Tribunal de Nuremberg: uma análise necessária de um Tribunal de Exceção

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Por @leonolascoadvcrim e @raquelreis.adv“Povo que não nega ou não estuda a história está condenado a repeti-la” – Augusto Cury. Livro “Holocausto Nunca Mais”.

AVISOS IMPORTANTES: 

A) A análise da presente inquietação dos autores está umbilicalmente relacionada aos aspectos jurídicos e legais atrelados ao Tribunal de Nuremberg. Desde já, repelimos toda e qualquer interpretação desviada, desvirtuada, equivocada e capciosa;

B) Que a humanidade possa aprender e lembrar ETERNAMENTE do ser humano brilhante, raro e com um coração lindo, VIKTOR EMIL FRANKL, sobrevivente dos campos de concentração nazista, bem como de todos os que partiram e seus familiares. Não foi em vão, a existência de cada um de vocês. Nossa singela e respeitosa homenagem. O texto a seguir diz respeito unicamente sobre os aspectos jurídicos;

C) Anne Frank, pequena grande mulher, você não imagina como tens ensinado e gerado admiração para muitos de nós, seres humanos. Anne, você foi gigante! 

1. Breve resumo e contextualização dos fatos:

O Tribunal Militar Internacional para Alemanha, mais conhecido historicamente como o Tribunal de Nuremberg, foi estabelecido no final da Segunda Guerra Mundial pelos seus vencedores, quais sejam: Estados Unidos, França, Reino Unido e União Soviética. 

Breve e importante ressalva: por definição, “tribunal” é um órgão (imparcial) de soberania e tem como principal objetivo exercer jurisdição na mais absoluta justiça. Justiça NÃO é sinônimo de vingança. Claro que sabemos que o nobre leitor, da área do direito ou não, sabe o conceito de “tribunal”, mas nos dias de hoje, infelizmente, precisamos investir um pouco mais de tempo em reforçar o óbvio.

A primeira sessão do Tribunal Militar Internacional para a Alemanha ocorreu no Palácio de Nuremberg, após seis meses da rendição da Alemanha de Hitler, especificamente em 20 de novembro de 1945.

Durante os seis anos anteriores à rendição alemã, diversas atrocidades foram cometidas pelos nazistas, não apenas em solo alemão, mas em diversos territórios, tais como a Polônia, Ucrânia, Croácia, Bielorrússia e outros países, locais onde, curiosamente, estava concentrada a maior parte de judeus do continente europeu.

O Tribunal contava com oito juízes, representantes das Quatro Potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial. E no curso do julgamento, entre documentos e testemunhas, descobriram a extensão da perversidade e desumanidade nazista.

Cabe lembrar, no entanto, que essa não foi a primeira vez em que a Alemanha foi submetida a um tribunal de exceção. Se procurarmos na história, perceberemos que o Tratado de Versalhes, apesar de ser conhecido como um tratado de paz, que deu por finalizada a Primeira Guerra Mundial, disciplinava, especificamente em seu artigo 227, a formação de um “tribunal especial”. 

A afirmação de que a Segunda Guerra Mundial fora um desdobramento (quase que) natural do desfecho desproporcional da Primeira Grande Guerra para a Alemanha não é equivocada, muito pelo contrário, o “armistício de Versalhes” foi literalmente um sinal de que as coisas iriam piorar absurdamente. E observem a ironia: a Primeira Guerra Mundial além de ser conhecida como “A Grande Guerra”, também era chamada de “A GUERRA PARA ACABAR COM TODAS AS GUERRAS”.

Isto porque naquela época, para que fosse possível concretizar um processo criminal, no qual se pretendia responsabilizar o Chefe de Estado, naquela ocasião o Kaiser, por um delito supremo contra a moral internacional, teria que se instituir um tribunal especial, composto por juízes das potências vencedoras, sendo estas, respectivamente: Estados Unidos, França, Itália, Japão e Grã-Bretanha.

Qualquer semelhança não é mera coincidência. 

