Entidades e juristas criticam decisão do STJ de planos de saúde não cobrirem procedimentos fora da lista da ANS

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Via @portalg1 | A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, nesta quarta-feira (8), que as operadoras dos planos de saúde não precisam cobrir procedimentos que não constem na lista da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A decisão abarca a cobertura de exames, terapias, cirurgias e fornecimento de medicamentos, por exemplo.

Entidades de saúde e defesa do consumidor criticaram a decisão. "Apesar de toda a união da sociedade pelo rol exemplificativo, os ministros do STJ decidiram por 6 votos a 3 pelo entendimento taxativo mitigado do rol da ANS. Dessa forma, as operadoras poderão negar tratamentos e procedimentos indicados por médicos, mas que estejam fora do rol", escreveu o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) no Twitter nesta tarde.

Para Marina Paulelli, advogada do programa de saúde do IDEC, a decisão é um retrocesso e vai prejudicar o consumidor, além de levar a mais processos judiciais. "O STJ alterou a jurisprudência consolidada em favor de um entendimento que é bastante benéfico às operadoras. Na prática, se o consumidor receber uma prescrição ou orientação médica, as operadoras, em princípio, não são obrigadas a custear. E isso coloca o consumidor numa posição de vulnerabilidade diante das operadoras", explica.

Para ela, a decisão é contraditória uma vez que o tribunal diz que a lista da ANS é taxativa, mas prevê exceções para a cobertura. O entendimento é compartilhado pelo Defensor Público Federal Antonio de Maia e Pádua. “Ou o rol é fechado ou não é. Não dá pra ser os dois ao mesmo tempo. Na prática, o rol será considerado fechado pelos planos e toda e qualquer exceção será discutida na justiça, o que quer dizer maior volume de processos e sobrecarga do judiciário.”

Segundo a advogada, o consumidor terá seu tratamento colocado em risco ao ter que defender que seu caso se adequa às exceções previstas.

“A partir de agora, as operadoras terão mais resistência às ações judiciais de urgência. A judicialização vai aumentar porque esse é um dos temas mais reclamados no judiciário. Os estudos mostram que a negativa de cobertura é totalmente indevida. Isso significa que o processo é iniciado não por insistência infundada do consumidor, mas pelo fato de as operadoras negarem procedimentos que são necessários para o tratamento”, afirma Paulelli.

Outra consequência, segundo os advogados, é uma sobrecarga do Sistema Único de Saúde (SUS).

"As operadoras desde já deixam de cobrir procedimentos que são largamente praticados pelo SUS. Isso vai causar uma sobrecarga no sistema e aumentar ainda mais a diferença entre o sistema público e o privado", diz a advogada.

O Conselho Nacional de Saúde (CNS) também se posicionou contra o rol taxativo. O conselho encaminhou, na última terça (7), uma recomendação ao STJ, para que julgassem pelo entendimento de que o rol de procedimentos da ANS tivesse caráter. "O rol é uma lista usada como referência básica para a cobertura de tratamentos pelos planos de saúde. A decisão pelo caráter taxativo pode afetar negativamente a vida de milhões de pessoas", disse o órgão em nota.

Para o jurista Fernando Capez, que ocupou a presidência do Procon de São Paulo por três anos, diz que a decisão é favorável às empresas de plano de saúde, mas não ao consumidor. "Essa mudança de entendimento sujeita o consumidor à limitação imposta pela ANS, o que é preocupante, na medida em que a essa agência reguladora historicamente tem sido muito conservadora na defesa dos interesses dos consumidores e tolerante com as operadoras. A decisão não vai reduzir a judicialização, pois a tendência é de que as instâncias inferiores continuem garantindo o direito dos consumidores, com base na presunção legal de sua vulnerabilidade", diz.

Já a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) considera a decisão positiva. Segundo a entidade, ela garante "a segurança do paciente, além da segurança jurídica e da sustentabilidade dos planos de saúde". "É importante destacar que o rol de cobertura da ANS é amplo, conta com mais de 3300 itens, e prevê a cobertura para todas as doenças listadas na CID da Organização Mundial da Saúde (OMS)."

Entenda decisão

O entendimento de que a lista é taxativa deve ser modulado pelos ministros do STJ para admitir algumas exceções – por exemplo, terapias recomendadas expressamente pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), tratamentos para câncer e medicações "off-label" (usadas com prescrição médica para tratamentos que não constam na bula daquela medicação).

A tese considerada correta pela maioria dos ministros foi proposta pelo ministro Villas Boas Cuêva e incorporada ao voto pelo relator, Luis Felipe Salomão. Em resumo, o entendimento do STJ é de que:

  • o rol da ANS é, em regra, taxativo;

  • a operadora não é obrigada a custear um procedimento se houver opção similar no rol da ANS;

  • é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de um aditivo contratual;

  • não havendo substituto terapêutico, ou após esgotados os procedimentos incluídos na lista da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente.

Para que essa exceção prevista no quarto tópico seja aplicada, é preciso que:

  • a incorporação do tratamento desejado à lista da ANS não tenha sido indeferida expressamente;

  • haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências;

  • haja recomendação de órgãos técnicos de renome nacional, como a Conitec e a Natijus, e estrangeiros;

  • seja realizado, quando possível, diálogo entre magistrados e especialistas, incluindo a comissão responsável por atualizar a lista da ANS, para tratar da ausência desse tratamento no rol de procedimentos.

Fonte: g1.globo.com

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