A violência da restrição ao acesso aos Tribunais Superiores – Por Núbio Mendes Parreiras

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bit.ly/2lLJx7i | A promulgação da Constituição da República de 1988, a partir do seu artigo 5º, XXXV, mobilizou projetos que visavam a efetivação da garantia do acesso à justiça, para todos os brasileiros.

À evidência, referida garantia não se limita à primeira e segunda instâncias jurisdicionais, mas se estendendo, inclusive, à garantia plena de acesso aos Tribunais superiores, por meio de instrumentos como o Mandado de Segurança em matéria criminal (art. 5º, LXIX, CR/88), Habeas Corpus (art. 5º, LXVIII, CR/88), Recurso Especial (art. 105, III, CR/88), Recurso Extraordinário (art. 102, III, CR/88) etc.

Com efeito, em decorrência do acesso à justiça, a quantidade de Ações Penais vem, desde a década de 1990, aumentando sobremaneira, sobrecarregando as Defensorias Públicas brasileiras – recém fundadas, é bom que se diga –, que vêm desempenhando um papel hercúleo para tentar desacelerar o avanço do sistema penal.

Para tanto, as frequentes injustiças dos julgamentos dos processos de primeiro e segundo graus têm exigido das Defensorias Públicas fazer valer a missão democrática que a CR/88 lhes conferiu, ou seja, de não se intimidarem diante das injustiças e utilizar de todos os meios legais para tentar freia-las, inclusive com o acesso à justiça prometida pelos Tribunais superiores.

Não obstante, o que se tem observado, na prática, é que os Tribunais superiores têm mitigado, consideravelmente, o acesso à justiça, na medida em que têm, paulatinamente, imposto requisitos absurdos – e, às vezes, até ilegais – para receberem as demandas do povo.

No que toca ao âmbito criminal, destaca-se, notadamente, as limitações impostas pelas Cortes superiores ao Habeas Corpus, ao Recurso Especial (Resp) e ao Recurso Extraordinário (RE), manipulando discricionariamente os requisitos legais e desconsiderando por completo a importância dos institutos.

A começar pelo HC, com base em que se tem restringido a sua utilização em face de decisão denegatória de outro HC? Não há nenhuma limitação legal e muito menos constitucional para a utilização do instrumento nestas situações, sendo inteiramente legítimo o seu uso quando diante de uma ilegal denegação de ordem de outro HC!

Afinal de contas, o HC num Tribunal superior – no STJ ou no STF, a depender a situação – é sim o meio mais indicado para, por exemplo, confrontar uma denegação de ordem de HC para relaxar uma prisão ilegal proferida por um Tribunal estadual ou regional federal.

A violência da restrição ao acesso

Portanto, a referida limitação do uso do HC resulta numa clara falsificação conceitual do instituto, que, desconsiderando as suas bases fundacionais históricas, provoca uma notável violência contra o cidadão, que acredita nas garantias constitucionais.

No que toca aos chamados recursos extraordinários (Resp e RE), a situação é igualmente crítica, na medida em que os Tribunais superiores têm manipulado ilegitimamente os requisitos – já abertos e às vezes até tautológicos – dos referidos recursos, como as noções de análise de prova ou de direito violações de normas constitucionais ou federais, (in)existência de prequestionamento, presença ou não de repercussão geral etc.

Ao fim e ao cabo, o que tem imperado nas Cortes superiores, ao invés dos critérios dogmáticos, uma evidente burocracia, no exato sentido de pessoalidade do poder que, discricionariamente, seleciona os recorrentes passíveis ou não dessa ilegítima restrição ao acesso à justiça.

E não faltam desculpas para intimidar o cidadão de questionar a falta de acesso às cortes superiores, dentre tantos o que mais se destaca é a infundada generalização de há uma prática recursal com fins protelatórios – claro, que é só apontada quando se trata de recursos defensivos – que provoca o acúmulo repentino de recursos, nocivos à pretendida celeridade.

Ora, em primeiro lugar, uma nação com dimensão continental como a brasileira merece a institua mais vagas para ministros dos Tribunais superiores, já que o acesso à justiça é um direito fundamental que carece de ser melhor atendido.

Por outro lado, se há interposição de muitos recursos extraordinários e impetração de HC’s – diga-se de passagem, com percentual razoável de acolhimento, quando são conhecidos e julgados –, notadamente, é um sintoma de que há muitos erros judiciais e nulidades nas instâncias inferiores, que, acobertada por essa ilegítima restrição, só agrava o problema.

Para tanto, como se observa em demais localidade, o mais eficaz antídoto recursal é a implantação do sistema processual penal acusatório, na medida em que, assegurando as garantias constitucionais, torna obsoleto os recursos e ações autônomas de impugnação (HC, MS etc.), já que desnecessárias quando reduzida incidência de erros judiciais e nulidades – bem mais frequentes em sistemas inquisitórios.

Neste sentido, a restrição ao acesso às Cortes superiores é uma grave violência contra o povo – notadamente os mais pobres –, a tal ponto de selecionar arbitrariamente a quem as suas portas se abrirão.

A rigor, o acesso às Cortes tem sido garantido apenas aos “membros da corte”!
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Por Núbio Mendes Parreiras
Mestrando em Direito Penal. Especialista em Ciências Penais. Advogado.
Fonte: Canal Ciências Criminais

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