Meus pais faleceram; eu sou obrigada a receber herança? E se eu não quiser? Como fica?

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Por @juliomartinsnet | RECEBER HERANÇA quase sempre é visto como uma excelente coisa, afinal de contas, representa um acréscimo patrimonial: quem não quer aumentar seu patrimônio, não é verdade? Pode não ser.... o herdeiro pode sim manifestar sua vontade em NÃO RECEBER a herança. A bem da verdade, como sempre falamos aqui, a transmissão já ocorre na hora que a "pessoa" se torna "defunto": parou de respirar, cessadas as funções vitais, estabelecida a morte, por força de Lei, teremos a transmissão ocorrida pela SAISINE, nos termos do art. 1.784 do CCB/2002:⁣

"Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários" .⁣

A SAISINE é necessária para não haver um só momento em que a herança fique "sem titularidade". Pura ficção legal que, necessária, pode ser refutada caso, por exemplo, algum dos herdeiros RENUNCIE à herança. A renúncia à herança pode se dar por diversos motivos, dentre eles, o fato de que efetivamente um do herdeiros não querer mesmo ser contemplado com a herança e muito menos suportar todas as etapas de um desgastante INVENTÁRIO, recolher o IMPOSTO CAUSA MORTIS devido, dentre outros. Importa ressaltar que a RENÚNCIA pode ser operada por TERMO NOS AUTOS ou ESCRITURA PÚBLICA, conforme regras do art. 1.806 do CCB:⁣

"Art. 1.806. A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial".⁣

Na via judicial costumeiramente ela se opera por TERMO NOS AUTOS, podendo também ser manifestada por Escritura Pública. Na via EXTRAJUDICIAL não existe "Termo nos Autos", então o repúdio à herança é materializado por ESCRITURA PÚBLICA que pode ser feita em separado ou na mesma Escritura onde for realizado o Inventário (o que não recomendamos, embora não seja proibido) por conta dos efeitos da RENÚNCIA - sim, são importantíssimos os efeitos da RENÚNCIA já que ela é IRREVOGÁVEL (art. 1.812) e, dependendo do contexto sobre o qual ela é operada, a destinação desejada pode não ser alcançada, como esclarece a regra do art. 1.811:⁣

"Art. 1.811. Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, ele for o único legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem a herança, poderão os filhos vir à sucessão, por direito próprio, e por cabeça" .⁣

Cabe esclarecer que RENÚNCIA pura não se confunde com a chamada "RENÚNCIA TRANSLATIVA" que na verdade, nem deveria ser chamada de "renúncia". Ela traveste na verdade uma Cessão de Direitos Hereditários e com isso acaba por desvirtuar o instituto. Quem renuncia REPUDIA à herança, devolvendo ao MONTE e JAMAIS transferindo para pessoa certa e determinada (embora, em muitos casos, esse possa ser o resultado final, inclusive). A recomendada doutrina do Desembargador Aposentado do TJSP, hoje Advogado, Dr. ROBERTO GONÇALVES (Direito Civil Brasileiro. 2020) esclarece:⁣

"(...) O herdeiro que renuncia em favor de determinada pessoa, citada nominalmente, está praticando dupla ação: aceitando tacitamente a herança e, em seguida, doando-a. Alguns entendem que, neste último caso, não há renúncia ou repúdio, mas sim cessão ou desistência da herança. Outros, no entanto, preferem denominar o ato renúncia translativa, que pode ocorrer, também, mesmo quando pura e simples, se manifestada depois da prática de atos que importem aceitação, como a habilitação no inventário, manifestação sobre a avaliação, sobre as primeiras e últimas declarações etc. Preleciona a propósito Alberto Trabucchi que a verdadeira renúncia é a abdicativa, feita gratuita e genericamente em favor de todos os coerdeiros. Só produzirá efeitos se observada a forma solene. Coisa diversa é a renúncia translativa, que implica aceitação e transferência posterior dos direitos hereditários".⁣

Decisão do TJRS com acerto faz as devidas distinções:⁣

"TJRS. 70063758759/RS. J. em: 02/03/2015. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SUCESSÃO. AÇÃO DE INVENTÁRIO. A RENÚNCIA DA HERANÇA HÁ DE SER EXPRESSA E FORMALIZADA ATRAVÉS DE TERMO JUDICIAL OU ESCRITURA PÚBLICA. A RENÚNCIA PROPRIAMENTE DITA É A ABDICATIVA, TAMBÉM CHAMADA DE PURA E SIMPLES, E É AQUELA EM FAVOR DO MONTE. A RENÚNCIA DITA TRANSLATIVA EQUIVALE À VERDADEIRA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. NEGADO SEGUIMENTO".
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Por Julio Martins
Fonte: www.juliomartins.net

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