Treta: o endereçamento no Novo Código de Processo Civil - Por Leonardo Sampaio

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bit.ly/36WWKf6 | Olá leitor/a! De início, peço permissão para abrir mão do formalismo quase sempre necessário quando discutimos determinado tema jurídico. É que venho observando que quando alguém aborda a temática a seguir sempre nascem rígidas discussões entre os operadores do direito. Então, achei prudente abordar a temática da forma menos formal possível, pontuando o assunto de uma forma leve, descontraída e, acima de tudo, sem trazer verdades absolutas e incontestáveis, já que o tema ainda causa alvoroço.

Quero lançar comentários sobre algo que causa uma treta gigante no mundo jurídico: O ENDEREÇAMENTO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL!

Então, se você também é daqueles que quando se depara com uma confusão, logo pega uma pipoca e um suco, senta e fica assistindo de camarote, chegue mais, pois aqui é seu lugar!

Essa semana me deparei com uma publicação da página Direito da Depressão, no Facebook, que gerou centenas de comentários, uma eterna discussão entre os usuários da rede social. Vi o post e parei para analisar as manifestações. Foi a minha melhor escolha naquele dia, pois o tempo investido me fez dar boas risadas.

Analisemos a publicação:

Então, para ilustrar, trago alguns dos comentários que vi na publicação. Também, sugiro que acesse a página para ver a treta de perto. Ela não para de crescer! É só clicar aqui.

Pois vamos ao que interessa!

Nós sabemos que quando redigimos uma petição – seja inicial ou intermediária – temos que fazer a indicação ao órgão jurisdicional que ela é dirigida.

No antigo Código de Processo Civil, o de 1973, quem definia os requisitos da petição inicial era o artigo 282. Então, dentro da discussão de endereçamento, o artigo trazia seguinte enredo:

“Art. 282. A petição inicial indicará:

I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida;"

Perceba que código determinava o endereçamento ao juiz ou tribunal, o que fez enraizar que o endereçamento ao juiz seria: “Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Juiz (a) de Direito (...)”. Por seu turno, quando dirigida a um Tribunal, o endereçamento seria: “Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Ministro (a) Presidente (a) do Colendo Tribunal (...)”. E por aí vai...

Por décadas, sob a vigência do Código de Processo Civil de 1973, esta foi a forma correta.

Acontece que com o advento Código de Processo Civil de 2015, tivemos sutil alteração no tocante a regra processual que determina o endereçamento da petição.

Agora, sob a exegese do novo Código de Processo Civil, que é de 2015, os requisitos da petição inicial estão elencados no artigo 319, que destaco a seguir:

“Art. 319. A petição inicial indicará:

I – O JUÍZO a que é dirigida;"

O que se extrai é que enquanto o já sem efeito artigo 282, do CPC/73, determinava que a petição fosse dirigida ao juiz ou Tribunal, a nova regra determina que a peça deve constar tão somente o JUÍZO a que é dirigida.

E a esta altura da leitura você deve estar igual ao o John Travolta completamente confuso e se questionando:

"E DAÍ QUE O NOVO CPC DIZ QUE O ENDEREÇAMENTO É AO JUÍZO? O QUE MUDOU?"



Lhe apresento então a resposta!

Hoje, podemos dizer que não mais precisamos endereçar ao "Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Juiz (a) de Direito (...)" ou ao “Excelentíssimo (a) Senhor (a) Doutor (a) Ministro (a) Presidente (a) do Colendo Tribunal (...)”, como muitos ainda fazem e defendem.

Hoje, podemos endereçar tão somente ao juízo e isso implica dizer que sua petição deve constar no topo da página “AO JUÍZO DA VARA TAL”. Simples assim!

No livro “Comentários ao Código de Processo Civil” (2016, p. 419), dos ilustres George Salomão Leite, Eduardo Arruda Alvim, Angélica Arruda Alvim e Araken de Assis, com a sabedoria são características deles, bem definem que:

“A petição inicial deverá indicar o juízo a que é dirigida. Em vez de valer-se da expressão ‘juiz ou tribunal’, contida no CPC/73, adotou o termo ‘juízo’, que abrange juízo de primeira instância ou tribunal. A petição inicial deve indicar o juízo e não o juiz. Ainda que se saiba, numa distribuição por dependência ou em comarca de vara ou juízo único, quem seja o juiz, este não deve ser nominado, sendo suficiente a indicação do juízo a que é dirigida a petição inicial”.

Em se falando de Processo Civil, impossível não trazer os ensinamentos do professor Alexandre de Freitas Câmara, que em sua obra “O novo processo civil brasileiro” (2017, .p 194), também assevera que:

“(...) A petição inicial é documento que precisa preencher uma série de requisitos formais, sem os quais não se pode ter o válido e regular desenvolvimento do processo. Deve a petição inicial indicar, antes de tudo, o juízo a que é dirigida (art. 319, I). Significa isto que incumbe ao demandante indicar o órgão jurisdicional que considera competente para o processo. A ele, então, o processo será encaminhado (e, havendo mais de um da mesma espécie na comarca, seção ou subseção judiciária, far-se-á entre eles a distribuição)”.

