Vítima não deve ser intimada várias vezes até representar, diz STJ

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Via @consultor_juridico | A Justiça não deve intimar inúmeras vezes a vítima para que ela apresente representação contra o réu.

Com esse entendimento, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Messod Azulay trancou ação penal contra dois empresários acusados de integrar organização criminosa e de praticar estelionato.

No processo, consta que, em 2017, o Ministério Público do Mato Grosso do Sul denunciou os empresários por terem se associado “de forma estável e permanente, integrando uma organização criminosa estruturalmente ordenada e mediante divisão de tarefas, com o objetivo de obter vantagens de natureza pecuniária e patrimonial”. Os crimes teriam sido praticados ao longo daquele ano, mas o parquet não apresentou os detalhes da prática delituosa.

A investigação desencadeou a operação “ouro de ofir” pela Polícia Federal sul-mato-grossense, amplamente noticiada pelos veículos de comunicação. À época, os investigadores estimaram que cerca de 25 mil pessoas teriam sido vítimas dos acusados. A PF chegou a criar um formulário online para conseguir atender tantas pessoas.

No entanto, ao longo do processo, o MP só apontou três vítimas: uma foi descartada pelo tribunal de origem; uma prestou depoimento dizendo que os valores que havia investido no negócio dos acusados foram devolvidos e depois nunca mais foi localizada; a última disse que representaria contra os acusados dois anos depois da primeira intimação, após ser consultada uma segunda vez.

No recurso ao STJ, a defesa apontou decadência do direito de representação das vítimas e inépcia da denúncia ao descrever o crime de organização criminosa.

Em sua decisão, o ministro Messod Azulay constatou violação do princípio da duração razoável do processo e ameaça à segurança jurídica dos réus. Para ele, não há justificativa para uma segunda intimação de vítima que já foi contatada: “Não se pode conceber que a vítima seja intimada para representação por diversas vezes até entender que deve representar”.

O magistrado lembrou que a 5ª Turma do STJ só exige a manifestação inequívoca de uma vítima para a procedibilidade de acusações por estelionato, mas apontou que nem isso o caso em análise conseguiu: “Imperioso o trancamento da ação penal pelo crime de estelionato se já houve tentativa de intimação da vítima por cinco anos e até o momento não foi oferecida a representação, imprescindível para a persecução penal”.

Sobre a denúncia por organização criminosa, o ministro apontou que o MP se limitou a descrever genericamente os crimes imputados, sem individualizar as condutas ou fornecer informações sobre a estrutura criminosa.

“Melhor analisando o caso concreto, a denúncia se inicia com a repetição dos termos previstos genericamente no artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013. Ao discorrer sobre a prática delitiva de organização criminosa, contém narrativa demasiadamente genérica e não descreve qual a estruturação ordenada da suposta organização criminosa, nem a divisão de tarefas, de maneira suficiente a permitir o pleno exercício da defesa dos acusados. Veja-se que não há sequer a descrição efetiva do elemento subjetivo do tipo, nem do local onde os crimes seriam praticados e também não há menção ao real vínculo estável entre os sujeitos”, expôs.

“Não se pode admitir que a imputação do crime de organização criminosa seja efetuada com tamanha generalidade, o que dificulta o seu rebatimento pela defesa, haja vista a indeterminação dos fatos atribuídos”, concluiu o ministro.

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  • HC 197.235

Mateus Mello
Fonte: @consultor_juridico

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