Direito de Família: Como saber se estou em uma união estável? Por Paulo Martins

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bit.ly/2XUjzvz | Atualmente, as relações entre os casais têm avançado bastante. A forma de enxergar, planejar e construir o relacionamento está em constante evolução.

Prova disso são os casais que, em sua grande maioria, adotam (ou compram) um cachorro antes mesmo de ter um filho.

Outro destaque é a fase de “ficar”, antes de namorar e, posteriormente pensar em casamento.

Ocorre que já é realidade há algum tempo no Brasil casais que se libertaram da crença cultural (e religiosa) de que para iniciarem uma relação mais séria precisam se casar e registrar o ato em cartório.

A grande verdade é que as pessoas simplesmente decidem morar juntas, dividir as contas de casa, partilharem os sucessos e fracassos e, assim, construírem uma vida digna a dois. Quando se dão conta estão vivendo como casados, de fato!

Pode acontecer, também, do casal que, embora não dividam o mesmo teto, tenham relação entre homem e mulher há tempos, de forma pública e contínua, se ajudam financeira e emocionalmente, e tenham o profundo e presente sentimento de constituírem uma família.

Será que nestes casos haveria união estável?

Estes dois exemplos foram citados para ilustrar o dinamismo das relações e a necessidade de se analisar caso a caso.

Isto porque, os requisitos são subjetivos e, somente com o preenchimento de todos que será configurada a união estável.

Quais os requisitos para caracterizar a união estável?

Para responder esta pergunta, é necessário fazer uma remissão à nossa querida Constituição Federal de 1.988.

A Carta Magna prevê que a família é a base da sociedade, e tem proteção especial do Estado.

Na mesma passagem, reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

Visando regulamentar a proteção conferida pelo Estado, foi editada, em 1996, a Lei nº 9.278, que trata da união estável, dispondo que é reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.

Portanto, para o reconhecimento da união estável é necessário o preenchimento de todos os requisitos, quais sejam, convivência duradoura, pública e contínua, com o objetivo de constituição de família.

Desta forma, não basta estar morando sob o mesmo teto para que se configure a união. Muitas pessoas namoram, mas moram juntas com a finalidade de dividirem despesas e, com isso, reduzirem os gastos particulares de cada um.

Sobre este contexto, vale a citação de ementa proferida pela Terceira Turma do STJ, no ano de 2015, que assim dispôs:

DIREITO CIVIL. DEFINIÇÃO DE PROPÓSITO DE CONSTITUIR FAMÍLIA PARA EFEITO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL.

O fato de namorados projetarem constituir família no futuro não caracteriza união estável, ainda que haja coabitação. Isso porque essas circunstâncias não bastam à verificação da affectio maritalis. O propósito de constituir família, alçado pela lei de regência como requisito essencial à constituição da união estável - a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado "namoro qualificado" -, não consubstancia mera proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais abrangente. Deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os companheiros. É dizer: a família deve, de fato, estar constituída. Tampouco a coabitação, por si, evidencia a constituição de uma união estável (ainda que possa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indício). A coabitação entre namorados, a propósito, afigura-se absolutamente usual nos tempos atuais, impondo-se ao Direito, longe das críticas e dos estigmas, adequar-se à realidade social. Por oportuno, convém ressaltar que existe precedente do STJ no qual, a despeito da coabitação entre os namorados, por contingências da vida, inclusive com o consequente fortalecimento da relação, reconheceu-se inexistente a união estável, justamente em virtude da não configuração do animus maritalis (REsp 1.257.819-SP, Terceira Turma, DJe 15/12/2011). REsp 1.454.643-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 3/3/2015, DJe 10/3/2015.

A partir do entendimento acima transcrito é possível perceber que o requisito mais complexo de ser demonstrado pelos companheiros é o ânimo de constituir família.

Os demais (convivência contínua, pública e duradoura) são muito comuns em namoros de hoje em dia, o que não implica, necessariamente, em vontade de construir uma família com a outra pessoa.

