A violação das normas de combate ao novo coronavírus e o Direito Penal brasileiro

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bit.ly/38llUpj | O chamado “novo coronavírus” (2019-nCov) é uma doença causada por um vírus, semelhante ao da SARS, que surgiu na China e tem grande poder de propagação. Para se evitar que o vírus se espalhe e torne uma pandemia, a China cercou cidades, voos para o país foram reduzidos e moradores do país ficaram restritos de adentrar em países estrangeiros.

O Brasil, para enfrentar o novo coronavírus – e para buscar os brasileiros residentes em Wuhan, considerado o pico da doença -, promulgou rapidamente a Lei 13.979/20, que determina, em seu artigo 1º, que “esta lei dispõe sobre as medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus”.

Em seu artigo 3º, a Lei 13.979/20 determina que, “para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, dentre outras, as seguintes medidas”, dentre as quais o isolamento, a quarentena e a determinação compulsória de exames médicos e testes laboratoriais. E seu § 4º esculpe expressamente que é obrigação de todo cidadão se sujeitar ao cumprimento dessas medidas, sob pena de responsabilidade.

Tendo em vista que a saúde pública é bem jurídico penalmente tutelado, o mesmo deve ser protegido no caso de descumprimento de medidas para evitar a propagação do novo coronavírus. Portanto, o descumprimento às medidas impostas deve sujeitar o autor à responsabilidade no âmbito penal. Porém, a Lei 13.979/20 não trouxe tipo penal novo sobre a responsabilidade de quem descumpre a regra do § 4º de seu artigo 3º. Deve-se recorrer, portanto, à legislação que já existe sobre o assunto – o Código Penal.

O artigo 267 determina que é crime de epidemia “Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos”, com pena de reclusão de dez a quinze anos. Já o artigo subsequente determina ser crime, apenado de um mês a um ano de detenção, e multa “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”.

O descumprimento das medidas fixadas pelo poder público local ou pelo Ministro da Saúde, na forma dos §§ 5º a 7º do referido artigo 3º, para enfrentar a emergência de saúde pública resultante do novo coronavírus, resultará no cometimento do crime do artigo 268 do Código Penal, pois o mesmo infringiu determinação do poder público, destinado a impedir a introdução ou propagação de doença contagiosa.

Não se deve falar, em prima face, do crime de epidemia, pois o agente, pelo mero descumprimento das medidas impostas, não causa epidemia. Somente poderá ser imputado por epidemia, por exemplo, aquele que, sabendo-se doente sobre o novo coronavírus, infringe as regras determinadas pelo poder público – isolamento e quarentena, a título de exemplo – e passa a comparecer em locais de grande movimentação pública com o intuito de espalhar o vírus, espalhando-se e o coronavírus se torna, efetivamente, uma epidemia. Ou aquele que, sabendo ser portador do vírus, infringe as regras e anda normalmente por locais de grande movimentação pública, espalhando o coronavírus e gerando uma epidemia por negligência ou imperícia ou com o risco de ocorrer o resultado danoso.

O crime do artigo 267 do Código Penal é material, só se consumindo com a efetiva ocorrência de epidemia. E esta ocorre com a propagação de germes patogênicos. O ato que sequer gera a propagação de germes patogênicos não pode ser considerado crime de epidemia, nem na forma tentada.

Por sua vez, o crime do artigo 268 é de mera conduta, consumando-se com a mera infração à determinação pública, sendo a ocorrência da introdução ou propagação da doença contagiosa mero exaurimento do crime.

Aquele que descumpre, portanto, as medidas determinadas pelo Poder Público para o novo caso do coronavírus, na forma do artigo 3º, § 4º da Lei 13.979/20, comete o crime do artigo 268 do Código Penal. A pena é de um mês a um ano de prisão, que poderá ser substituída por uma única pena restritiva de direito e, caso o infrator receber pena mínima por qualquer motivo, poderá substituir a pena de prisão por multa (artigo 60, § 2º do Código Penal).

A nosso ver, uma pena demasiadamente pequena para aquele que coloca em risco a saúde pública com o descumprimento de regras para impedir a entrada do novo coronavírus ao país ou a propaganda do mesmo – principalmente por ser uma doença nova, sem medicamentos ou vacinas, bem como anticorpos por parte da população.
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Por Rodrigo César Picon De Carvalho
Fonte: Canal Ciências Criminais

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