A “vaidade” de Chernobyl e Titanic no Mundo Jurídico

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Por @leonolascoadvcrim | “Brigada de incêndio 242? Socorro! O Reator nº 4 está em chamas.”

APRILIS (Abrir)

Se existe um mês que ficou marcado por grandes acontecimentos no decorrer do século XX, foi o quarto mês do ano civil no calendário gregoriano, composto por exatos 30 dias, também conhecido como mês do meu aniversário, qual seja, Abril

Tragédias como o naufrágio do Titanic e o acidente de Chernobyl de alguma forma ressignificaram o mês de abril do século XX não apenas para os familiares e entes queridos que partiram, mas para toda humanidade, que até os dias de hoje, permanece atônita ao refletir sobre tais acontecimentos. 

 Ambos os responsáveis (pelo menos os principais) pelas catástrofes citadas nutriam um sentimento comum, que definitivamente pode cegar o mais lúcido e sensato dentre os homens que vivem nesta terra: a vaidade

“A vaidade é, definitivamente, meu pecado predileto” – Diabo, representado por Al Pacino, no filme “O Advogado do Diabo”. 

Pois bem, se nas (sábias) palavras de Alice Ferreira “ler é viajar sem sair do lugar(...)”, sugiro que apertem os cintos, pois vamos dar um pulo na Inglaterra, mais precisamente no ano de 1215, século XIII. #vemcomigo 

Com a devida licença poética e pelo amor à didática e a “inclusão intelectual”, vou ratificar: século 13. Atualmente estamos no século “21”. 

O DEVIDO PROCESSO LEGAL DE 1215 – João Sem Terra, “século 13”:

***Dica do autor: assista ao último filme do Robin Hood (com o Russel Crowe)!

O jovem João Sem Terra (John Lackland) era o quarto filho de Henrique II, logo não haveria possibilidade de receber herança, com base no ordenamento jurídico da época. Ricardo (Coração de Leão era o filho primogênito de Henrique II).

Vale lembrar que no período medieval (século XIII), o poder dos governantes era ilimitado, ou seja, o poder do monarca era absoluto. Absolutismo! (Lembra quando Rousseau “falava” que o poder corrompe?! Bem, errado ele não estava...). 

O Rei Ricardo “Coração de Leão” foi lutar nas cruzadas (guerra) e morreu. Por conta do falecimento de Ricardo “Coração de Leão”, João Sem Terra assumiu o trono, mesmo sem possuir nenhum bem valioso, mesmo sem possuir nenhum “lotezinho” de terra.

Por algum motivo que não nos cabe julgar (e tampouco “filosofar” a respeito), o fato é que o “sucesso subiu à cabeça” de João Sem Terra, que com o passar do tempo, reinava cada vez mais para si, abusava e muito da função que lhe havia sido “herdada de bandeja”! O rei tinha o poder absoluto! Logo, o rei criava as leis, administrava o país como um todo e julgava as causas, conforme suas convicções e vontades. O rei era a lei, o rei era a constituição! 

Apesar de estar na posição de rei, João não tinha todo esse poder todo (não tinha terras) e por conta dos abusos em todas as formas do poder, aumentar consideravelmente os tributos, confiscar terras sem qualquer justificativa, o povo cansou. 

Quando se lembrar do Direito à Resistência, traga à memória a máxima (atemporal), do gigante Sobral Pinto: “Todo o poder emana do povo”.

O povo impôs ao monarca João Sem Terra um documento que além de limitar o poder dos monarcas, continha uma série de direitos e garantias dos indivíduos contra o Estado: Magna Carta de 1215, assinado por um acuado e constrangido rei sem terra. O objetivo principal da Lei do Rei João Sem Terra era limitar o poder do monarca.

Alguns direitos constantes na Carta da Liberdade de 1215:

  • Liberdades Eclesiásticas;
  • Direito de Propriedade (Terra);
  • Vedação ao Confisco (Terra);
  • Devido Processo Legal;
  • Acesso à Justiça;
  • Liberdade de Locomoção;
  • Tribunal do Júri.

O devido processo legal são as regras do jogo. Seja o devido processo legal de caráter procedimental (procedural due process) ou o devido processo legal substancial, regras do jogo. As regras do jogo não podem ser alteradas no decorrer do jogo! Até porque se pudesse, e eu fosse o árbitro do “fatídico 7 x 1”, além de anular o gol do Klose (que tirou o recorde de gols em Copas do Mundo do Ronaldo Fenômeno), eu expulsaria o Dante no primeiro gol da Alemanha por ter dito que “conhecia bem o futebol alemão”.

