Conforme a relatora do recurso, desembargadora Marilsen Andrade Addario, se após o deferimento da liminar de reintegração de posse, cujo cumprimento demandaria grande contingente humano para o transporte de 4.500 suínos confinados na granja locada, adveio a pandemia de Covid-19, com alto risco de contaminação e disseminação, tal circunstância deve ser ponderada na fase recursal.
"Se além da desocupação da granja locada acarretar grande risco de contágio humano por Covid-19, a maior parte das impropriedades contratuais perpetradas pelo locatário quanto ao cumprimento de regras ambientais até então desatendidas passaram a ser observadas, e que as licenças necessárias à exploração da atividade já foram protocolizadas junto aos órgãos competentes, conveniente a sua manutenção na posse do imóvel, sendo que a sua retomada imediata pelo locador se revela uma medida excepcional, mormente se o locatário não se encontra inadimplente", complementou a relatora.
No recurso, dentre as diversas alegações, a locatária sustentou que havia sido forjado um cenário de descumprimento de regras ambientais pela locatária de modo a favorecer sua pretensão de retomada prematura do imóvel, uma vez que a granja foi vendida a terceiros ainda na vigência do contrato, sem conferir-lhe o exercício do direito de preferência.
Afirmou que vem se deparando com uma série de obstáculos impostos pelos locadores para execução das atividades-fim da granja, tais como o não envio da documentação necessária ao protocolo do licenciamento ambiental, a não autorização de ampliação da piscina já existente no local e a não disponibilização de área para construção da terceira piscina, locais esses que servem de depósito para os dejetos oriundos da criação e abate de suínos.
Aduziu ainda que os locadores não haviam enviado os documentos imprescindíveis para a regularização ambiental junto à Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Afirmou que além de cumprir todas as obrigações contratuais assumidas, implementou várias melhorias no local, mais especificamente a reforma dos barracões, a ampliação dos comedouros e construção de novos cochos para alimentação dos animais, a reforma e construção das piscinas, das instalações elétricas e hidráulicas, assim como a ampliação da linha de automação.
No mais, ponderou que diante da emergência sanitária internacional, diante da pandemia de Covid-19 — situação que inexistia quando do deferimento da liminar reintegratória —, a operação de desocupação da granja representa um altíssimo risco à ampla disseminação do coronavírus, pois demanda um grande contingente de pessoas e maquinário para o transporte e manejo de 4.500 cabeças de suínos em regime de engorda, o que por si só evidenciaria o risco de lesão grave e de difícil reparação.
Já os proprietários alegaram que os locatários estão se valendo das medidas sanitárias para obter vantagem indevida a fim de permanecer na posse da granja. Aduziu que a desocupação demandaria no máximo quatro pessoas e dois caminhões. Assinalaram que os dejetos das baias continuam sendo despejados diretamente ao solo, causando mau cheiro insuportável, proliferação de moscas e possibilidade de contaminação do solo, em flagrante desrespeito às normas sanitárias e ambientais.
Dentre outras justificativas, assinalaram que embora não tivesse sido fixado no contrato prazo para o cumprimento das obrigações ambientais e sanitárias, as atividades não poderiam sequer terem sido iniciadas antes da obtenção das respectivas licenças. Que inexiste qualquer prova de que os locadores tivessem se negado a entregar qualquer documento à locatária ou mesmo tentado impor obstáculos à regularização da atividade.
Na decisão, a desembargadora assinalou que a atual conjuntura sanitária mundial mudou drasticamente desde a data da decisão agravada, em 23 de janeiro de 2020. “O cumprimento da liminar reintegratória impugnada, com a necessidade de remoção de um rebanho de mais de quatro mil suínos e a sua alocação para outra área demandará, sem sombra de dúvida, a movimentação de um grande capital humano que, desta forma, ficará exposto ao risco de contágio pela Covid-19.”
Ainda conforme a relatora, no caso concreto dos autos, no qual o que se discute a resolução de um contrato de locação sem qualquer questionamento acerca de inadimplemento de alugueres pelo locatário, a reintegração de posse deve ser compreendida como uma hipótese excepcional.
Após vistorias do Núcleo Integrado de Fiscalização do Município de Sorriso, foi constatado que, de cinco determinações feitas, três foram consideradas atendidas e duas se encontravam pendentes, porém, ainda no prazo fixado para o cumprimento. “Além disso, é incontroverso nos autos que a locatária deu entrada com os pedidos de licenciamento faltantes, ainda que tardiamente, dependendo, agora, do trâmite burocrático da administração. Bem ou mal, certo é que a locatária sanou parte das impropriedades contratuais que vinha praticando e vem tentando solucionar as exigências pendentes.”
Acompanharam voto da relatora os desembargadores Clarice Claudino da Silva e Sebastião de Moraes Filho. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-MT.
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1008025-07.2020.8.11.0000
Fonte: Conjur
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