964.

LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002 .

Condomínio edilício e incorporação imobiliária / Arnaldo Rizzardo. – 6. ed.,rev.,atual. e ampl. – Rio de Janeiro, 2018
___________________________

Samantha Oliveira é advogada especialista em direito imobiliário e empresarial, e oferece serviços para guiar todos aqueles que precisam de auxílio administrativo ou jurídico em todo o território nacional.

Entre em contato:

- Email: advogados@samanthaoliveira.com.br
Siga nossas dicas nas redes sociais:
- Instagram: @advogados.samanthaoliveira
- Facebook: Samantha Oliveira
Conheça o site:
www.samanthaoliveira.com.br

Samantha Oliveira
Especialista em Direito Imobiliário
"O Direito não socorre aos que dormem".
Fonte: samanthaoliveiradescomplica.jusbrasil.com.br

0/Comentários

Agradecemos pelo seu comentário!

Anterior Próxima