Os antecedentes criminais e a sua ilegal perpetuidade – Por Fabiano Leniesky

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bit.ly/2OQinbs | Em atenção ao princípio constitucional da individualização da pena (art. 5°, XLVI, da CFR/1988), e em respeito aos ditames dos arts. 59 e 68 do Código Penal, o juiz deve fixar a reprimenda ao acusado de acordo com a conduta delituosa praticada e, também, estar atento às circunstâncias pessoais do indivíduo.

Para tanto, o magistrado, especialmente na primeira fase da dosimetria da pena, analisa as circunstâncias judiciais, dentre elas, os antecedentes criminais do réu.

Discute-se, no ponto, se uma condenação transitada em julgado, com pena extinta há mais de 5 anos, autoriza o aumento da pena-base, já que a referida condenação, por força do disposto no art. 64, I, do Código Penal, não pode elevar a reprimenda na fase intermediária a título de reincidência, agravante prevista no art. 61, I, do Diploma Repressivo.

Ao prescrever o princípio da igualdade no art. 5º, caput, da CF/1988, o legislador teve a intenção de tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades (Nery Júnior, 1999, p. 42).

Logo, não é justo que uma pessoa que possui antecedentes criminais tenha, por exemplo, em razão da prática de uma infração penal, a mesma pena-base que uma pessoa que possui uma conduta moral irrepreensível.

Em uma primeira análise, a premissa pode ser justa e correta.

Porém, a utilização de eventual sentença condenatória para negativar os antecedentes do acusado, ao menos no caso aqui debatido, viola diversos princípios da CF/1988: a) proporcionalidade (art. 1º, caput, c/c art. 5º, LIV); b) dignidade da pessoa humana (art. 1º, III); c) presunção de inocência (art. 5º, LVII); d) vedação da aplicação de penas de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, ‘b’).

Se a sentença condenatória proferida nos autos X da ação penal não serviu e não poderia servir para agravar a pena pela reincidência nos autos da ação penal Y (art. 64, I, do CP), também não pode servir para elevar a pena inicial em decorrência dos maus antecedentes na fase do art. 59, caput, do CP.

Ora, “se essas condenações não mais prestam para o efeito da reincidência, que é o mais, com muito maior razão não devem valer para os antecedentes criminais, que é o menos” (STF. RHC n. 118.977, julgado em 18/3/2014. Relator: Min. Dias Toffoli).

Seguir na linha de pensamento contrária é concordar que condenações transitadas em julgado possam ser consideradas como antecedentes criminais sem limite de tempo, ou seja, a consequência gerada pela condenação pode ficar eternizada na vida do réu, gerando efeitos perpétuos.

Nessa esteira:

MATÉRIA PENAL. FIXAÇÃO DA PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. MAUS ANTECEDENTES. SENTENÇA CONDENATÓRIA EXTINTA HÁ MAIS DE CINCO ANOS. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE NÃO-CULPABILIDADE. MANIFESTAÇÃO PELO RECONHECIMENTO DO REQUISITO DE REPERCUSSÃO GERAL PARA APRECIAÇÃO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO (STF. RE n. 593.818, julgado em 26/2/2009. Relator: Min. Joaquim Barbosa).
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RECURSO ESPECIAL – REDISCUSSÃO FÁTICA – INADMISSIBILIDADE. Descabe ao Superior Tribunal de Justiça, na via afunilada do especial, revolver matéria fática. ANTECEDENTES – CONFIGURAÇÃO. Decorridos mais de cinco anos desde o cumprimento da pena, o afastamento da reincidência inviabiliza o reconhecimento dos maus antecedentes (STF. HC n. 115.304, julgado em 26/4/2016. Relator: Min. Marco Aurélio).
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Agravo regimental em habeas corpus. 2. Tráfico de drogas (artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006). Condenação. 3. Aumento da pena-base. Maus antecedentes não caracterizados. Decorridos mais de 5 anos desde a extinção da pena da condenação anterior (CP, artigo 64, inciso I), não é possível alargar a interpretação de modo a permitir o reconhecimento dos maus antecedentes. Aplicação do princípio da razoabilidade, proporcionalidade e dignidade da pessoa humana. 4. Ordem concedida. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental a que se nega provimento (STF. AgR no HC 159.727, julgado em 5/4/2019. Relator: Min. Gilmar Mendes). 

O Tribunal Catarinense já abordou o tema em situações semelhantes: Apelação criminal n. 0010012-21.2014.8.24.0008, julgada em 21/8/2018. Relator: Des. Volnei Celso Tomazini; Apelação criminal n. 0000920-42.2019.8.24.0073, julgada em 10/10/2019. Relatora: Desa. Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer.

Dessa forma, transcorrido o prazo depurador previsto no art. 64, I, do CP, a sentença penal condenatória não pode servir como antecedente criminal para fins de majorar a pena-base do acusado.
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Por Fabiano Leniesky
Fonte: Canal Ciências Criminais

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