Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem em Habeas Corpus para proibir que o juiz de primeiro grau responsável por uma ação penal aproveite atos realizados a partir das audiências anuladas por decisão judicial.
O caso trata de réu inicialmente condenado a 73 anos e 10 meses de reclusão, por integrar organização criminosa dedicada a extorsão e lavagem de dinheiro. O processo foi anulado graças ao protagonismo da juíza da causa na audiência de inquirição de testemunhas.
Em 2021, o Supremo Tribunal Federal considerou violado o artigo 212 do Código de Processo Penal e reconheceu a nulidade do processo-crime a partir da audiência de instrução, com determinação de renovação do ato.
Como não houve determinação expressa de desentranhamento (exclusão) das provas produzidas a partir dessa audiência anulada, o juízo considerou-as válidas e se limitou a renovar a inquirição das testemunhas.
Para a defesa, o desentranhamento das provas posteriores à audiência anulada é consequência lógica da ordem proferida pelo STF. Alegou prejuízo porque a manutenção dessas provas permitiu à acusação se nortear pelos relatos antigos e anulados das testemunhas.
O Tribunal de Justiça de São Paulo negou o desentranhamento porque não houve ordem do STF nesse sentido. Considerou ainda que, renovada a instrução com o mesmo juiz, mesmos advogados e mesmo promotor, não seria possível extirpar da lembrança tudo o que ocorreu na audiência anulada.
Relatora no STJ, a ministra Laurita Vaz deu razão à defesa. Apontou que, embora o acórdão do STF não tenha expressamente determinado o desentranhamento das provas, essa é medida que se impõe, com base no artigo 157 do Código de Processo Penal.
A norma diz que "são inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais". Essa ordem alcance, inclusive, cartas precatórias e reconhecimento pessoal, posteriores à audiência anulada.
A relatora ainda acrescentou que ficou claro, no caso, que o Ministério Público reaproveitou a transcrição dos depoimentos prestados anteriormente na audiência anulada. Ou seja, a nulidade alcançou atos posteriores, em prejuízo à defesa.
O voto da relatora foi implementado por considerações feitas pelo ministro Rogerio Schietti, que proferiu voto-vista. Para ele, o desentranhamento deve ser feito para impedir que os atos anulados produzam efeitos, ainda que indiretos, na nova instrução e no novo julgamento.
"Isso porque, embora preservada a higidez das fontes de prova (pessoas a serem ouvidas), o que permite a renovação da colheita dos depoimentos, a permanência, nos autos, do que foi anulado tem aptidão para influenciar e, com isso, macular as novas provas a serem produzidas", concluiu.
HC 744.002
Por Danilo Vital
Fonte: Conjur
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