PMs vão a júri acusados de executar dois homens com 30 tiros dentro de carro em SP; veja vídeo

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Via @portalg1 | Por decisão da Justiça, dois policiais militares vão a júri popular acusados de assassinar dois suspeitos de roubo dentro de um carro parado, em 9 de junho de 2021, na Zona Sul de São Paulo. A data do julgamento ainda não foi marcada. O caso teve repercussão à época porque uma testemunha filmou a execução, no cruzamento das ruas Doutor Rubens Gomes Bueno e Castro Verde, em Santo Amaro, e postou o vídeo nas redes sociais.

O sargento André Chaves da Silva e o soldado Danilton Silveira da Silva são acusados de atirar aproximadamente 30 vezes em Felipe Barbosa da Silva, 23 anos, e em Vinicius Alves Procópio, de 19. Os dois agentes da Polícia Militar (PM) estão presos preventivamente no presídio da corporação, o Romão Gomes, na Zona Norte da capital.

Os réus respondem pelo crime de duplo homicídio qualificado por motivo torpe e recurso que dificultou a defesa das vítimas.

O g1 não conseguiu localizar a defesa de Danilton para comentar o assunto até a última atualização desta reportagem. Durante o processo, os agentes da PM se defenderam da acusação de assassinato, alegando que atiraram em legítima defesa porque os suspeitos estavam armados e atiraram neles, mas os disparos de Felipe e Vinicius não saíram.

"Para mim, ficou evidente que a decisão de mandar os acusados a júri popular foi para agradar à mídia e ao clamor público por conta das imagens de parte dos fatos que foram divulgadas. Infelizmente, boa parte do Poder Judiciário, em casos de repercussão, prefere 'lavar as mãos', enviando inocentes a júri para que o povo decida seus destinos. Neste caso, ficou evidente já na primeira fase do processo a legalidade da ação. Agora vamos mostrar aos jurados que as verdadeiras vítimas estão vivas e agradecendo pelo trabalho dos PMs", disse o advogado João Carlos Campanini, que defende André.

Impronúncia

PMs atiram dentro de carro e matam dois suspeitos: um no banco da frente e outro no traseiro. Para Ouvidoria da Polícia há suspeita de execução pelas imagens — Foto: Reprodução/Redes sociais

O Ministério Público (MP) também havia denunciado André e Danilton pelo crime de fraude processual, porque eles teriam 'plantado' duas armas na cena do crime para sugerir que Felipe e Vinicius estavam armados. A juíza Letícia de Assis Bruning, da 3ª Vara do Júri, entretanto, não aceitou essa acusação contra os agentes por entender que não havia provas disso no processo.

O cabo Jorge Baptista Silva Filho, que participou com André e Danilton da abordagem da PM que resultou nas mortes dos suspeitos, também chegou a ser acusado de assassinato e fraude processual pelo MP porque teria dado "apoio moral e material" aos réus. Mas a magistrada determinou a improcedência da denúncia.

Jorge era o motorista da viatura da PM usada na abordagem. Ele já tinha sido solto pela Justiça em setembro, quando havia sido colocado em liberdade para responder aos crimes em liberdade. Com a impronúncia, ele deixa de ser acusado pelos crimes.

O que dizem os PMs

De acordo com os PMs André e Danilton, Felipe e Vinicius roubaram objetos de pessoas que estavam num Peugeot Griffe. Depois fugiram num Chevrolet Ônix, que parou após bater num Honda Fit e em um poste de iluminação.

Os suspeitos foram mortos dentro do Ônix. Seus corpos tinham aproximadamente 50 perfurações. Os dois homens mortos pelos policiais não tinham passagens criminais anteriores e aparecem como "pardos" no boletim de ocorrência do caso:

  • Felipe não teve a profissão informada pela polícia. Ele estava no banco do motorista e teve 27 perfurações de balas. Os PMs que atiraram disseram que Felipe estava com um revólver calibre 38 com numeração raspada;
  • Vinicius estava no banco traseiro e teve 23 lesões por tiros. Ele era estudante. Também segundo os PMs, o rapaz tentou atirar com um revólver calibre 32, mas a arma, que também tinha a numeração adulterada, teria falhado.

Antes da abordagem aos suspeitos, duas mulheres não identificadas que ocupavam o banco dianteiro do Ônix teriam saído do veículo e não foram mais encontradas pelos PMs. Até a última atualização desta reportagem, as autoridades não haviam confirmado quem eram essas mulheres e se o veículo havia sido roubado.

Em suas defesas, os policiais militares alegaram que perseguiam o veículo roubado e foram recebidos a tiros pelos dois suspeitos durante a abordagem. Afirmam ter atirado em "legítima defesa". Nenhum dos agentes foi baleado ou ferido na suposta troca de tiros.

Além da Polícia Civil, a Corregedoria da PM também apura o caso na esfera da Justiça Militar.

Famílias das vítimas

Felipe Barbosa da Silva e Vinicius Alves Procópio foram executados a tiros por policiais militares, segundo o Ministério Público de São Paulo — Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

A mãe de Vinícius disse que ficou surpresa de ele estar envolvido em uma ocorrência. "Ele nunca foi de fazer esse tipo de coisa. Para mim foi assim uma surpresa muito, muito grande", afirmou a mulher.

A viúva de Felipe contou que o marido fez uma ligação de despedida enquanto estava sendo perseguido pela polícia. "Meu marido me ligou falando que os policiais iriam matar ele e desligou o telefone desesperado. Eu só ouvi os tiros", disse ela.

PM

Fachada da Corregedoria da Polícia Militar — Foto: Reprodução/TV Globo

De acordo com a Polícia Militar, os homens haviam cometido um assalto, roubando pertences de um carro, e estavam fugindo no veículo em que foram mortos.

A corporação também informou que não compactua com desvios de comportamento e se mantém diligente em relação às denúncias ou indícios de transgressões ou crimes cometidos por seus agentes.

Especialistas

Elizeu Soares Lopes, ouvidor da Polícia de São Paulo — Foto: Vivian Reis/G1 SP

O ouvidor da Polícia, Elizeu Soares, analisou as imagens e disse haver suspeita de execução na ação policial. Segundo ele, as cenas mostram somente os PMs atirando e não registraram nenhuma troca de tiros para justificar reação.

"Pelas imagens, há suspeita de execução e isso tem que ser apurado. Não há justificativa plausível para aquele desfecho com tiros pelos policiais. Ao meu ver, pelas imagens, teve ilegalidade”, afirmou Elizeu.

Para o advogado Ariel de Castro Alves, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, as imagens mostram que a versão dos policiais de que os acusados não se renderam não se sustenta.

"Na prática, os 2 PMs atuaram como um verdadeiro 'pelotão de fuzilamento' não houve nenhum confronto. Quem é flagrado após cometer crime deve ser abordado, detido e encaminhado para a delegacia de polícia. Ninguém pode ser assassinado ou fuzilado. Se fizeram isso com suspeitos de crimes, podem fazer também com qualquer pessoa, como já ocorreu em outros casos. O papel da polícia e cumprir a lei", disse Ariel.

Advogado Ariel de Castro Alves, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos — Foto: Roney Domingos/G1

*Veja os vídeos da matéria na íntegra, aqui

Por Kleber Tomaz, g1 SP — São Paulo
Fonte: g1.globo.com

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