Monitorar celular de outra pessoa pode dar prisão no Brasil?

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Via @canalcienciascriminais | “Stalkerware”, uma junção de stalking e spyware, é o termo utilizado para definir a prática de espionagem de celular ou computador alheio. Diante disso, independente do motivo, esse ato configura-se como crime previsto em lei.

Tal violação pode ocorrer por meio de aplicativos espiões que permitem ter o acesso total ao dispositivo da vítima, além de permitir tirar fotos e gravar áudios e ligações. No entanto, também é considerado crime mexer no celular de outra pessoa sem autorização.

Legislação brasileira sobre crime de espionagem de celular

  • Artigo 10 da lei 9.296: “Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática [à distância], promover escuta ambiental ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei”. Com pena de reclusão de 2 a 4 anos e multa.

  • Artigo 154-A do Código Penal (criado pela lei Carolina Dieckmann, n° 12.737/2012): “Invadir dispositivo informático de uso alheio, conectado ou não à rede de computadores, com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do usuário do dispositivo ou de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita”. Com pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa.

  • Artigo 147-A do Código Penal (criado pela lei do Stalking, n° 14.132/2021): “Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade”. Com pena de reclusão de 6 meses a 2 anos e multa.

De acordo com Iolanda Garay, presidente da Associação Nacional das Vítimas de Internet (ANVINT),”nós entramos na esfera das garantias constitucionais. Você rompe a privacidade, a intimidade, você rompe o sigilo bancário, você rompe até a imagem daquela pessoa, porque você tem acesso a outras imagens que você pode vir a usar, de momentos muito privados, que podem ser até sexuais”.

Como funciona a espionagem?

Atualmente, é possível enganar um usuário para clicar em um link e baixar um aplicativo espião, capaz não só de coletar dados, mas também de assumir o controle do seu dispositivo. No entanto, a presidente da ANVINT diz que a tecnologia que permite esse download à distância é muito cara e, por isso, pouco usada por bandidos, sendo mais comum em investigações policiais, diz Iolanda.

Dessa forma, os criminosos precisam ter acesso ao celular ou computador da vítima presencialmente para conseguir infectá-lo.

“O namorado, marido, o espião, ele quer ter acesso, controlar a vida daquela pessoa. Daí ele entrega um presente já ‘batizado’ para ela. O celular vem lacrado e não tem como ela saber que está infectado, se ela não fizer uma checagem”, explica Iolanda.

Além disso, se o espião convive diariamente com a vítima, ele pode aproveitar momentos em que o celular está desbloqueado para baixar um aplicativo espião.

O perito especialista em crimes de internet, Wanderson Castilho, afirma que apesar do celular estar bloqueado, o espião terá o controle total do aparelho. Assim, ele pode, por exemplo, ligar a câmera, o microfone, fazer gravações, acessar a localização, o e-mail e até aplicativos bancários, explica Wanderson Castilho, perito especialista em crimes de internet.

De acordo com Iolanda, normalmente, o bandido fará a invasão no celular com outro crime em vista, como divulgar fotos nuas da vítima ou a humilhar para conseguir senhas bancárias e desviar valores.

O celular dá sinais de que está infectado?

Quase sempre, o software espião não aparece na bandeja de aplicativos, dificultando a identificação pela vítima, explica a advogada Patrícia Peck, especializada em crimes cibernéticos.

Mas, algumas coisas podem começar a ficar estranhas no aparelho, aponta Wanderson.

É crime independente de quem está espionando?

Acesso à celular de parceiro ou parceira

Para que um parceiro tenha acesso livre ao dispositivo, é preciso ter um acordo prévio entre o casal, ainda que seja apenas verbal. Caso contrário, é crime.

Além disso, a intenção também importa. Se a pessoa acessou o celular da vítima propositalmente para descobrir uma traição ou informações bancárias, por exemplo, é crime.

Outro ponto é que este tipo de violação precisa ser denunciado pela vítima em uma delegacia, o que só acontece em casos extremos, como em meio a um divórcio, quando, normalmente, a vítima tem coragem de levar o caso à Justiça.

Acesso de pais aos celulares de filhos

Em relação aos pais, a lei permite o uso de aplicativos que os ajudam a manterem um controle sobre a vida virtual dos filhos menores de idade, diz a advogada.

Todavia, Iolanda acredita que é preciso ainda discutir limites para isso, principalmente, quando o adolescente inicia a vida sexual, já que o celular poderia estar presente – e gravando – os momentos de intimidade sem conhecimento dos jovens.

O Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) garante a privacidade: “a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada”, de acordo com a lei 8.069/1990.

Além disso, o uso da câmera em momentos mais íntimos da criança, como ao tomar banho, também pode ser encarado como pedofilia, aponta a especialista.

“Então temos um conflito de direitos e garantias fundamentais. Os juristas devem contrapesar isso”, afirma Patrícia Heck.

Celular corporativo

Para que a empresa possa ter controle total do dispositivo usado pelo funcionário, a lei exige que ele seja informado sobre as condições desse monitoramento. Por exemplo, se a instituição possui a permissão para acessar a câmera do celular ou ler conversas do empregado.

O que fazer se for vítima de invasão?

Caso suspeite que seu celular está sendo espionado, é necessário que o aparelho seja levado a um perito especializado em crimes cibernéticos, para que ele possa investigar se há algum aplicativo estranho no dispositivo.

Se for constatada a ilegalidade, por meio da prova, a vítima pode registrar um boletim de ocorrência em uma delegacia e pedir a apresentação ao Ministério Público.

De acordo com o perito Wanderson Castillo, é recomendado ainda que, quando uma pessoa receber um celular de presente, ela se realize o reset de fábrica do aparelho. Assim, possíveis aplicativos escondidos serão deletados do dispositivo.

Correio Notícia
Por Igor Serpa Martins
Fonte: @canalcienciascriminais

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