Portanto, o desejo de constituir família deve ser presente durante a relação, e não futuro (como ocorre em namoros), ou seja, o casal deve se apoiar irrestritamente financeira e emocionalmente, terem uma relação duradoura (há certo tempo), contínua (sem idas e vindas), pública (notória), além do desejo presente de formar uma entidade familiar.

Posso registrar uma união estável?

Digamos que um casal formado há algum tempo, esteja na relação de forma contínua e pública, e tenham intenção, no presente, de constituir família.

Neste caso, embora não haja formalização (contrato), há a caracterização da união estável, com o regime de comunhão parcial de bens, semelhante ao casamento.

No entanto, o casal que desejar pode, mediante contrato, alterar o regime patrimonial havido na união. Mas, atenção, este regime só pode ser alterado uma vez, segundo entendimento jurisprudencial.

Vale lembrar, também, que o referido contrato não produzirá efeitos retroativos (REsp 1.383.624-MG, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 2/6/2015, DJe 12/6/2015).

Neste sentido, vale destacar que ao casal foi dada liberdade para acordar sobre as suas relações patrimoniais, podendo firmar contrato particular de convivência, desde que de acordo com os requisitos de validade do negócio jurídico, regulado pelo art. 104, do Código Civil:

  • capacidade dos agentes;
  • Inocorrência de vício de vontade ou vício social;
  • licitude do objeto;
  • Forma prescrita em lei.

Quanto a esse último requisito, importante dizer que, diferentemente do que ocorreu na regulação do regime de bens dentro do casamento, o Código Civil, no que diz aos companheiros, fixou a exigência de contrato escrito para fazer a vontade destes, ou a incidência do regime de comunhão parcial de bens, na hipótese de não registrarem regime diferente.

Inobstante a válida preocupação de se proteger, via escritura pública, tanto a própria manifestação de vontade do casal quanto possíveis interesses de terceiros, certo é que o julgador não pode criar condições onde a lei estabeleceu o simples procedimento do contrato escrito.

Nesse ponto, calha destacar que nem a regulação do registro de uniões estáveis por oficial de registro civil das pessoas naturais, feita pelo CNJ, por meio do Provimento 37/14, exige que a união seja averbada no registro imobiliário correspondente ao dos bens do casal. Assim, se atendidos os requisitos de validade do negócio jurídico entabulado, o contrato de convivência é válido.

E com relação a união homoafetiva? Não se aplica?

Recentemente, o STF e STJ já reconheceram a equiparação entre uniões hétero e homoafetivas.

Destaque-se que STF explicitou no julgamento da ADPF 132-RJ, onde proclamou que "ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de sua orientação sexual"

Portanto, é perfeitamente possível o registro de união estável homoafetiva.

Conclusão

A partir do tema e argumentos trazidos, é possível perceber que o tema possui ampla margem de interpretação, devendo o casal se precaver dos riscos patrimoniais advindos de uma relação indefinida.

Ademais, é importante que sejam esclarecidos os pontos relacionados aos requisitos para configuração da união estável, uma vez que, como dito, a análise deve ser feita caso a caso.

E, por fim, cabe ao casal, se tiverem interesse em regularizar a união, elaborarem um contrato de convivência, definindo o ponto inicial dos efeitos patrimoniais, bem como o regime de bens.

Será muito importante em uma eventual conversão em casamento ou, até mesmo, em uma dissolução de união estável.
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Paulo Martins
Assessoria e Consultoria Jurídica Especializada
Advogado, formado em 2015 pela Faculdade UNIVERSO em Goiânia, 6 anos de experiência jurídica (incluindo período de estágio), foi membro do departamento jurídico da campanha eleitoral do Dep. Federal Delegado Waldir para prefeitura de Goiânia em 2016, atuante nas principais áreas do direito.
Fonte: paulosergiodireito.jusbrasil.com.br

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