"A Lei Magnitsky foi estabelecida para impor sanções a graves violadores dos direitos humanos e pessoas que são culpadas de cleptocracia em larga escala. (...) Não foi criada para ser usada para vinganças políticas."
Para ele, a decisão anunciada pelo governo dos Estados Unidos, sob gestão de Donald Trump, de sancionar Moraes não apenas subverte a lógica da lei como também ameaça a legitimidade das sanções aplicadas em casos realmente vinculados a violações de direitos humanos.
Sanções anunciadas contra ministro do STF
Na quarta-feira, 30, o Departamento do Tesouro norte-americano, por meio do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC), informou a inclusão de Alexandre de Moraes na lista de sancionados pela Lei Magnitsky. Entre as punições previstas estão o congelamento de bens sob jurisdição americana, o bloqueio de contas, restrições financeiras e a proibição de entrada nos EUA.
Segundo o governo norte-americano, Moraes teria se utilizado do cargo para autorizar "detenções arbitrárias" e para "suprimir a liberdade de expressão". Em comunicado oficial, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, declarou:
"Moraes é responsável por uma campanha opressiva de censura, detenções arbitrárias que violam os direitos humanos e processos politizados - inclusive contra o ex-presidente Jair Bolsonaro."
A medida gerou forte reação no Brasil. O presidente Lula repudiou a decisão e afirmou ser "inaceitável a interferência do governo norte-americano na Justiça brasileira". O STF também emitiu nota oficial de apoio ao ministro.
Da Rússia para o mundo: a gênese da Lei Magnitsky
A origem da Lei Magnitsky remonta a 2012, durante o governo de Barack Obama. A norma foi concebida após a morte do advogado russo Sergei Magnitsky, que havia denunciado um esquema bilionário de fraude fiscal envolvendo autoridades do governo russo. Após revelar o caso, Magnitsky foi preso, torturado e morreu sob custódia em Moscou, após quase um ano de encarceramento.
Browder, que era cliente de Magnitsky e à época o maior investidor estrangeiro na Rússia por meio do fundo Hermitage Capital Management, liderou uma campanha internacional para responsabilizar os envolvidos.
"Muitas das pessoas envolvidas na morte dele lucraram com o crime e mantiveram o dinheiro no exterior. Então tive a ideia de congelar seus bens e proibir viagens aos EUA. Foi assim que nasceu a lei", relembrou.
Inicialmente voltada a punir apenas agentes russos, a legislação evoluiu e passou a ter alcance global. Atualmente, é uma das principais ferramentas unilaterais dos EUA para penalizar autoridades estrangeiras envolvidas em corrupção sistêmica ou violações de direitos humanos.
Casos exemplares e peso moral
Ao longo dos anos, a Lei Magnitsky foi usada em situações emblemáticas, como no caso das autoridades chinesas envolvidas na repressão à minoria uigur e nos episódios de violência estatal em Mianmar e Nicarágua. Para Browder, o uso da norma nesses contextos conferiu legitimidade internacional à luta por justiça.
"Ela tem sido usada em casos com evidências claras e contundentes de abusos de direitos humanos", destacou. Ao incluir Moraes entre os sancionados, segundo ele, o governo Trump mina essa credibilidade.
"Se ela for abusada para vinganças políticas, tira a força dos outros casos em que foi aplicada corretamente."
Caminhos para contestação
Browder acredita que a sanção pode ser revertida, uma vez que não há precedentes de aplicação indevida da norma e que o Judiciário norte-americano é independente do Executivo.
"Acredito que há fortes argumentos para que a decisão seja anulada pelos tribunais. A lei não foi usada como foi originalmente concebida."
Segundo ele, embora a decisão tenha vindo do governo dos EUA, há possibilidade de revisão judicial por tratar-se de uma legislação federal americana.
Um precedente perigoso
Para o idealizador da lei, o caso representa a primeira vez em que a norma é usada de maneira desvirtuada. A consequência pode ser desastrosa, segundo ele: "comprometer a integridade" de uma ferramenta que serviu, até agora, como símbolo de justiça global.
"A Lei Magnitsky foi aprovada em mais de 35 países e continua sendo uma das mais importantes no combate a abusos de direitos humanos. É decepcionante ver esse tipo de manobra."
Browder conclui que, ainda que os EUA mantenham o uso político da norma, espera que os tribunais possam restabelecer o espírito da lei.
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