Existe prazo decadencial em caso de indeferimento de benefício pelo INSS? Como entendeu o STF na ADI 6096

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bit.ly/37Kxtch | Quanto tempo possuímos para tentar reformar uma decisão de indeferimento do benefício pelo Instituto Nacional do Seguro Social?

Então, para responder a este questionamento, é necessário compreender a decadência no âmbito do direito previdenciário e como esse instituto é aplicado diante de uma negativa de benefício previdenciário!

Destaco que o tema passou por algumas alterações em razão da Medida Provisória 871/2019 e recentemente objeto de manifestação do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6096.

Dessa forma, eu não poderia deixar de escrever sobre o tema para lhe contar tudo o que você necessita compreender sobre decadência de indeferimento de benefício pela autarquia federal!

Antes de continuarmos, um recadinho:

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1) Definição de decadência previdenciária

De forma simples, é possível definir decadência como a extinção de um direito em virtude de não ter sido executado dentro do lapso temporal previsto em lei (prazo).

Todavia, esse conceito pode ser diferente dependendo da área do direito em que se trabalha.

No tocante ao direito previdenciário, a decadência é abordada no artigo 103 da Lei de Benefícios, sendo seu prazo estipulado em dez anos

1.1) Decadência em caso de indeferimento de benefício (ato negativo)

Conforme o próprio nome sugere, são atos administrativos negativos aqueles em que a autarquia federal cessa ou indefere os benefícios previdenciários de beneficiários ou segurados. Do mesmo modo, isso também pode ocorrer em casos em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) indefere de forma administrativa o pedido de revisão de benefício.

O ponto  é que não existia previsão legislativa até janeiro/2019, no sentido de que os atos negativos de cessação ou indeferimento de benefícios seriam afetados pelos decadência 

Somente existia previsão de que o prazo decadencial de dez anos seria utilizado em casos de não deferimento de pedido administrativo de revisão do benefício, levando em consideração (para contagem) o dia em que a pessoa ficasse sabendo da decisão de indeferimento definitiva no âmbito do INSS.

Aliás, em 2015 foi publicada a Súmula 81 da Turma Nacional de Uniformização (que cancelou a Súmula 64, que versava em sentido contrário):

  • Súmula n. 81, TNU: Não incide o prazo decadencial previsto no artigo 103, caput, da Lei n. 8.213/91, nos casos de indeferimento e cessação de benefícios, bem como em relação às questões não apreciadas pela Administração no ato da concessão.

Observação: Embora não seja tema deste artigo, informo que a parte final desta súmula precisa ser alterada em razão ao julgamento do Tema 975 do Superior Tribunal de Justiça, cuja tese esclareceu que “aplica-se o prazo decadencial de dez anos estabelecido no 103, caput, da Lei de Benefícios às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdenciário”.

Contudo, ocorreu uma mudança legislativa com a edição da Medida Provisória 871/2019, uma vez que passou a regularizar tal possibilidade, o que gerou muita polêmica, conforme explicarei nos próximos tópicos.

1.2) Decadência em caso de deferimento de benefício (ato positivo)

No âmbito do direito previdenciário, o ato administrativo positivo pode ser definido como a  concessão deferimento, do benefício da autarquia federal ao beneficiário ou segurado.

É de dez anos a decadência para pedir a revisão do benefício concedido (ato positivo), começando a contagem no primeiro dia do mês subsequente ao do recebimento da primeira prestação. Em regra, passando este prazo não é mais possível a revisão, no entanto existem exceções.

Vou tratar somente sobre a decadência de ato negativo no presente artigo. Todavia, logo publicarei um outro artigo tratando sobre a decadência de ato positivo.

2) Alterações promovidas pela MP 871 e Lei 13.846/2019 no art. 103 da Lei 8.213/91

O artigo 103, caput, da Lei de Benefícios (redação dada pela Lei 10.839/2004), antes de 2019, versava que o prazo de decadência de qualquer ação ou direito do beneficiário ou do segurado para o reexame do ato de concessão de benefício era de dez anos.

Observe: 

  • Artigo 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 10.839, de 2004)

Ulteriormente, com a edição da Medida Provisória 871/2019, transformada na Lei 13.846/2019, a redação do artigo 103, caput, foi modificada e ocorreu a adição de dois incisos, passando a constar a seguinte redação:

  • Artigo 103.  O prazo de decadência do direito ou da ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão, indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício e do ato de deferimento, indeferimento ou não concessão de revisão de benefício é de 10 (dez) anos, contado: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
  • I - do dia primeiro do mês subsequente ao do recebimento da primeira prestação ou da data em que a prestação deveria ter sido paga com o valor revisto; ou (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
  • II - do dia em que o segurado tomar conhecimento da decisão de indeferimento, cancelamento ou cessação do seu pedido de benefício ou da decisão de deferimento ou indeferimento de revisão de benefício, no âmbito administrativo. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

Isto é, conforme a redação nova do artigo 103 da Lei de Benefícios, a decadência passou a não alcançar somente o ato positivo de concessão do benefício, como também o  cancelamento, indeferimento, e cessação de benefício, e o indeferimento, deferimento, e não concessão de revisão, tos negativos. 

