Impasse entre juiz e promotor que se recusa a usar máscaras faz presos serem soltos e julgamentos são cancelados

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bit.ly/3mtiRDa | Pelo menos quatro julgamentos de pessoas acusadas de assassinato ou tentativa de assassinato foram cancelados em Araguaína desde o começo de setembro. O motivo é o impasse entre o promotor de Justiça Pedro Jainer Passos e o juiz Francisco Vieira Filho por causa da recusa do promotor em utilizar máscaras durante a sustentação oral nas audiências.

Em duas situações, os réus estavam presos preventivamente e acabaram sendo soltos para aguardar o julgamento em liberdade. São os casos de Alessandro Soares Ribeiro, acusado da morte de Valter Alves Muniz após uma discussão numa loja de conveniência e de Francimar Queiroz de Oliveira, que teria matado Soraia da Paz Costa por não aceitar o fim do relacionamento.

Os outros dois julgamentos cancelados eram de Kenneth Handerson Coelho Lima, denunciado pela morte de Joilton Soares dos Santos e de Ricardo Santos Lima, que responde pela tentativa de homicídio contra Itallo Henrique Santos da Silva. Os dois também receberam ordem de soltura relativa a estes processos, mas continuam presos porque respondem a outros inquéritos.

Em nota o Ministério Público admitiu que a recomendação para que a máscara seja retirada durante as sustentações orais existe e disse que as resoluções existentes do Conselho Nacional de Justiça não determinam que as máscaras precisariam ser utilizadas. Disse ainda que está recorrendo das solturas dos réus. (veja a nota na íntegra abaixo)

O Tribunal de Justiça do Tocantins disse que o uso do equipamento é obrigatório por leis municipais, estaduais e federais, além de portarias do próprio tribunal. (veja a nota na íntegra abaixo)

Todos estes julgamentos seriam realizados presencialmente na temporada do tribunal do júri. O juiz entendeu que os réus foram prejudicados com o cancelamento dos julgamentos e revogou as prisões deles porque entendeu que as circunstâncias do cancelamento não são de responsabilidade dos acusados. Há ainda outros quatro julgamentos previstos para a mesma comarca nos próximos dias que podem ficam comprometidos se não houver acordo.

O impasse

Quando informou que não pretendia utilizar a máscara durante as audiências, o promotor alegou à Justiça que estava obedecendo a uma recomendação da Corregedoria-Geral do Ministério Público. Segundo ele, não havia como realizar o trabalho de "maneira minimamente eficiente com a boca do orador obstruída".

O G1 teve acesso a recomendação citada pela promotor. O documento é assinado pelo corregedor-geral do Ministério Público, Marco Antônio Alves Bezerra. O texto afirma que "o uso de máscara de tecido, aderente ao rosto, prejudica a oralidade do Promotor de Justiça, mormente quando atuar em júris complexos e prolongados, bem como, potencialmente, pode prejudicar a intelecção dos jurados, ocasionando dano irreversível à sociedade".

O promotor se manifestou nos autos do processo e afirmou que "um julgamento justo exige que ambas as partes possam exercer seus respectivos direitos igualmente, direitos garantidos pelo sistema legal e constitucional e não pela - como crê o juiz - "bondade" do presidente da sessão".

O juiz, discordou. "A meu juízo, o simples uso de máscaras não gera prejuízos concretos ao direito de fala das partes, visto que as entonações, gestos e intenções dos oradores podem ser muito bem apreciados pelos ouvintes. Isto é o que atualmente ocorre, aliás, em igrejas, no comércio, em casa, e em todos os ambientes nos quais se revela necessária a reunião de pessoas durante a pandemia".

A Organização Mundial da Saúde e infectologistas do mundo todo recomendam o uso das máscaras de proteção como uma das medidas mais eficientes na contenção da propagação do novo coronavírus.

Nota do Ministério Público na íntegra

Quanto ao uso da máscara, durante as sessões do Tribunal do Júri em Araguaína ocorridas nos últimos dias, o Ministério Público do Tocantins informa que em momento algum o promotor de Justiça se opôs a fazer o uso do equipamento de proteção. Apenas requereu ao juiz que excepcionalmente, na sustentação oral, utilizasse apenas o protetor facial de acrílico (face shield), a fim de preservar a plenitude da defesa da sociedade.

Os promotores de Justiça entendem que o uso da máscara durante os debates do Tribunal do Júri, dificulta o desempenho dos trabalhos, uma vez que as sessões do Colegiado são dotadas de complexidade e exigem dos debatedores, qualidade e clareza na oratória, recursos estes que ficam prejudicados pela máscara facial, comprometendo o entendimento dos jurados quanto aos fatos expostos.

Nesse sentido, a Corregedoria-Geral do MPTO expediu Recomendação para que os membros obedeçam todos os protocolos de saúde compatíveis com o exercício de sua atividade, como o uso do protetor facial, distanciamento social, testagens e medições de temperatura que forem solicitadas. Além do que enfatiza que, após a sustentação oral a máscara de deve ser colocada.

Cabe asseverar que em reunião com o Tribunal de Justiça, realizada no dia 1º de setembro, o representante da OAB/Tocantins, Paulo Roberto Silva e a coordenadora do Núcleo do Júri da Defensoria Pública, Letícia Cristina dos Santos, também emitiram manifestações contrárias ao uso das máscaras durante os debates em plenário.

É necessário considerar que a Resolução nº 322/2020 do Conselho Nacional de Justiça estipula que as “audiências a serem realizadas de forma presencial deverão observar distanciamento adequado e limite máximo de pessoas no mesmo ambiente de acordo com suas dimensões, preferencialmente em ambientes amplos, arejados, com janelas e portas abertas, recomendando-se a utilização de sistemas de refrigeração de ar somente quando absolutamente indispensáveis”. A mesma resolução não determina a obrigatoriedade do uso de máscaras durante as audiências.

O Ministério Público lamenta que o magistrado local tenha optado de ofício pela soltura dos réus e informa que está recorrendo em todas as decisões. O Ministério Público entende que o adiamento dos júris, por ocasião excepcional da pandemia, não traria prejuízos aos processos. As sessões de Tribunal do Júri em todo o Estado estão suspensas, sendo que apenas a 1ª Vara Criminal de Araguaína insiste na realização dos julgamentos, mesmo ciente de que a cidade está entre as mais afetadas pela Covid-19, no Tocantins.

Nota do Tribunal de Justiça do Tocantins

De acordo com autos dos processos que tramitam na 1ª Vara Criminal de Araguaína, informamos que os réus Alessandro Soares Ribeiro e Francimar Queiroz de Oliveira, que estavam presos em razão de processos que os levaram a Júri Popular, foram postos em liberdade em decorrência do relaxamento de suas prisões, haja vista a recusa do promotor de justiça em realizar as sustentações orais em plenário do Júri de Araguaína com o uso de máscara convencional. Ação que provocou, consequentemente, o cancelamento das sessões sem previsão de nova data para suas realizações, levando em consideração a obrigatoriedade de uso desse equipamento de proteção individual por leis federal, estadual, municipal e portarias da Presidência do TJTO e da Diretoria do Foro de Araguaína. Informamos ainda que, pelo mesmo motivo acima, os processos referentes aos acusados Ricardo Santos Lima e Kenneth Handerson Coelho Lima também deixaram de ser julgados, mas estes continuam presos por ordem de prisão em outros autos.

Por G1 Tocantins
Fonte: g1.globo.com

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