'A gente precisa tirar o direito penal da conversa', diz advogada sobre PL que cr1min4liza o ab0rt0

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Via @cbnoficial | A advogada e pesquisadora na Anis, Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, Gabriela Rondon, foi entrevistada, nesta quinta-feira (13), no Estúdio CBN, para falar sobre o projeto que criminaliza o aborto legal. A proposta, que equipara aborto a homicídio, foi aprovada com urgência, nesta quarta-feira (12), pela Câmara dos Deputados.

Em conversa com os âncoras Bárbara Falcão e Guilherme Muniz, Rondon comenta como o avanço do projeto, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante, pode afetar os direitos das mulheres, com destaque à saúde reprodutiva.

Gabriela Rondon destaca que, no Brasil, atualmente, a lei permite o aborto em caso de violência sexual, risco à gestante ou em caso de anencefalia, e quando há estupro, por exemplo, não há restrição de tempo para abortar e não é preciso ter um boletim de ocorrência. E é justamente isso que está sendo discutido no PL aprovado com urgência.

'Hoje, a única lei que regula o aborto no Brasil é o Código Penal de 1940, que estabelece que o aborto é um crime, exceto em algumas circunstâncias: em caso de violência sexual e em caso de risco à vida da pessoa que gesta. Desde 2012, uma decisão do Supremo Tribunal Federal permite, também, o aborto em caso de anencefalia, quando o feto tem uma malformação. Não é preciso, por exemplo, nos casos de violência sexual, apresentar a boletim de ocorrência, ou judicializar para ter acesso ao serviço e também não existe restrição de tempo para se fazer a solicitação do aborto. É exatamente essa questão que está agora em discussão nesse PL', explica.

Quem seria prejudicado caso o PL avance?

A especialista alerta que as meninas entre 9 e 11 anos seriam as mais prejudicadas com a aprovação final da medida, e destaca que esse público tem mais dificuldade de pedir ajuda pois demoram a perceber a gestação no corpo.

'Temos uma população muito clara que vai ser afetada: as meninas, que são as principais vítimas de violência sexual no país e com risco de ficarem grávidas. Essas vítimas têm mais tem dificuldade de pedir ajuda, porque muitas vezes a violência é dentro de casa, nas suas redes de afeto, ou porque é muito difícil para essas meninas de 9, 10, 11 anos identificarem a gestação no corpo. Elas muitas vezes vão pedir ajuda mais tardiamente, após as 20, 21, 22 semanas de gestação. Segundo o código penal, elas podem interromper a gestação a qualquer tempo. Por esse projeto de lei elas estariam submetidas a uma criminalização ainda mais grave do que a criminalização do próprio estuprador', diz.

Rondon avalia que o retrocesso seria imenso, inclusive, vislumbra um aumento da mortalidade materna infantil.

'O retrocesso é imenso. Percebemos pelos dados que temos recorrentemente de gestações em crianças, que esse é um problema não resolvido. Os dados de 2023 são de mais de 12 mil meninas, de menos de 14 anos, que pariram vítimas de um estupro presumido, porque abaixo de 14 anos é uma violência sexual presumida. Se um projeto de lei como esse é aprovado, a tendência é que esse número só aumente, não só aumento das gestações compulsórias, como aumento da mortalidade materna infantil. Porque há risco de um sofrimento mental, como risco a sua própria vida. O corpo de uma menina de 9, 10, 11 anos não está preparado para seguir uma gestação até o fim. É um risco muito maior fazer o aborto', alerta.

Durante a conversa, Gabriela Rondon chama atenção para o fato da deficiência na estrutura pública hospitalar do país e diz que é preciso olhar a questão pela saúde, e não pelo direito penal.

'Os hospitais que existem são poucos, os profissionais da saúde treinados são poucos, e existe muito estigma em torno à questão. E o acesso à informação quase não existe. A gente precisa fazer um giro menos apaixonado do tema dentro da ótica criminal para o tema dentro da ótica da saúde, para proteger esses casos que parecem consensuais, nos casos de violência. A gente precisa realmente tirar o direito penal da conversa', avalia.

*Estagiária sob supervisão de Cláudio Gabriel
Por Ana Paula Jaume — Rio de Janeiro
Fonte: @cbnoficial

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