De acordo com esta redação do artigo 103, caso uma pessoa solicitar no dia de hoje o benefício de aposentadoria programada e ele for negado, ela só possuiria o prazo de dez anos para tentar conseguir modificar esta decisão. Após isso, a pessoa perderia direito ao benefício!

Não preciso falar o quanto essa alteração foi desfavorável ao segurado né? 

Mas fique calmo, pois houve uma importante decisão após isso e que veio para colaborar conosco (felizmente)!

3) Posicionamento STF na ADI n. 6096

No mês de março de 2019, a CNTI (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria) ajuizou a ADI 6096 (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no STF, justificando que a Medida Provisória 871/2019 tratava sobre temas de direito administrativo que não poderiam ser objeto de MP, e sim de projetos de lei ou normas infralegais.

Na ADI, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria ressaltou que, ao fixarprazo decadencial do artigo 103 para a concessão do benefício previdenciário (considerado direito fundamental), a Medida Provisória foi contra, inclusive, à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

No mês de outubro de 2020, o STF julgou a causa e compreendeu que a limitação do direito pelo prazo decadencial (nas situações estabelecidas pela Medida Provisória 871/2019, transformada na Lei 13.846/2019) alcançava o próprio fundo do direito fundamental à Previdência Social, desrespeitando o artigo 6º da Carta Magna.

Ademais, o dispositivo também ia contra o entendimento do STF no Tema 313, com repercussão geral reconhecida (Recurso Extraordinário 626.489/SE).

A Corte se manifestou, na época, no sentido de que o direito à Previdência é considerado direito fundamental e,  os requisitos para sua concessão, nem mesmo o decurso de tempo poderia atrapalhar.

Dessa forma, não poderia haver prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário.  

Assim, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 6069 foi julgada como parcialmente procedente e afirmaram a inconstitucionalidade do artigo 24 da Lei 13.846/2019, na parte que conferiu redação nova ao artigo 103 da Lei de Benefícios.

Foram vencidos os ministros Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que votaram pela improcedência da ação, por compreenderem que o prazo decadencial objetivava proteger a segurança jurídica e impossibilitar que atos administrativos fossem mantidos em discussão por tempo indefinido.

Conclusão: no momento atual, a redação constitucionalmente adequada do artigo 103, caput, da Lei de Benefícios é a anterior às alterações feitas pela Medida Provisória 871/2019 e pela Lei 13.846/2019 (que mencionei no início do tópico 2).

3.1) Inconstitucionalidade do prazo decadencial em caso de negativa de benefício

A decisão do Supremo na Ação Direta de Inconstitucionalidade 6096 foi importante e favorável ao segurado, uma vez que assegurou que as mudanças legislativas ocorridas em 2019 referentes à decadência previdenciária não se apliquem à cessação, indeferimento, e cancelamento de benefícios.  

Conforme o entendimento do relator da ação, Ministro Edson Fachin, se fosse possível tal possibilidade, se impediria a rediscussão da negativa pela parte segurada ou beneficiária, repercutindo a decadência estendida pelo dispositivo juntamente sobre o direito material à concessão do benefício previdenciário.

Desse modo, em sentido contrário do que foi defendido pela Advocacia Geral da União, a probabilidade de formalização de um outro pedido administrativo para seu deferimento, não garantiria o fundo do direito em toda e qualquer circunstância.

Isso porque, alteradas no tempo as condições dos fatos que constituem requisito legal para a concessão do benefício, poderia ser impossibilitado o direito de concessão.

Por consequência, a disposição de incidência do prazo decadencial em casos de negativa do benefício pela autarquia federal foi declarada inconstitucional. A mencionada decadência somente será utilizada nas hipóteses em que o Instituto Nacional do Seguro Social indeferir de forma administrativa o pedido de revisão de benefício previdenciário.

4) Interrupção da decadência por requerimento administrativo no INSS

A interpretação que se obtém da parte final do caput do artigo 103 da Lei de Benefícios (redação dada pela Lei 10.839/2004) é a de que o prazo decadencial se interrompe na data em que o beneficiário protocola na esfera administrativa o pedido de revisão do benefício. 

Agora vou lhe esclarecer o motivo!

Em primeiro lugar, não existe inércia do detentor do direito (requisito primordial da decadência) quando este está buscando diretamente sua proteção (por exemplo, no caso em que o segurado requerer administrativamente a revisão do benefício erroneamente concedido). 

Em segundo lugar, o artigo 207 do Código Civil dispõe que, salvo previsão legal em contrário, não se aplicam à decadência as regras que interrompem ou impedem a prescrição. 

Há muitas discussões a respeito de a  "decadência" do artigo 103 da Lei de Benefícios ser decadência tecnicamente ou, na realidade, possuir caráter de prazo prescricional. Porém, não vou entrar em pormenores neste artigo.

De toda forma, o artigo 103, caput, da Lei de Benefícios, dispõe de uma previsão legal de interrupção, dado que prevê que o termo inicial da decadência não será o 1º dia do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação, porém a data em que o segurado obtiver conhecimento da decisão de indeferimento definitiva na seara administrativa.

