O fenômeno OnlyFans para o Direito e a sua polêmica monetização da nudez

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QUAL SUA OPINIÃO? 😳Via @leodsampaio | Que a arte imita a vida, Aristóteles já afirmou em outros tempos. Sendo a música uma forma de expressão da arte, é certo que ela bem retrata o cotidiano das pessoas. Partindo dessa premissa, uma canção que faz bastante sucesso no atual verão chama a atenção para um tema que parece ser um dos novos grandes paradigmas do direito.

Kadu Martins, um cantor cearense, recentemente quebrou a internet com seu hit, a canção ‘Novinha do OnlyFans’. A música fala de uma garota que, repentinamente, mudou de vida. A moça ‘vivia numa kitnet, mas, do nada, se mudou para uma cobertura’. Não bastasse, ela teria alcançado a façanha de ‘viajar num mês pra Paris e, no outro, para Amsterdam’. A mudança repentina no padrão de vida logo fez com que as pessoas questionassem: ‘trabalha com o que essa novinha?’.

Sem pestanejar, a música responde: ‘Ai, meu Deus, essa novinha tem OnlyFans!’. Na sequência, a canção engole qualquer possibilidade de reflexão acerca do meio de sustento da tal novinha com uma marcante onomatopeia que reverbera ‘Tchan ram tchan tchan... Ram tchan tchan ram tchan tchan...’.

Qualquer um que é impactado com a tal música, logo se encontra diante de duas situações: reiteradamente e involuntariamente, irá cantarolar a marcante onomatopeia que a composição reverbera; depois, refletirá acerca do que seria o tal OnlyFans.

Surge aí a necessidade de reflexão do tema à luz do direito. Se o início do raciocínio corresponde à ideia de que a arte imita a vida, diante da canção, é fácil afirmar que o OnlyFans é uma realidade. E você deve se questionar: o que a música e o fenômeno OnlyFans têm de relevante à luz do direito? A resposta é: tudo! E explico.

OnlyFans é uma plataforma online que surgiu em 2016 e virou uma febre por permitir que os seus usuários compartilhem conteúdo ‘exclusivo’. Aqui, vale o destaque ao termo ‘exclusivo’ entre aspas, pois não demorou até que os produtores de conteúdo da tal plataforma começassem a rentabilizar tal exclusividade através da venda de conteúdo com nudez aos assinantes. Sim, existe uma plataforma para as pessoas produzirem e consumirem conteúdo +18 de forma exclusiva e paga! 

Se, por um lado, parece absurdo existirem pessoas produzindo seu próprio conteúdo de nudez e vendendo na internet, há, do outro lado, muita gente adquirindo esse material – e pagando [caro e até em dólar] por isso!

Estamos falando de um mercado tão grande que, embora as pessoas sempre citem o OnlyFans como canal de produção de conteúdo adulto, pois é uma das mais famosas plataformas dessa natureza disponível na internet, fato é que não se trata da única. Existem, ainda, o Privacy, XVideos Red, PornHub Plus, Unlockd, FanCentro, LoyalFans, Fansly, Câmera Privê, Sexlog, entre outros...

Sem juízo de valor acerca da moral e dos bons costumes, precisamos falar de um fenômeno que movimenta a internet atualmente, pois, para além de pornografia, é um negócio rentável e que gira muito dinheiro e a prova disso é matéria já noticiada: só o OnlyFans teve receita líquida de R$ 4,8 bilhões, em 2021. Ao passo que os criadores de conteúdo obtiveram faturamento por volta de R$ 21 bilhões, em 2021. Estamos falando de bilhões! Me perdoe o trocadilho, mas nesse nicho, o mercado anda bastante excitado!

Talvez, pela sensibilidade do tema, há pouco conteúdo jurídico abordando o assunto. No entanto, com tanta gente produzindo, com tanta gente consumindo e com tanto dinheiro envolvido, fato é que, à luz do direito, há muito para se pensar sobre essa mercantilização da nudez digital. 

Não há nada de ilícito em produzir conteúdo autoral de nudez e disponibilizar o material a título oneroso na internet. De forma superficial é fácil tal afirmativa. No entanto, há ressalvas que devemos refletir dentro do assunto. 

É que no estudo do tema, para sustentar melhor a pesquisa, [acessei] um colaborador acessou a plataforma OnlyFans com objetivo único de compreender o sistema. Do que chama a atenção, de início se observa que, de regra, os perfis de quem produz conteúdo são anônimos. Doutro lado, o perfil de quem consome, também. Chega ser engraçado perceber que não era só o meu colaborador [eu mesmo] que acessava o portal anonimamente.

Não bastasse, se apresenta outro questionamento: havendo necessidade de identificação dos responsáveis pelo conteúdo, como fazê-lo de forma imediata? Ok, ok... o Marco Civil da Internet está aí para imprimir princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet aqui no Brasil, mas há muito mais para discutir quando pensamos o fenômeno que aqui abordamos.

