A exposição constante ao risco de erro
O erro no pagamento das multas no caso da plataforma X, envolvendo o uso de uma conta judicial incorreta, é um exemplo claro de como uma falha técnica pode se transformar em um problema gigante. Mesmo com a determinação para corrigir o erro, o impacto permanece, e a plataforma X continua bloqueada. Para os advogados envolvidos, esse tipo de exposição traz consequências graves, uma vez que pequenos detalhes, como o uso de uma conta ou código errado, podem comprometer a defesa e a confiança do cliente.
Além disso, o problema das guias de recolhimento não se limita à questão desse caso cível. O impacto é observado em diversas esferas do Judiciário, como na Justiça do Trabalho, onde um erro no preenchimento de guias de preparo recursal ou custas processuais pode comprometer o seguimento de recursos. Um simples erro em uma guia de recolhimento pode impedir que o recurso seja analisado, resultando na perda de direitos para o cliente e na exposição do advogado.
Na Justiça do Trabalho, por exemplo, o erro na guia de depósito recursal é especialmente problemático. Para que o advogado possa interpor recurso em processos trabalhistas, é exigido o recolhimento de um depósito recursal para garantir o juízo. Contudo, o sistema é altamente rígido: se o advogado preenche a guia de depósito com um código errado ou faz o pagamento em uma conta errada, o recurso pode ser automaticamente negado, sem chance de correção. Esse problema é amplamente reconhecido, como destacou a presidente da OAB-SP, Patrícia Vanzolini, que criticou a exigência de que apenas a parte ou o empregador possam realizar o recolhimento, dificultando a vida dos advogados que poderiam corrigir esses erros de maneira mais eficiente.
Essas falhas técnicas, em todos os ramos do Judiciário, refletem a vulnerabilidade constante em que o advogado se encontra, tendo que gerenciar não apenas o conteúdo jurídico das demandas, mas também um número crescente de questões burocráticas que podem prejudicar seus clientes.
A complexidade dos sistemas judiciais
A fragmentação dos sistemas judiciais no Brasil é um dos maiores desafios para os advogados. Cada tribunal tem seu próprio sistema de tramitação, exigindo que o advogado gerencie múltiplos usuários, senhas e protocolos diferentes. Isso resulta em um verdadeiro fardo administrativo, já que cada tribunal tem sua própria forma de consulta, protocolo e acompanhamento dos processos.
A adoção do eproc é uma tentativa de unificação, mas, mesmo assim, cada tribunal mantém suas próprias credenciais e interfaces, gerando um sistema ainda fragmentado. Essa implementação foi feita sem consulta à classe advocatícia, e só recentemente a OAB foi envolvida de maneira tímida no processo, sem a participação plena da advocacia.
O que os tribunais precisam compreender é que, para realmente facilitar e desburocratizar, é necessário criar um sistema unificado de verdade, com um único login e senha para todos os tribunais do país, integrando as diferentes jurisdições em uma única plataforma. Isso não apenas diminuiria os erros processuais, mas também reduziria a carga administrativa e traria mais eficiência ao Judiciário.
Prazos arbitrários e insustentáveis
Outro fator que torna a advocacia insustentável é a imposição de prazos arbitrários, muitas vezes definidos de forma irracional. Na Justiça do Trabalho, é comum que magistrados estabeleçam prazos extremamente curtos, como 24 ou 48 horas para manifestações e razões finais. Esses prazos são impraticáveis e colocam uma pressão imensa sobre os advogados, que muitas vezes precisam lidar com múltiplos processos simultaneamente.
A OAB precisa atuar com firmeza para garantir que os tribunais sigam a legislação, sem impor prazos desproporcionais que prejudiquem o exercício da advocacia. Advogados não podem ser submetidos a esses prazos sob pena de comprometer seu patrimônio pessoal ou sua reputação. Imagine se um juiz tivesse que tomar decisões complexas em 24 horas e, se não o fizesse, sua situação financeira pessoal fosse prejudicada. O tratamento desigual entre advogados e outras partes do Judiciário precisa ser corrigido.
Esse tipo de exigência não apenas compromete a qualidade da defesa, mas também expõe os advogados ao risco de não conseguirem cumprir essas ordens, gerando consequências graves para os clientes. Em um sistema ideal, o Judiciário deveria ser acolhedor e justo, oferecendo prazos razoáveis que permitam o preparo adequado de cada caso. Porém, a realidade é que essas práticas estão aumentando a litigiosidade, tornando o sistema mais oneroso e menos eficiente para todas as partes envolvidas.
Teses defensivas: Bloqueio ao acesso às cortes superiores
Outro aspecto que tem gerado críticas é o uso crescente de teses defensivas por parte do Judiciário para evitar o conhecimento de recursos nas cortes superiores. É cada vez mais comum ver tribunais superiores rejeitarem recursos com base em questões processuais ou formais, muitas vezes em detrimento do mérito do caso. Esse tipo de prática cria um novo obstáculo, dificultando o acesso à Justiça e prejudicando as partes, que acabam sem a devida apreciação de suas demandas.
Advogados têm enfrentado dificuldades adicionais ao tentar levar questões legítimas às instâncias superiores, apenas para verem seus recursos negados com base em detalhes técnicos ou alegações de descumprimento de formalidades processuais. Essa postura, além de aumentar a litigiosidade, afasta o Judiciário de sua função essencial de garantir justiça e equidade.
A insalubridade da advocacia
Esse cenário de múltiplos sistemas, prazos arbitrários, exclusão dos advogados em atos essenciais e barreiras processuais criadas por teses defensivas torna a advocacia uma profissão insalubre. Não seria razoável esperar que, em meio a tantas dificuldades, os advogados tivessem uma margem mínima para erros técnicos sem que isso comprometa suas carreiras ou prejudique seus clientes? A profissão precisa de uma revisão urgente quanto aos procedimentos processuais que, embora necessários, não deveriam colocar em risco a saúde e a qualidade de vida dos advogados.
A simplificação dos sistemas processuais poderia aliviar parte da pressão enfrentada pelos advogados. O foco da advocacia deve ser buscar o direito e a justiça, não ser penalizado por detalhes burocráticos que poderiam ser facilmente corrigidos.
Conclusão
Os advogados brasileiros enfrentam uma pressão desproporcional para não errar, mesmo em um ambiente repleto de armadilhas burocráticas. O caso da plataforma X, em que um simples erro no pagamento de multas resultou no bloqueio contínuo da rede social, mostra como os profissionais da advocacia são expostos a consequências graves por falhas que, muitas vezes, estão fora de seu controle. Para tornar a profissão menos insalubre, é hora de uma revisão das práticas processuais e de uma simplificação dos sistemas judiciais.
O uso de teses defensivas para evitar o conhecimento de recursos também demonstra como o Judiciário tem contribuído para a criação de um ambiente hostil e insustentável. Os advogados são treinados para buscar o direito, não para serem penalizados por falhas burocráticas.
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Leonardo Theon de Moraes
Sócio fundador do TM Associados. Advogado, graduado em direito, com ênfase em direito empresarial, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2012).
Fonte: https://www.migalhas.com.br/depeso/416746/advogados-nao-podem-errar-exigencia-e-exposicao-advocacia-brasileira
Artigo perfeito, irretocável. E quando o ministro do STJ não conhece do Resp por uma citação de um princípio constitucional e ao fundamentar a decisão o ministro cita um princípio constitucional é o que?
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