No devido processo legal temos a mesma mecânica!  As regras são as regras! Quebrar as regras em nome de alguma “segurança”, sentimento pessoal de vaidade ou qualquer outro direito jamais pode ser tolerado, seja você operador do direito ou não. Todas as vezes que buscamos atalhos, deixamos de maturar algum conceito e em qualquer área da vida, isso pode ser fatal.

“NÃO CONSIGO IMAGINAR QUAISQUER CONDIÇÕES QUE LEVASSEM O NAVIO AO NAUFRÁGIO. AS MODERNAS TÉCNICAS DE CONSTRUÇÃO NAVAL JÁ SUPERARAM ESTE ESTÁGIO”. – Comandante E.J. Smith (Comandante do Royal Mail Ship Titanic)

Um transatlântico do porte do RMS Titanic, em sua viagem inaugural, com 2.224 (duas mil duzentas e vinte e quatro) pessoas a bordo, desde a saída do porto de Southampton (Inglaterra) estava condenado, pelo menos no aspecto ético / moral, haja vista que os botes salva- vidas eram insuficientes. Em caso de naufrágio, mais da metade estava condenada à morte lenta e sofrida nas águas geladas do atlântico.

Qual a necessidade de botes salva- vidas para todos os 2.224 passageiros e tripulação? “Nenhuma, óbvio!”. Custa- me crer que algo diferente tenha passado pela mente dos (ir)responsáveis. 

Na cabeça dos engenheiros navais Alexander Carlisle e Thomas Andrews, bem como nos gestores da empresa “White Star Line” e do Comandante do RMS Titanic, o senhor Edward Smith, o transatlântico (maior e mais moderno da época) era inafundável! Isso mesmo, impossível afundar! Se houvesse algum acidente, pouco mais de 1.100 (mil e cem) pessoas, poderiam lutar pela vida.

Pois bem, o acidente aconteceu, seja por arrogância, soberba ou imprudência, o navio chocou- se com um enorme iceberg e pouco mais de duas horas e quarenta minutos após a colisão, estava completamente submerso.

Diversos documentários e filmes “romantizados” relatam o pior lado do ser humano desde o momento da colisão, até duas horas e quarenta depois, quando submerso. Passageiros da primeira classe tentando subornar os oficiais responsáveis por quem poderia entrar nos botes, oficiais recebendo suborno para descerem botes com homens (primeiro mulheres e crianças), oficiais se deparando com situações similares à “escolha de Sofia”, passageiros da primeira classe “catando” crianças da terceira classe para ingressarem nos botes, roubos, assassinatos, pessoas desprezando os músicos que permaneceram tocando seus instrumentos, etc... Cada um por si! 

A INCONSEQUENTE TEIMOSIA DO ENGENHEIRO CHEFE DE CHERNOBYL: ANATOLY DYATLOV

“Não é preciso (me dizer nada), você não é pago para pensar. Eu tomo as decisões e vocês obedecem.” 

Pelo menos oito engenheiros tão capacitados quanto o engenheiro chefe de Chernobyl, sinalizaram o provável problema que poderia acontecer caso o teste fosse realizado. Ainda assim, Anatoly Dyatlov insistiu: “eu sou o chefe aqui, prossigam”.

Assista o documentário “Hora Zero – o Desastre de Chernobyl” e já comece a ter arrepios com a irresponsabilidade do engenheiro chefe, o senhor Anatoly Dyatlov, que apesar dos conselhos dos demais colegas de profissão, insistiu em fazer o teste nos equipamentos da usina nuclear. Pois bem, o resto é história, um erro de projeto fez com que a energia do reator subiu e ocasionou a explosão na madrugada de 26/04/1986. (um dos sobreviventes disse que foi uma “cena linda e parecia um arco- íris subindo para o céu”). Apesar da ciência do acidente, as autoridades hesitaram em expor o tamanho da devastação. Apenas dias depois que a União Soviética comunicou a explosão do reator número 4 da usina. 

O descaso das autoridades soviéticas em relação aos moradores de Chernobyl e Pripyat, bem como com os bombeiros foi total! Centenas de reservistas foram convocados e alguns saquearam as casas abandonadas, saquearam casas não abandonadas, etc... Mais uma vez o lado primitivo (e irracional) da humanidade veio à tona! Lembrem- se, o devido processo legal são as regras de qualquer jogo. 

Devido processo legal são as regras de qualquer jogo, seja no processual, seja no jogo da vida, sempre que alguma cadeia natural é quebrada, afirmo, com altíssimo grau de probabilidade que haverá problema, e não solução. 
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Por Leonardo R. Nolasco

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