Com base nesse entendimento, a 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a ilicitude probatória da confissão informal de um homem acusado por comércio ilegal de munições de armas de fogo.
Em primeiro grau, o réu foi condenado a seis anos de reclusão, em regime inicial semiaberto. No recurso ao TJ-SP, a defesa sustentou a nulidade da confissão informal do réu a policiais civis, uma vez que ele não teria sido advertido sobre o direito ao silêncio, com a consequente contaminação de provas derivadas do depoimento.
Ao acolher o pedido, o relator, desembargador Marcos Alexandre Coelho Zilli, citou a teoria dos frutos da árvore envenenada, e disse que não se pode aproveitar a prova cuja descoberta tenha origem ilícita. Ele também afirmou que o direito a não autoincriminação é corolário das garantias da presunção de inocência e da ampla defesa.
"Para que o exercício do direito seja plenamente assegurado, sobretudo no contexto da investigação criminal onde a restrição de direitos fundamentais é mais sensível, é indispensável que o imputado seja informado do direito, de sua extensão e de seu limite", afirmou.
Conforme o magistrado, o STF e o STJ já pacificaram o entendimento de que nenhuma pessoa, uma vez confrontada com a atividade persecutória estatal, pode ser compelida a produzir prova contra si mesma. Zilli também observou que os policiais responsáveis pela prisão devem advertir o investigado sobre o direito ao silêncio, o que não teria ocorrido no caso dos autos.
"Conforme se vislumbra dos autos, a condenação do acusado pela prática do delito previsto no artigo 17, da Lei 10.826/2003 fundou-se, exclusivamente, na suposta confissão informal realizada aos policiais quando da sua prisão em flagrante. Não há, contudo, qualquer elemento a indicar que as declarações do acusado perante os policiais tivessem sido precedidas da advertência ao direito ao silêncio", disse o relator.
Zilli afirmou ainda que, ao prestar depoimento, os policiais civis responsáveis pela prisão do réu nada mencionaram sobre a advertência do direito ao silêncio, se limitando a dizer que ele havia confirmado a venda das munições. Diante de tal quadro, na visão do magistrado, é "inegável" a violação ao direito ao silêncio.
"É irrelevante a ausência de norma processual que estabeleça o dever aos policiais de previamente cientificar a pessoa presa dos termos daquele direito. Isto porque, tal direito está previsto no artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição, e no artigo 8.2.g, da Convenção Americana de Direitos Humanos, normas que possuem eficácia imediata, não dependendo de normas infraconstitucionais para sua regulamentação", completou.
Assim, em se tratando de prova ilícita, o desembargador disse que a consequência é a sua imprestabilidade para fins processuais. Porém, Zilli não invalidou toda a investigação, uma vez que os policiais tinham um mandado de busca e apreensão e farto material probatório contra o acusado antes de obter a confissão informal, que só ocorreu após a apreensão das munições.
Portanto, o relator reconheceu a legalidade da investigação, da apreensão das munições e da prisão em flagrante do réu, anulando apenas a confissão informal e a menção dos policiais a tal depoimento. No mérito, a condenação foi mantida, mas Zilli desclassificou a conduta do acusado do delito do artigo 17, da Lei 10.826/2003, para o artigo 12, da mesma norma.
Com isso, a pena foi reduzida para um ano de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por uma restritiva de direitos consistente na prestação de serviços à comunidade, a ser fixada pelo Juízo da Execução Penal. A decisão se deu por unanimidade.
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1500308-45.2020.8.26.0556
Por Tábata Viapiana
Fonte: Conjur
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