Shopping é condenado a indenizar trabalhadora negra que teria sido orientada a desfazer penteado afro

shopping condenado indenizar trabalhadora penteado afro
bit.ly/3mtXgsQ | O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) condenou o Shopping Total a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil a uma ex-funcionária negra que teria retirado seus dreads – um tipo de penteado afro – por ordem da supervisora, em Porto Alegre. A decisão, unânime, é das desembargadoras Maria Cristina Schaan Ferreira, relatora do acórdão, Simone Maria Nunes e Beatriz Renck, da 6ª Turma do TRT.

O shopping afirmou que irá recorrer da decisão. A ex-funcionária não foi localizada pela reportagem.

De acordo com o TRT, a trabalhadora teria feito o penteado, que ganhou de presente do marido, em março de 2017. Ela atuava como fiscal de higienização no shopping e relata ter recebido uma ordem para a retirada dos dreads. A supervisora teria informado que a exigência teria partido do setor de Recursos Humanos. A trabalhadora informou ao tribunal que o custo para fazer o penteado foi de R$ 1 mil, mais R$ 250 para a retirada dos dreads.

Em depoimento, a mulher relatou que chorou por diversas vezes no ambiente de trabalho e que não tinha mais vontade de se olhar no espelho, pois havia incorporado o cabelo ao seu estilo. Disse também, segundo o TRT, que perdeu a vontade de ir trabalhar no local e que acredita que deveria ser reconhecida pelo trabalho desempenhado, não pela raça e cabelo.

A ex-funcionária relatou ainda que havia tratamento diferenciado em relação às folgas concedidas, recebendo menos dias do que os demais colegas. Ao reclamar, afirma que foi repreendida, assim como outros colegas que questionaram sobre a distinção.

A defesa do Shopping Total afirmou que "jamais tal recomendação seria feita" e que  "possui inúmeros colaboradores afrodescendentes, sendo que vários usam cabelo trançado, com dreadlocks ou mesmo no seu formato e volume naturais".

Em primeira instância, o juízo da 28ª Vara do Trabalho de Porto Alegre havia considerado insuficientes as provas para a condenação, o que foi modificado pelo colegiado.

Em segundo grau, a relatora, desembargadora Maria Cristina, considerou que ficou provada a atitude discriminatória, com base no depoimento de uma das testemunhas que afirmou que a prática era reiterada no local e que ela mesma e outra colega já teriam recebido ordens com o mesmo teor.

O superintendente do shopping, Eduardo Oltramari, afirmou que a decisão se "baseou unicamente no depoimento de uma só testemunha" e que o estabelecimento mantém uma relação de pluralidade com os funcionários:

— Nós temos uma relação de pluralidade com os nossos colaboradores e não fazemos nenhuma distinção de religião, raça, cor. Esse é o nosso procedimento padrão. O próprio shopping não é voltado a um tipo de público apenas.

Ele não descarta a "possibilidade de um mal entendido" e afirma que é possível que as pessoas que orientaram a ex-funcionária em relação ao cabelo estivessem "externalizando comportamentos que acham corretos, mas que não tem alinhamento" com o regramento da empresa.

— É constrangedor pra gente conviver com uma situação dessa envergadura — afirma.

Tribunal também anulou demissão por justa causa

Segundo Oltramari, a trabalhadora havia sido despedida por justa causa pelo shopping porque teria utilizado atestados médicos falsos. No entanto, no recurso, a 6ª Turma anulou a justa causa e determinou a rescisão indireta do contrato, em razão "da falta grave cometida anteriormente pelo empregador", conforme o TRT.

"No caso concreto, a prática discriminatória e preconceituosa perpetrada pela reclamada, consoante analisado no item anterior, é grave o suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Entendo que o fato de a reclamante ter sido posteriormente despedida por justa causa não obsta esse entendimento, na medida em que os fatos relativos à prática discriminatória são anteriores à justa causa", afirmou a relatora na ação.

Assim, a ex-funcionária também deve ter direito ao pagamento de aviso prévio proporcional, multa de 40% sobre o FGTS, liberação dos depósitos do FGTS, bem como ao fornecimento de guias para habilitação do seguro-desemprego. Ela também deverá receber R$ 500 por danos materiais.

"Em que pese não tenha vindo aos autos prova dos valores referidos pela autora na inicial, é inequívoco que há um custo para a realização das tranças afro e para sua retirada, razão pela qual arbitro o valor devido a esse título em R$ 500,00, em observância ao princípio da razoabilidade", destacou a desembargadora Maria Cristina.

Bruna Viesseri
Fonte: gauchazh.clicrbs.com.br

1/Comentários

Agradecemos pelo seu comentário!

Postar um comentário

Agradecemos pelo seu comentário!

Anterior Próxima