Embora não seja uma novidade, já que o artigo 461 do CPC de 1973 admitia medidas semelhantes em obrigações de fazer ou não fazer, com a reforma do CPC de 2015, o artigo 139, em seu inciso IV, foi fortificado com a possibilidade de o magistrado adotar "medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária".
Polêmica, a aplicação do aludido artigo permite ao magistrado, a título de exemplo, a apreensão da CNH, do passaporte, dos cartões de crédito, entre outras medidas, com a finalidade de forçar o cumprimento da ordem judicial de quitação da dívida.
A aplicação do artigo se torna ainda mais polêmica, quando lembramos que a execução civil está limitada ao patrimônio do devedor/executado, devendo respeitar a dignidade da pessoa humana, conforme os artigos 8° e 789 do CPC.
Mas a pergunta que se faz é: em que caso teria efetividade a aplicação do artigo 139, IV, do CPC, mormente para não se tornar letra morta ou mesmo se tornar "carta branca" e causar verdadeiro temor aos devedores?
No último dia 10 de agosto, foi divulgada notícia em que a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) afastou a aplicação desse dispositivo do CPC para "desconstituir a medida executiva consistente na apreensão da Carteira Nacional de Habilitação e do passaporte" de sócia de uma empresa.
Aludida decisão da ministra Maria Helena Mallmann [1] traz importante reflexão acerca da aplicabilidade do artigo frente os devedores/executados na Justiça do Trabalho, pois, de fato, embora autorizada por lei, a apreensão de CNH, passaporte ou mesmo o bloqueio de cartão de crédito (que não foi objeto dessa decisão), entre outros, é medida atípica, e que, segundo a própria ministra, "deve ser realizada com extrema cautela".
No caso em análise, como traz a notícia veiculada no site do TST, "a mera insolvência, em si mesma, não acarreta a adoção automática de medidas limitadoras da liberdade individual do devedor, pois a execução civil não tem o caráter punitivo verificado na execução penal. Embora reconheça a natureza alimentar da verba devida, ela não observou, no caso, proporcionalidade na determinação do ato do juízo".
O entendimento jurisprudencial dominante no TST aponta que a aplicação do artigo 139, IV, do CPC depende de análise casuística, proporcional e razoável. Logo, sua aplicação seria válida, por exemplo, em um cenário que revele que o devedor/executado comprovadamente esteja ocultando patrimônio, frustrando a execução, ou mesmo desfrutando de vida luxuosa ou incompatível com sua situação financeira e dívidas.
Diante disso, resta claro que a aplicação do artigo 139, IV, do CPC é validada na Justiça do Trabalho, mas por ser medida extrema, deve ser interpretada e aplicada caso a caso pelo magistrado, levando sempre em consideração se o devedor/executado tem ou não meios de quitar a dívida.
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[1] http://www.tst.jus.br/web/guest/-/sócia-de-empresa-consegue-reaver-de-carteira-de-habilitação-e-passaporte.
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Hallan Ribeiro dos Santos é sócio de Peluso, Stupp e Guaritá Advogados e especialista em Direito do Trabalho pela PUC-SP.
Fonte: Conjur
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