Acesso ao celular exige autorização judicial?

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bit.ly/39zZrWh | É esse questionamento que o Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.042.075, de relatoria do ministro Dias Toffoli, com repercussão geral reconhecida irá responder.

Resumidamente o caso que deu origem a repercussão geral se trata de uma situação que, o autor, após o cometimento do crime de roubo, deixou seu aparelho celular cair no chão durante a fuga e de posse do aparelho, os policiais verificaram a existência de fotografias do acusado na memória do aparelho, o que possibilitou sua identificação e prisão.

O tema 977 da repercussão geral ainda não tem previsão de ser julgado, mas no processo a Procuradoria Geral da República já se manifestou. Atentem-se, pois a Procuradora Raquel Elias Ferreira Dodge propôs a fixação da seguinte tese:

É lícita a prova produzida durante o inquérito policial relativa ao acesso, sem autorização judicial, a registros, fotos, vídeos e demais informações contidos em aparelho de telefone celular, relacionados à conduta delitiva.

Em seu parecer alega que não se discute acerca da proteção que as comunicações telefônicas recebem, para ela a controvérsia reside precisamente no acesso a dados telefônicos, que não se confundem com a conversação em si.

Fez menção ao HC 91.867/PA julgado pelo STF em que o Min. Relator Gilmar Mendes decidiu que

não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação ‘de dados’ e não os ‘dados’.

Por fim, relata que diante de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, por parte dos órgãos estatais, a adoção de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas.

Ou seja, para a procuradora a polícia, a “nossa” polícia que é extremamente violenta, que possui interesse e que privilegia a perseguição aos pobres (BACILA, 2005. p. 116), que reiteradamente é denunciada devido à violência generalizada e aos abusos cometidos ganhará carta branca para que mais abusos ocorram tudo em nome do “interesse público”.

Esse processo penal que almeja a procuradora que busca cada vez mais dar celeridade à obtenção de provas sem se importar com o alto grau de violação a privacidade e intimidade se aproxima de um processo penal simbólico, útil, apenas, para tranquilizar o clamor público no combate à criminalidade.

Ocorre que as intervenções estatais na esfera privada dos cidadãos devem ser admissíveis unicamente quando imposto pela lei que obedeça a ordem constitucional (FURTADO MENDES, 2020. p. 34-35). Tendo em vista a variedade de funcionalidades que o aparelho celular oferece, os limites estatais na obtenção dessas informações não podem ser protegidos unicamente pela lei 9.296/96, sob o argumento de que tal lei não contempla a proteção de dados digitais (EILBERG; GLOECKNER, 2019).

Os argumentos da Procuradora não conseguem dar conta da complexidade dos direitos de personalidade envolvendo os dispositivos multifuncionais (EILBERG; GLOECKNER, 2019).

Uma pesquisa de informações digitais em um telefone celular implica interesses de privacidade individuais substancialmente maiores do que uma breve pesquisa física, portanto merecem maior proteção.

Hodiernamente, autorizar a violação de dispositivos informáticos representa uma violação muito maior na privacidade do que na busca e apreensão no domicílio, pois nem no domicílio se poderia encontrar tanta informação (EILBERG; GLOECKNER, 2019).

Dessa forma, por imposição lógica em respeito à Constituição Federal deve o Supremo Tribunal Federal pacificar o entendimento quanto a imposição de autorização judicial específica para acessar o aparelho telefônico, e quanto ao legislativo, deve incluir no cap. XI do Código de Processo Penal e regular, urgentemente, a busca e a apreensão em dispositivos informáticos levando em consideração o alto grau de violação que o acesso a esses dados podem causar na vida privada da pessoa.
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REFERÊNCIAS

BACILA, Carlos Roberto. Estigmas: um estudo sobre os preconceitos. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2005. p. 116.

EILBERG, Daniela Dora; GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Busca e apreensão de dados em telefones celulares: novos desafios diante dos avanços tecnológicos. Revista Brasileira de Ciências Criminais / vol. 156/2019 / p. 353 – 393 / Jun/2019.

FURTADO MENDES, Carlos Helder Carvalho. Tecnoinvestigação criminal: entre a proteção de dados e a Infiltração por software. Salvador: Editora Juspodivm, 2020.
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Por Felipe G. Geitens e Tamara M. da Silva
Fonte: Canal Ciências Criminais

1/Comentários

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  1. O artigo apresenta um parecer técnico e após uma inútil e infundada crítica às polícias. Não se deve esquecer para que as leis e o Direito servem. Por isso q no Brasil há tanta impunidade, pois quem está a margem da sociedade, recorre aos direitos dela, aí fica complicado fazer Justiça.

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