Coronavírus: extinção do contrato de trabalho por força maior e factum principis

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bit.ly/2xkSeeu | Com a disseminação do coronavírus (COVID-19) e a interrupção temporária das atividades comerciais não essenciais, determinada pelo governo como medida de enfrentamento à essa proliferação do vírus, e ainda, a decretação de estado de calamidade pública (decreto legislativo nº 06/2020) até 31 de dezembro de 2020, que está causando verdadeiro pânico tanto nos empresários quanto nos trabalhadores, a única certeza que se tem é que esse período impactará sensivelmente nas relações de emprego.

Empresas vão fechar as portas, outras tampouco conseguirão se reerguer, e o trabalhador sentirá na pele esses reflexos.

Diante disso, foi editada a MP 927/2020, para normatizar e definir que o estado de calamidade pública ocasionado pelo coronavírus (COVID-19) é hipótese de força maior, para fins trabalhistas, nos termos do artigo 501 da CLT (art. 1º, § único da MP 927/2020), além de editar outras medidas para frear o desemprego em tempos de crise e histeria.

Já tratamos ponto a ponto da MP 927/2020 e seus impactos nas relações de emprego, neste link.

Nem a edição da medida provisória sanou todas as dúvidas e possibilidades que podem as empresas adotar em relação aos funcionários, inclusive sendo autorizado pelo artigo 2º da MP a adoção de outras medidas que visem garantir o emprego, desde que feitas através de acordo escrito com anuência do empregado, dando, inclusive, preponderância do acordo individual escrito à legislação trabalhista, acordos e convenções coletivas.

Mas o empregador, diante de todo esse caos, pode extinguir o contrato de trabalho com fundamento em força maior, já que a MP visa manter o emprego?

Bem, o momento delicado requer razoabilidade e proporcionalidade por parte dos empregadores ao tratar do assunto.

Apesar de a Medida Provisória tentar promover a manutenção do emprego, trazendo várias possibilidades e flexibilizações que podem ser utilizadas pelos empregadores, ainda assim, se tais medidas não forem suficientes e as empresas tiverem que extinguir contratos de trabalho, poderão fazê-lo por motivo de força maior, com base no artigo 501 da CLT e artigo 1º, §único da MP 927/2020.

Aí surge o seguinte questionamento tanto por parte de empregadores e empregados:

Quais verbas deverão ser pagas na extinção do contrato por motivo de força maior?

O motivo de força maior, não elimina, por completo, o dever de quitação dos direitos decorrentes da extinção do contrato de trabalho, há apenas uma redução do montante devido ao empregado, devendo ser pagos:

-Saldo salarial;

-Férias vencidas e proporcionais +1/3;

-13º salários vencidos e proporcionais;

-Indenização compensatória de 20% sobre o saldo do FGTS (art. 18, § 2º da Lei 8.036/90);

-Levantamento do saldo do FGTS;

Portanto, não há pagamento de aviso prévio, a indenização compensatória sobre os depósitos do FGTS cai de 40% para 20% e a extinção do contrato por motivo de força maior não é hipótese legal de habilitação no seguro-desemprego, posto que não constante do artigo da Lei 7.998/90.

Pode-se perguntar ainda o empregador, se tem ele responsabilidade sobre o pagamento das rescisões já que não foi ele quem deu causa à cessação do contrato de trabalho, mormente pelo fato de a empresa ter paralisado suas atividades por determinação do Estado. Esse é o chamado factum principis, do qual falaremos acerca da responsabilidade estatal nestes casos.

factum principis e a responsabilidade pelas verbas rescisórias do trabalhador.

O fato do príncipe, é um instituto oriundo do Direito Administrativo, e segundo Hely Lopes Meirelles:

“é toda determinação estatal, positiva ou negativa, geral, imprevista ou imprevisível, que onera substancialmente a execução do contrato administrativo. Essa oneração, obriga o Poder Público a compensar os prejuízos suportados pela outra parte, e caso esta seja impossível, rende ensejo à rescisão do contrato e as indenizações cabíveis” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 26. Ed. Atual. São Paulo: Malheiros, 2001, p.229).

Está previsto na CLT em seu artigo 486, que diz:

“No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável”.

O fato do príncipe é espécie do gênero força maior, restando para sua configuração um evento inevitável e imprevisível e que o empregador não tenha concorrido para que este se realize.

Na cessação dos contratos de trabalho por factum principis, são devidas todas as verbas rescisórias, como se dispensado imotivadamente o empregado fosse.

E, conforme redação do artigo 486 da CLT, o ente responsável arcará com o pagamento da indenização.

Essa indenização referia-se àquelas previstas nos artigos 477, 478 e 496 e 498 da CLT (por tempo de serviço), sendo substituídas pelo sistema do FGTS, que passou a ser obrigatório com a Constituição Federal de 1988, o que vale dizer então que a interpretação do artigo 486 da CLT em consonância com a CF/88 é de que a indenização devida pelo ente estatal é somente a indenização compensatória de 40% sobre o saldo total do FGTS.

Daí, portanto, poder-se-ia discutir judicialmente, a responsabilidade estatal em relação à indenização compensatória de 40% sobre FGTS, não sendo esta de responsabilidade do empregador na cessação do contrato por fato do príncipe.

Sendo, pois, de responsabilidade do empregador:

-Saldo salarial;

*-Aviso prévio;

-Férias vencidas e proporcionais +1/3;

-13º salários vencidos e proporcionais;

-Fornecimento de chave de conectividade para levantamento do saldo do FGTS;

-Fornecimento das guias para habilitação no seguro-desemprego;

*Sobre o aviso prévio indenizado, há de se fazer uma ressalva, já que há entendimentos jurisprudenciais no sentido de que é responsabilidade da administração pública e no sentido de que é responsabilidade do empregador.

O tema já foi enfrentado pelo TRT-18 / Goiás e o entendimento fixado é de que o aviso prévio é de responsabilidade também da administração pública:

(“FACTUM PRINCIPIS”. DESAPROPRIAÇÃO. RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. MULTA DE 40% DO FGTS. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - RO 0001757-58.2013.5.03.0036 TRT-18)

Além disso, sempre bom lembrar que a cessação coletiva dos contratos de trabalho por factum principis, deve ser feita através de instrumento coletivo, para que se evite maiores problemas e discussões judicias.
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Arthur Fortunato
Arthur Batista Fortunato Coelho, formou-se bacharel em Direito pelas Faculdades Aphonsiano no ano de 2013. Aprovado no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil no mesmo ano, recebendo a inscrição de número 38.779/GO. É pós-graduado em Direito do Trabalho e Previdenciário pelo Instituto Proordem de Goiânia-GO. É pós-graduando em Direito Previdenciário e MBA na mesma área pela Academia Jurídica/Universidade Cândido Mendes-RJ. Tem larga experiência em demandas trabalhistas e demandas contra o INSS, em favor dos empregados e dos segurados da previdência.
Fonte: arthurbfc.jusbrasil.com.br

2/Comentários

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  1. Entendo que art. 501 não pode ser utilizado fora do contexto do capítulo que fala sobre necessidade de extinção da empresa, não apenas a força maior. Grande chance de ser reformado se questionado na JT

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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