Pensemos o questionamento acerca da idoneidade e originalidade dos conteúdos disponibilizados. É que existem aqueles que disponibilizam o material de forma solo. Sendo que há, também, aqueles que disponibilizam o conteúdo como casal. E isso torna a reflexão ainda mais interessante.

Ao falarmos de conteúdo de casal, surge a dúvida: se um perfil individual compartilha o conteúdo duo, há algum tipo de autorização expressa do co-autor do material? Leia-se: não parece muito claro que todos os produtores/atores que se apresentam nos vídeos e imagens autorizaram aquela disponibilização. 

Outra celeuma que se apresenta, e ela parece ainda mais complexa, diz respeito ao fenômeno do revenge porn, ou, no português, pornô de vingança. O revenge porn já é objeto do estudo do já faz algum tempo e consiste na conduta de um agente que, visando se vingar de outrem – normalmente uma/um ex-companheiro/a - divulga de cenas de sexo ou nudez dessa pessoa sem a autorização com o objetivo único de praticar vingança e alcançar a humilhação de outrem. No âmbito da produção de conteúdo amador, se encaixaria como revenge porn a conduta do agente que, sem autorização do ex-companheiro/a, Geralmente, divulga a título oneroso o material na internet?! 

Por fim, dá para aprofundar ainda mais... em um mercado que está movimentando tanto dinheiro para quem produz conteúdo, como é que funcionará a tributação dos rendimentos? Quem produz, presta serviço? E quem compra o conteúdo, é consumidor? Eventual falha na plataforma, a relação é de consumo, de modo que a  responsabilidade é amparada à luz do Código de Defesa do Consumidor?!

Impossível esgotar todos os temas do direito que dá para caminhar quando pensamos o assunto. Fato é que, para o direito, o OnlyFans é um fenômeno não muito claro ainda e, sem trocadilhos, deveras excitante, pois abre margem para discussões nas mais variadas esferas.

Paralelo a isso, a verdade é que todo material disponibilizado na internet é como um peixe lançado ao mar: até sabemos a origem, mas os rumos que tomará sempre serão incertos e, em se tratando de conteúdo de nudez, que caminha em paralelo às garantias fundamentais da privacidade e intimidade, isso se mostra um tanto quanto perigoso.

A conclusão é que OnlyFans - e todas as outras plataformas da mesma natureza - se apresentam como sendo muito além de simples espaços para disponibilização de conteúdo adulto que são rentabilizados. De fato, se trata de um fenômeno que, a cada dia, ganha força e adeptos que, em grande maioria, às cegas, produzem sem compreender bem as consequências da própria conduta, muito menos as responsabilidades jurídicas de forma ativa e passiva que podem incorrer.

Fato é que diante da complexidade e da velocidade que o fenômeno OnlyFans se desenvolve, compete à comunidade acadêmica estudar e analisar todas as questões sociais que ladeiam a nova moda para debater o fenômeno à luz do direito.

Paralelo aos debates, que continuemos cantando... Tchan ram tchan tchan... Ram tchan tchan ram tchan tchan…

Por Leonardo Sampaio (@leodsampaio). Advogado, inscrito na OAB Seccional da Bahia desde 2015, bacharel em Direito pela Unesulbahia - Faculdades Integradas do Extremo Sul da Bahia, pós-graduado em Direito Administrativo e Constitucional pela EPD - Escola Paulista de Direito, sócio fundador do escritório Sampaio Advocacia, docente no curso de Direito da UnesulBahia Faculdades Integradas, professor convidado do Brasil Jurídico em cursos de prática forense, ex-presidente da Comissão de Atuação no  mbito da Justiça Comum da OAB Subseção Eunápolis/BA (2022-2024), ex-integrante da Comissão Estadual de Direito Militar da OAB Seccional Bahia (2019-2021), ex-presidente do Conselho Consultivo de Jovens Advogados da OAB Subseção Eunápolis/BA (2019-2021), coordenador dos Seminários Grandes Questões, autor de textos jurídicos e palestrante.

REFERÊNCIAS:

[1] BARCELOS , Mari. Depois do sucesso de “Virando o Olhinho”, Kadu Martins lança CD promocional que promete novos hits. ArteCult, 09 de setembro de 2022. Disponível em: <http://artecult.com/depois-do-sucesso-de-virando-o-olhinho-kadu-martins-lanca-cd-promocional-que-promete-novos-hits/>. Acesso em: 06 de janeiro de 2023.

[2] Criadores de conteúdo do OnlyFans ganharam quase R$ 21 bilhões em 2021. G1, 02 de setembro de 2022. Disponível em: <https://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2022/09/02/criadores-de-conteudo-do-onlyfans-ganharam-quase-r-21-bilhoes-em-2021.ghtml> . Acesso em 06 de janeiro de 2023.

1/Comentários

Agradecemos pelo seu comentário!

  1. Falou tudo menos sobre como adolescentes de menor usufrui dessas plataforma, e muitas vezes com consentimento dos pais, o que é pior, fora a facilidade de conseguir até conteúdo perigoso, como ped0dofilia e z00filia por exemplo...

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