Desse modo, a jurisprudência e a doutrina dominantes interpretam a previsão do artigo 103, caput, da Lei de Benefícios como uma causa de interrupção do prazo decadencial quando o beneficiário ingressa no âmbito administrativo com pedido de revisão.

Entendo que pode parecer difícil, todavia asseguro que não é. Para lhe ajudar a compreender, trouxe no próximo tópico um exemplo de caso concreto!

4.1) Exemplo de interrupção em caso concreto

Trabalhei como advogada em um caso de revisão de benefício, no qual o cliente aposentou-se no dia 14 de setembro de 1999, e apresentou um pedido administrativo de revisão no dia 29 de janeiro de 2002. 

A revisão não foi deferida em 18 de agosto de 2008, e a ciência do segurado ocorreu no dia 26 de agosto de 2008. 

Após alguns anos, ele buscou ajuda profissional e a ação de revisão de benefício previdenciário foi ajuizada no dia 24 de agosto de 2018. 

Questionamento: A decadência será ou não aplicada? Pense um pouco antes de ler o parágrafo abaixo...

Pois bem, na sentença, o Juiz afastou a decadência, uma vez que encerrou-se o prazo para recurso administrativo apenas em setembro de 2008, pois a jurisprudência estabeleceu o entendimento de que requerimento de revisão de benefícios formulado dentro do prazo de dez anos interrompe a decadência.

5) Conclusão

Depois do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6096 pelo Supremo, voltou a ser utilizado o antigo texto do artigo 103 da Lei de Benefícios (redação dada pela Lei n. 10.839/2004) sobre a decadência previdenciária.

Assim, o prazo decadencial de dez anos NÃO será aplicado nas hipóteses de cessação, cancelamento e indeferimento de benefícios previdenciários

O prazo decadencial previsto na parte final do caput do artigo 103 é somente referente ao pedido de revisão administrativa, de modo que  essa é a única possibilidade de o ato negativo sofrer os efeitos da decadência.

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6) Fontes

BRASIL. [Constituição (1998)]. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 16/10/2020.

____________. [Código de Processo Civil (2015)]. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 de março de 2015. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 16/10/2020.

____________. Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 de julho de 1991. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm>. Acesso em: 16/10/2020.

____________. Lei n. 13.846, de 18 de junho de 2019. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 de junho de 2019. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13846.htm>. Acesso em: 16/10/2020.

____________. Medida Provisória n. 871, de 18 de janeiro de 2019. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 de janeiro de 2019. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Mpv/mpv871.htm>. Acesso em: 16/10/2020.

____________. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 6096. Relator: Ministro Edson Fachin. Publicado em 13 de outubro de 2020. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5647251>. Acesso em: 16/10/2020.

____________. Turma Nacional de Uniformização. Súmula n. 81. Disponível em: <https://www.cjf.jus.br/phpdoc/virtus/sumula.php?nsul=81&PHPSESSID=k3d9fbspo4isoc505kc7v7i5f3>. Acesso em: 16/10/2020.

Instituto de Estudos Previdenciários, Trabalhistas e Tributários. STF julga inconstitucional dispositivo da MP 971/2019, que estabeleceu prazo decadencial para revisão do ato de indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício previdenciário. IEPREV, 2020. Disponível em: <https://www.ieprev.com.br/conteudo/categoria/4/7371/stf_julga_inconstitucional_dispositivo_da_mp_971_2019_que_estabeleceu_prazo_decadencial_para_revisao_do_ato_de_indeferimento_cancelamento_ou>. Acesso em: 16/10/2020.

KRAVCHYCHYN, Gisele. Da possibilidade de interrupção do prazo decadencial para revisão do ato de concessão nos casos de requerimento de revisão administrativa no INSS. Jus.com.br, 2013. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/25617/da-possibilidade-de-interrupcao-do-prazo-decadencial-para-revisao-do-ato-de-concessao-nos-casos-de-requerimento-de-revisao-administrativa-no-inss>. Acesso em: 16/10/2020.

KRAVCHYCHYN, Gisele. ADI 6096 e o entendimento do STF sobre a decadência nas negativas e cancelamentos de benefícios. Youtube, 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=tsvAvUrLCGw>. Acesso em: 16/10/2020.

SODERO, Rodrigo. Bomba! ADI 6096: Julgada pelo STF. Instagram, 2020. Disponível em: <https://www.instagram.com/p/CF_CSoADeVl/?utm_source=ig_web_copy_link>. Acesso em: 16/10/2020.

STRAZZI, Alessandra. Decadência no Direito Previdenciário: você está analisando errado. Desmistificando o direito, 2017. Disponível em: <https://www.desmistificando.com.br/decadencia-no-direito-previdenciario-analise/>. Acesso em: 16/10/2020.
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Por Alessandra Strazzi
Fonte: www.desmistificando.com.br

1/Comentários

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  1. Gostou do artigo? Me conte o que você pensa sobre a decadência do fundo de direito? O que achou da decisão do STF?

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