“Concluo em sede de juízo de retratação e até por ter sido o magistrado que presidiu toda a instrução criminal, que há de se considerar prioritária e básica a versão do acusado centenário, pois nascido em 8 de julho de 1923, já qualificado nos autos, versão realmente extreme de dúvidas, devendo necessariamente afastar e modificar a decisão recorrida, no sentindo de bem acolher e destacar a égide do artigo 25 do Código Penal”, justificou Vilebaldo Pereira.
A absolvição derrubou decisão de pronúncia da juíza Andréa Teixeira Lima Sarmento Netto, para quem o réu deveria ser submetido a julgamento popular porque, conforme as provas dos autos, “subsistem indícios suficientes de autoria quanto ao crime doloso contra a vida retratado na inicial acusatória, ensejando, portanto, a viabilidade da imputação”. Ela destacou que a sua decisão foi simples juízo de admissibilidade da acusação, que não exige os requisitos de certeza de uma condenação.
Seletividade de versões
A discrepância entre os juízes da 2ª Vara do Tribunal do Júri, que agora será objeto de apreciação do TJ-BA, muito resulta da seleção de depoimentos de testemunhas feita por eles ao decidirem. Andréa Sarmento mencionou a versão de uma mulher que presenciou o fato e afirmou ter visto o idoso sacar uma arma de fogo e atirar na vítima, sem que fosse agredido ou empurrado. Foram efetuados três disparos e um deles, por erro de pontaria, atingiu a perna de uma segunda pessoa. Os baleados são um casal. O marido morreu.
A magistrada também citou na pronúncia o depoimento da mulher da vítima fatal. Essa pessoa, que figura no processo como vítima de lesão corporal culposa, conforme a denúncia do MP, relatou que o marido a arrastava pelo braço, “mas não estava brigando”. A depoente afirmou que o policial aposentado interveio no desentendimento do casal, porém, não chegou a ser agredido ou sequer ameaçado antes de atirar três vezes. Uma das balas a atingiu na coxa, ficando alojada perto do osso.
“No caso em análise, afirmar a responsabilidade penal do acusado pelo crime de homicídio qualificado consumado é tarefa que deve ser analisada pela corte popular, juiz natural da causa, de acordo com a narrativa dos fatos constantes da denúncia e com o auxílio do conjunto fático/probatório produzido no âmbito do devido processo legal”, frisou a julgadora. Pela mesma razão, ela manteve a qualificadora do emprego de recurso, ponderando que só poderia afastá-la se fosse manifestamente improcedente.
Em contrapartida, o juiz mencionou os depoimentos de outras quatro testemunhas. Nenhuma delas presenciou o fato e todas atestaram a idoneidade e boa conduta do acusado. O réu alegou em interrogatório que a vítima fatal o empurrou, fazendo-o cair. Ao se levantar, o idoso disse que a vítima veio em sua direção, motivando-o a atirar. Segundo o acusado, o primeiro disparo foi de “advertência”, no chão. O segundo, para baixo, pegou sem querer na perna da mulher. O terceiro atingiu o peito do homem.
“Tendo em consideração as provas técnicas, documentais e testemunhais colhidas neste processo, inclusive os bem elaborados argumentos apresentados pelo centenário, tudo se conclui de que o acusado seguiu rigorosamente as exigências legais, que se valeu da legítima defesa própria e de terceiro frente a agressão atual de que foi vítima”, observou Vilebaldo Pereira. Com esse entendimento, o juiz considerou cabível ao caso o juízo de retratação, previsto no artigo 589 do Código de Processo Penal.
Com a absolvição sumária, ficou prejudicada a remessa ao TJ-BA do recurso em sentido estrito que a defesa do réu interpôs contra a decisão de pronúncia da juíza, mas o MP apelou da decisão do magistrado. Segundo a denúncia, em 22 de agosto de 2021, na capital baiana, Emiliano Melo dos Santos desferiu tiros em Welton Lopes Costa, causando-lhe o óbito e, por erro na execução, atingiu a companheira da vítima, Jenifer Carvalho dos Santos, provocando-lhe lesões corporais.
- Processo 8134167-62.2021.8.05.0001
Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: @consultor_juridico
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