Durante a “convicção” de Nuremberg (chamar de tribunal, com todo o respeito e com a devida licença poética, é uma atecnia), o extermínio sistemático de milhões de pessoas ficou evidente, escancarado, bem como o planejamento e a execução de guerras brutais, com tortura, escravização, saque e destruição sistemáticas a que as forças de Hitler submeteram a Europa.

Diante desse cenário, dentre os 24 réus, 22 foram sentenciados, restando apenas três absolvidos. 

No entanto, logo após o fim do julgamento ocorrido no Palácio da Justiça de Nuremberg, surgiram diversos questionamentos da comunidade internacional, tais como: podemos afirmar que o julgamento ocorreu nos termos legais, ou foi apenas mais um episódio de humilhação para a Alemanha, diante da vingança dos países vitoriosos? A Alemanha foi julgada ou SUBJUGADA em Nuremberg?!  

Não se deve esquecer que Hitler transformou uma Alemanha fraca e humilhada pelos vencedores da Primeira Guerra Mundial em uma potência, não só econômica como militar, mas também em um Estado totalitário, cujo Führer, tinha total poder sobre a nação. 

Além disso, o líder totalitário recuperou a economia na Alemanha, investiu na indústria, mais especificamente a indústria bélica e retirou a Alemanha da Liga das Nações, começando a ignorar e desobedecer às determinações mais desproporcionais e injustas do Tratado de Versalhes.

Em seguida, em 1 de setembro de 1939, buscando o desenvolvimento e a prosperidade da “Grande Alemanha” (Grossdeutschland) que sonhava construir, Hitler invadiu a Polônia e iniciou o que hoje conhecemos como a Segunda Guerra Mundial. 

Durante o período da Segunda Guerra, as forças armadas alemãs, alimentadas por ideias racistas e genocidas, foram responsáveis pelo extermínio de milhões de pessoas.

2. O (início do) Nazismo de Hitler

Um jovem inseguro, com péssimo relacionamento com o próprio pai e superprotegido pela mamãe, que, diga- se de passagem, era extremamente servil ao (rude, inculto e boçal) marido, este mesmo jovem, também fora rejeitado em diversas áreas de sua vida pessoal e profissional, pouco atraente, baixa autoestima, baixa estatura física (que o incomodava) e que chegava ao cúmulo de renegar a própria nacionalidade, tamanha sua incapacidade em se aceitar, completamente desacreditado e desdenhado por seus “compatriotas”, um Cabo do exército alemão, que durante a Primeira Guerra Mundial atuou na Frente Ocidental, como mensageiro da tropa, foi ferido por gás de pimenta no final do confronto e começou a se envolver com questões políticas.

O personagem principal, o protagonista, o maior anti-herói da história, decorrente da Segunda Guerra Mundial, foi Hitler, o Cabo Mensageiro anteriormente citado. O maior e mais sangrento conflito bélico (algo em torno de sessenta a noventa milhões de mortos, direta ou indiretamente), sem contar é claro, com as duas maiores atrocidades presenciadas no mundo: o holocausto e as duas bombas atômicas, que sem sobra de dúvidas, foi o momento mais insano do ser humano. 

Fato é que diante das atrocidades cometidas no regime nazista, se perguntarmos para um brasileiro, chileno, espanhol, sueco, peruano, australiano, alemão, austríaco, uruguaio... Qual o pior ser humano que passou (e fez história) pelo planeta Terra? Provavelmente a resposta seria a mesma: ADOLF HITLER.

3. O Julgamento do Palácio de Nuremberg

Quando observamos a história, verificamos que os Aliados optaram por processar e julgar os principais personagens do nacionalismo-socialista, conforme as regras da tradição penal democrática.

O Tribunal de Nuremberg, apesar de paradigmático no cenário internacional, foi, inegavelmente, um tribunal de exceção

Curiosamente, os Aliados, antes mesmo da formação do Tribunal, a partir de 1943, já deliberavam os nomes dos homes que ocupariam o banco dos réus. Essa discussão foi baseada principalmente em nomes que constavam nas listas elaboradas por eles.