Portanto, se você está endereçando, por exemplo, à vara da fazenda pública, sua petição pode constar no cabeçalho tão somente “AO JUÍZO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA TAL, ESTADO TAL”, ou se está peticionando à vara de cível, poderá usar “AO JUÍZO DA VARA CÍVEL DA COMARCA TAL, ESTADO TAL”.

Há quem defenda que o novo endereçamento deve constar o termo “Meritíssimo Juízo da Vara Tal”ou “MM Juízo da Vara Tal”, contudo, com todo respeito a quem o faz e defende, discordo. É que se fizéssemos assim, continuaríamos a direcionar, de certa forma, ao magistrado.

No entanto, é importante registrar que dificilmente uma petição será indeferida se constar o endereçamento nos moldes antigo do antigo Código de Processo Civil. Embora esteja [errado] em desconformidade com o NCPC/2015, dificilmente um magistrado irá indeferir uma petição caso esta ainda apresente [os extensos elogios a este] o antigo endereçamento.

Contudo, eu, defensor da insubordinação do advogado ao magistrado, na prática forense, defendo que a petição deve indicar o juízo a que é dirigida. Ao passo que abro mão do “Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito”, conforme autoriza o novo códex. Penso que o antigo endereçamento além de demodê, é extremamente desnecessário! Inclusive, assim o faço quando estou peticionando e nunca tive problemas.

Ademais, é de se surpreender encontrar que ainda existem advogados/as que entendem que endereçar ao JUÍZO e não ao Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito (veja que cansativo!) faria com que o magistrado fizesse alguma represália quando da apreciação da peça. Já havia escutado isso de um colega advogado atuante em minha comarca e vi comentário no mesmo sentido na publicação que originou este texto.

Você pode abrir mão daquele extenso endereçamento que endeusa o magistrado. Não é isso que lhe fará ter um requerimento indeferido. Se você acredita que deve peticionar em tom de submissão, sinto em lhe informar, tem algo errado em sua advocacia.

Por fim, alerto aos prestadores do Exame de Ordem que na última segunda fase do certame (Exame XXVI), nas provas de Direito EmpresarialCivil e Administrativo (clique para visualizar os espelhos) a banca cobrou o endereçamento dirigido ao juízo.

Então, a conclusão que podemos fazer sobre esta discussão é que trata-se de uma briga entre a uma prática que caiu no gosto do operadores do direito versus a pequena alteração que o NCPC/2015 trouxe no tocante ao endereçamento. Modificação esta que até então não despertou o interesse da maioria a ponto de fazer abandonar a antiga forma de endereçar. Alteração esta que, pelo o que se viu e se vê, não trará um indeferimento da petição por parte do magistrado. Alteração esta que, ao que parece, ainda trará grandes discussões entre os operadores do direito.
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Leonardo Sampaio
Advogado
Advogado, inscrito na OAB-BA sob o número 46.875, bacharel em Direito pela Unesulbahia - Faculdades Integradas do Extremo Sul da Bahia , pós-graduando em Direito Administrativo e Constitucional pela EPD - Escola Paulista de Direito, membro do escritório Vasconcelos Advogados Associados, membro das Comissões de Direitos Humanos e de Direito Eletrônico e Novas Tecnologias da OAB Subseção Eunápolis/BA, coordenador dos projetos 'OAB vai à escola' e 'OAB vai à faculdade' na cidade de Eunápolis/BA, coordenador dos Seminários Grandes Questões e membro da Cogito Ergo Sum, que realiza cursos e eventos jurídicos.
Fonte: Jus Brasil

3/Comentários

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  1. Bom dia. Parabenizo o Nobre Colega paras colocações. Esta correto. Infelizmente o "puxa-saquismo" de advogados é muito grande. OU medo, como diz um outro, vai ficar marcado. Ô classe desunida. Citando um desembargador que deu aula a mim, ele dizia, não entendo porque os advogados, em número tão grande, em medo de juízes.

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  2. Parabens, Leonardo! Um texto inteligente, que provoca reflexões e escrito em uma linguagem bacana, antenada aos novos tempos!

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  3. Meus parabéns colega! O Advogado, o Juiz e o Promotor compõem a tríade que produz a decisão judicial, portanto exercem funções coordenativas e não subordinativas. Assim como colocado no texto, devemos nos atentar sempre à isso até mesmo em nossas petições iniciais, ou melhor, Termo de Instauração do Processo Judicial, pois o advogado nada pede.

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