A recomendação, apresentada por Barroso e pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell Marques, foi aprovada pelo CNJ no final de outubro. O texto lista uma série de condutas e demandas que podem ser caracterizadas como abusivas, para que juízes e tribunais identifiquem as práticas.
Uma vez identificadas, o CNJ sugere a adoção de medidas que vão desde a comunicação do caso à Ordem dos Advogados do Brasil até a requisição de providências às autoridades policiais e ao Ministério Público.
“O Poder Judiciário tem uma experiência acumulada na observação de demandas propostas de forma artificial, frívola, sem um real conflito de interesses, ou mesmo de forma fraudulenta, com documentos falsos e sem o conhecimento da parte demandante, para não falar nos casos de assédio processual. O que a recomendação faz é consolidar essa experiência acumulada numa relação exemplificativa de medidas para prevenir, identificar e tratar o problema”, disse Barroso.
De acordo com ele, apesar do aumento da produtividade do Judiciário nos últimos anos, o acervo acumulado continua crescendo. Uma das causas, segundo o ministro, é a litigância abusiva. Barroso disse que um dos objetivos de sua gestão à frente do CNJ é justamente identificar as causas da alta judicialização e propor soluções.
“Apesar dos sucessivos recordes de produtividade de decisões e sentenças, como mostram os relatórios anuais ‘Justiça em Números’, o acervo de processos acumulados aumenta ano após ano. Essa alta judicialização da vida brasileira tem muitas causas, como a ineficiência do sistema de arrecadação fiscal, a má qualidade da prestação de serviços públicos e privados, a resistência na observância de precedentes qualificados etc.”, disse ele.
“Tenho procurado enfrentar esses problemas em diversas frentes, como a das execuções fiscais, a trabalhista e a previdenciária. A litigância abusiva é apenas mais um fenômeno a ser considerado nesse cenário complexo.”
Redução do acervo
Juízes e conselheiros do CNJ esperam que a recomendação diminua o acervo e os custos do Poder Judiciário, conforme mostrou a ConJur. Um dos pontos levantados pelos juízes que identificaram demandas abusivas em suas varas é o de que o simples fato de a recomendação identificar a litigância abusiva como um fenômeno já ajuda a coibir a prática.
“O principal ponto da recomendação é a sinalização pública, o reconhecimento da existência desse fenômeno, do abuso do processo, em suas diversas formas de manifestação, da necessidade de observar parâmetros para a sua identificação, tratamento e prevenção, tendo em vista o custo social de tais práticas, que podem conduzir ao colapso do sistema judicial e já comprometem seriamente o predicado da eficiência do Poder Judiciário”, exemplificou o juiz Airton Pinheiro de Castro, assessor do corregedor-geral da Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo.
O custo para o Judiciário é alto: só em São Paulo, a litigância predatória foi responsável por uma média de 337 mil novos processos por ano, entre 2016 e 2021, e gerou um prejuízo anual de cerca de R$ 2,7 bilhões aos cofres públicos. Considerado todo o período, o dano foi de R$ 16,7 bilhões.
Além de listar condutas e demandas que podem ser caracterizadas como abusivas, o texto orienta a criação de ferramentas de monitoramento de processos para identificar possíveis demandas nocivas. O objetivo é criar uma base de dados integrada entre os órgãos e tribunais do Judiciário para que sejam gerados relatórios periódicos. Com essas informações, serão adotadas novas ações preventivas, de correção e avaliação sobre a litigância abusiva.
A conselheira Daniela Madeira, que está à frente dos centros de inteligência do Poder Judiciário, órgãos responsáveis por levantar casos de litigância abusiva e propor soluções, afirmou que o CNJ pretende criar um grande sistema para identificar demandas abusivas no âmbito da Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ).
“Queremos juntar tribunais que já possuem algum sistema desenvolvido de detecção de demandas abusivas para trabalharem em cooperação e depositarem os códigos-fontes na PDPJ, para serem compartilhados com todos os tribunais”, disse ela.
Segundo Daniela, os TJs de Pernambuco, Goiás e Maranhão são alguns que já possuem sistemas para detectar demandas abusivas.
Tiago Angelo
Fonte: @consultor_juridico
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