Evidentemente, o principal nome era Hitler. No entanto, diante do desaparecimento de diversas figuras de suma importância ao regime nazista e o suicídio de outros, tais como o de Hitler, o Ministro da Propaganda, Josef Goebbels e o chefe da SS, Heinrich Himmler, os planos das Quatro Potências foram redirecionados.

Cabe lembrar, ainda, que Heinrich Muller (chefe da Gestapo) Adolf Eichmann (supervisor logístico do extermínio dos judeus) e Josef Mengele (médico responsável pelos experimentos humanos conduzidos nos campos de concentração) dentre outros, estavam desaparecidos. 

Ainda assim, havia muitos oficiais e ex-membros do governo nazista no “radar” nas referidas potências.

Diante disso, inicialmente foi divulgada uma lista com dez réus, tendo sido cogitado chegar a cem deles. Mas, ficou decidido que seriam julgados vinte e quatro réus.

Desses vinte e quatro réus, apenas três foram absolvidos (von Papen, Fritzsche e Schacht). Sete deles foram condenados a diversas penas de prisão (Hess, Funk, Doenitz, Raeder, von Schirach, Speer e von Neurath), um se suicidou (ainda na prisão) e outro foi dispensado pela Promotoria. 

Porém, doze réus foram condenados à forca, quais sejam: Goering, von Ribbentrop, Keitel, Kaltenbrunner, Rosenberg, Frank, Frick, Streicher, Sauckel, Jodl, Seyss-Inquart e Bormann.

É de suma importância destacar que o referido julgamento contou com diversas controvérsias, muitas em relação aos seus procedimentos, sua eficácia e sua natureza.

Talvez a mais evidente seja de que o Tribunal possuía um caráter eminentemente de exceção, tendo em vista que o julgamento foi utilizado para punir os vencidos da Segunda Guerra Mundial, sem observar quaisquer princípios jurídicos. 

Mas, enquanto advogados, acredito que a situação que mais nos choque seja a ausência da possibilidade de uma defesa efetiva, uma vez que, mesmo antes de entrar em atuação, a defesa já não possuía quaisquer chances de vitória. 

A dificuldade dos acusados de se defenderem é uma das características principais de um tribunal de exceção, e, devido a isso, o julgamento tende a ocorrer rapidamente, deixando de lado as garantias do acusado em nome de uma justiça rápida e eficiente. 

A dúvida que resta nesse caso é: que justiça? Até que ponto vale minimizar ou exterminar as garantias do acusado em nome de uma suposta “justiça”?

Felizmente, o Direito Constitucional Contemporâneo repudia os tribunais de exceção, bem como entende que essa é uma garantia constitucional, vedando, consequentemente, a discriminação de pessoas e/ou casos.

Por todo o exposto, se torna possível concluir que o estudo da história é imprescindível para que aprendamos e não cometamos quaisquer dessas discriminações novamente.
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Por Leonardo R. Nolasco e Raquel L. S. de Almeida Reis.

2/Comentários

Agradecemos pelo seu comentário!

  1. Excelente reflexão! Parabéns aos autores pela escolha da temática.

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  2. Oportuna a reflexão sobre tal momento da história e importante revisitar o passado para tirarmos dele lições para o futuro.
    Mas acredito que as premissas apresentadas talvez possuam mais elementos circunstanciais, que moldaram a constituição daquele excepcional Tribunal Internacional.
    Não há negativas quanto a constatação de ter se constituído um julgamento de exceção,, pois o conceito de justiça prescinde o contraditório, o que foi negado aos réus.
    Mas o que acho importante pontuar é a máxima do direito de "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades” (NERY JUNIOR).
    A realidade posta no momento era de responsabilização objetiva daqueles que hierarquicamente responderiam pelos crimes cometidos pelo Eixo, pela arquitetação e execução de seus comandos. Por isso, não acredito em subjugação da Alemanha, mas em responsabilização dos agentes responsáveis pelos crimes cometidos.
    Ao meu modesto entender, é necessário cautela ao sentenciar que tal julgamento ocorreu à margem da justiça, pois os óculos que hoje usamos são diferentes dos vestidos por quem os usava na ocasião.
    Escusas pelas palavras, mas cumprimento os autores pela necessária provocação.

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