Por parecer sem sentido, a sentença renovou uma antiga questão: por que sentenciar um réu a múltiplas penas de prisão perpétua, se ele só tem uma vida? Sites jurídicos explicam.
Ramos foi sentenciado a cinco penas de prisão perpétua por homicídio de primeiro grau dos cinco jornalistas, mais uma prisão perpétua adicional e mais 345 anos por acusações de outros crimes, que incluíram tentativas de homicídio, homicídio com grau atenuado de culpa e uso de arma de fogo para cometer crimes violentos — tudo que a promotoria pediu.
No julgamento, o advogado de Jarrod Ramos tentou a "defesa da insanidade", mas não colou. Os promotores alegaram que o crime foi premeditado, motivado por desejo de vingança. O jornal publicou uma história sobre seu passado que, segundo o réu, o deixou com a fama de "doente mental" e "predador". E o levou a perder o emprego e a ser rejeitado por familiares e amigos.
Sob o título de "Jarrod Wants To Be Your Friend" ("Jarrod quer ser seu amigo"), a reportagem descreveu a condenação de Jarrod Ramos por "stalking" (perseguição a alguém) e assédio de uma mulher, através do Facebook, bem como por e-mail e mensagens de texto — contravenções penais que o réu admitiu.
Ramos processou o jornal, o jornalista e o editor, mas um juiz trancou a ação. Ele então processou o juiz, mas também sem sucesso. Assim, ele decidiu fazer justiça com as próprias mãos. Depois de planejar e preparar o "massacre" por algum tempo, Ramos entrou na redação do jornal com a arma de fogo, munição extra e granadas. Porém, tanto o jornalista que escreveu a história, quanto o editor, já não estavam mais no jornal. Morreram os que estavam na redação.
28 prisões perpétuas, mais 99 anos, mais uma pena de morte
A sentença aplicada a Ramos é apenas a nona mais longa da história dos EUA, segundo a lista de sentenças mais longas (do mundo) da Wikipédia. O recorde vai para Terry Nichols, que foi sentenciado em 1995 a 161 penas de prisão perpétua, mais 9.300 anos, sem direito a livramento condicional.Nichols foi condenado, em abril de 1995, pela explosão de uma bomba na Cidade de Oklahoma, que matou 168 pessoas e feriu 680. Seu parceiro de crime (e autor da explosão), Timothy McVeigh, foi condenado à pena de morte e executado em junho de 2001.
Mas a sentença mais longa em tempo de prisão, segundo o site FindLaw, provavelmente foi a aplicada, em 1994, a Charles Robinson, também de Oklahoma, que ficou conhecido como estuprador de crianças: 30 mil anos de prisão — 5.000 anos para cada uma das seis acusações contra ele.
A sentença que soa mais estranha foi a aplicada da Bobbie Joe Long: 28 prisões perpétuas, mais 99 anos e mais 1 pena de morte. Long foi condenado pelo estupro de mais de 50 mulheres e pelo assassinato de 25 delas. Ele respondia a anúncios de mulheres que precisavam de consertos em casa e, se elas estivessem sozinhas, as estuprava.
Pode parecer ainda mais estranho, mas o site do Departamento de Correições do Tennessee registra condenações a múltiplas penas de morte: oito casos de duas penas de morte, quatro casos de três penas de morte e um caso de seis penas de morte.
A lógica americana das múltiplas penas de prisão perpétua
O site jurídico FindLaw explica que, apesar de tais sentenças parecerem estranhas, elas são decorrentes do veredicto do júri, que pode decidir que o réu é culpado de múltiplas acusações de crimes e o juiz tem de aplicar uma sentença obrigatória, de acordo com as diretrizes de sentenças, para cada uma delas. Assim, se o réu for condenado pelo júri por 10 crimes que requerem pena de prisão perpétua, o juiz vai aplicar essa pena para cada um deles.
O site jurídico Nolo apresenta outra lógica: um réu sentenciado à pena de prisão perpétua, sem direito a livramento condicional, pode recorrer a um tribunal superior e conseguir anular a condenação, com base, por exemplo, em erro processual ou porque o promotor escondeu uma prova a seu favor no processo de discovery — ou por qualquer outra razão.
Mas se ele for condenado a múltiplas penas de prisão perpétua consecutivas, mesmo que uma seja anulada, ele continuará preso — provavelmente para sempre. Normalmente, múltiplas penas de prisão perpétua decorrem de condenações por homicídio de múltiplas vítimas.
No caso de réus sentenciados à prisão perpétua, mas com direito a livramento condicional, o termo "perpétua" é inapropriado, segundo o Nolo, porque o preso pode conseguir liberdade condicional após 20, 25 ou 40 anos de prisão. Assim, um réu que for condenado a duas prisões perpétuas consecutivas, por dois homicídios, com direito a livramento condicional após 20 anos, irá passar pelo menos 40 anos na prisão.
Um réu pode escapar da pena de prisão perpétua, mas, mesmo assim, ser condenado, por exemplo, a 155 anos de prisão, se ele for condenado por nove acusações com penas consecutivas de 15 anos para cada uma e por duas outras acusações, com penas consecutivas de 10 anos para cada uma. Isso acontece mais em casos de crimes contra a liberdade sexual, principalmente quando envolvem menores de idade.
Por João Ozorio de Melo
Fonte: Conjur
Postar um comentário
Agradecemos pelo seu comentário!