Assim decidiu, por unanimidade, a 3ª turma do STJ, ao reformar acórdão do TJ/RJ que havia afastado a responsabilidade da fabricante.
Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, houve falha no projeto do eletrodoméstico e nos manuais do produto, que não traziam informações claras sobre riscos e formas seguras de reinstalar o dispositivo de travamento.
Segundo ela, é inadmissível que o fabricante retenha informações cruciais à segurança do consumidor.
O acidente
O episódio ocorreu em janeiro de 2009, quando a vítima, então com 3 anos, teve o braço direito amputado ao tentar colocar uma sandália em uma máquina de lavar roupas em funcionamento.
A máquina, modelo LE1000, fabricada pela Electrolux, teria operado sem acionar a trava de segurança da tampa - mecanismo que deveria impedir o funcionamento com o tambor aberto.
Após o acidente, o menor passou por cirurgia para reimplante do membro, e a família ajuizou ação de indenização por danos morais, estéticos, materiais e pensão vitalícia, com fundamento na teoria do fato do produto (art. 12 do CDC).
Decisões
Em 1ª instância, a ação foi julgada improcedente. O juízo da comarca de Mesquita/RJ concluiu que a máquina havia sido modificada por terceiro não credenciado, o que teria comprometido o sistema de segurança e rompido o nexo de causalidade com o fabricante. A decisão foi mantida pela 19ª câmara Cível do TJ/RJ.
A perícia judicial apontou que:
- A máquina, originalmente LE1000, teve seu gabinete substituído por um do modelo LE750;
- A modificação foi feita de forma irregular, por pessoa não autorizada;
- O dispositivo de travamento da tampa foi instalado fora do eixo e com inclinação inadequada, tornando-o ineficaz;
- A máquina funcionava mesmo com a tampa aberta, em violação ao padrão de segurança.
Apesar de reconhecer fragilidade no projeto da fabricante, que não previa mecanismos para evitar a montagem incorreta do dispositivo de segurança (como pinos-guia ou alojamento específico), o laudo concluiu que o acidente decorreu da instalação incorreta por terceiro, e não de falha intrínseca ao produto de fábrica.
O TJ/RJ entendeu que se trata de fato exclusivo de terceiro, hipótese que afasta a responsabilidade do fornecedor nos termos do art. 12, §3º, III, do CDC. Por maioria, os desembargadores negaram provimento ao recurso da família.
Voto da relatora
Ao votar, ministra Nancy Andrighi afirmou que a perícia judicial realizada em ação cautelar concluiu que o acidente decorreu de dois fatores combinados:
- Manutenção indevida, realizada fora da rede credenciada;
- Deficiência de projeto, que permitia a instalação equivocada do dispositivo de segurança.
A ministra pontuou que o cerne do recurso estava em definir se a culpa exclusiva de terceiro poderia romper o nexo causal e afastar a responsabilidade da fabricante. Para Nancy, a resposta é negativa:
"A manutenção da máquina em rede descredenciada pela fabricante, após nove anos de uso, não configura culpa exclusiva de terceiro, porque também restou evidenciada a omissão de informações essenciais à segurança do consumidor no projeto e nos manuais do eletrodoméstico."
A ministra citou o art. 12 do CDC, que impõe ao fabricante a responsabilidade objetiva por falhas de projeto e riscos do produto, ainda que decorrentes de manuseio posterior previsível.
Veja o voto:
Destacou, ainda, que o fabricante tem dever de informar expressamente sobre limitações de uso que afetem mecanismos de segurança.
"É inadmissível que ele retenha o monopólio de informações cruciais à segurança do consumidor, sob pena de se permitir a exploração indevida de falhas de segurança."
Para a relatora, a ausência de advertências claras sobre os riscos de acionamento elétrico sem o travamento completo da porta caracteriza defeito no produto.
Assim, votou para julgar procedente o pedido indenizatório, o que foi acolhido por unanimidade pela turma.
- Processo: REsp 2.190.340
O advogado Leonardo Amarante do escritório Leonardo Amarante Advogados Associados atuou pela vítima.
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