A juíza argumentou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já determinou que a participação e promoção de eventos como a “Marcha da Maconha”, a qual envolve publicação de textos, imagens e realização de reuniões públicas, não constitui apologia ao crime, mas sim a manifestação legítima da liberdade de expressão do pensamento no Estado de Direito.
A magistrada ainda mencionou que em decisão recente no âmbito do RE 635659
(Tema 506), o STF fixou que o porte da substância cannabis sativa para uso pessoal não constitui ilícito penal. Para ela, a conduta da Administração que culminou no ato de reprovar o candidato violou os princípios constitucionais da legalidade, razoabilidade e liberdade de expressão, comportando intervenção do Judiciário.
O homem prestou concurso para a carreira de PM e, após aprovação nas demais fases do certame, foi reprovado na etapa de investigação social. Nos autos, ele alega que a reprovação ocorreu sem qualquer fundamentação, visto que nunca apresentou conduta inadequada, não havendo assim qualquer fato a desabonar sua vida social. Além disso, sustenta que sua exclusão do concurso por um motivo infundado gerou prejuízos de ordem moral, razão pela qual requereu o pagamento de indenização em R$ 80 mil por danos morais.
Em contestação, a Fazenda Pública defendeu a legalidade da decisão de exclusão do concurso considerando a apuração administrativa de que o homem não possui os predicativos indispensáveis ao cargo, conforme apurado na investigação sigilosa e com base nos princípios administrativos constitucionais, tais como eficiência e moralidade.
Ao analisar o caso, a magistrada negou o requerimento de indenização por danos morais por considerar que não há elementos suficientes acerca da existência do dano e muito menos do nexo de causalidade. Além disso, pondera que o concurseiro fundamenta o seu pedido de indenização apenas na reprovação supostamente imotivada, o que representa um "mero dissabor e não possui o condão de acarretar a condenação da Administração Pública ao pagamento de indenização de dano moral".
Quanto à exclusão do homem do certame na etapa de investigação social, destacou que a Administração é livre para estabelecer as bases do concurso e os critérios de julgamento, desde que respeite o princípio da isonomia, tratando com igualdade todos os candidatos. "Assim, cabe tão somente ao juiz verificar se a Administração perfilhou o caminho da legalidade, sob pena de afronta à divisão tríade dos Poderes Constitucionais", afirmou a juíza.
Na sentença, ela pontua que a admissão de soldados PM de 2ª classe é regida pelas regras editalícias, que estipulam fase de comprovação de idoneidade e conduta ilibada na vida pública e na vida privada como eliminatória no concurso, tendo o edital pormenorizado e especificado tais regras. Entretanto, entendeu que a decisão de reprovar o candidato fere o princípio da razoabilidade, legalidade e liberdade de expressão a reprovação de candidato apenas por conta da publicação mencionada.
"O fato descrito não possui materialidade de qualquer conduta desabonadora à reputação e à idoneidade moral e, ademais, não se subsome às regras editalícias utilizadas para fundamentar a reprovação, visto que o ato não constitui 'incitação, exaltação ou apologia a atos criminosos', e tampouco 'comportamento que possa comprometer a função de segurança pública ou confiabilidade da Polícia Militar do Estado de São Paulo”, afirmou Cometti.
A juíza ressalta em sua sentença que o candidato reprovado serviu nas Forças Armadas por mais de três anos, fazendo jus ao Diploma de Honra ao Mérito e Carta de Apresentação, certificando-se que demonstrou conduta moral irrepreensível. "A referida publicação do autor em rede social, dissociada de qualquer materialidade desabonadora, não pode constituir fundamento isolado para afastar a reputação ilibada atestada pelo Ministério da Defesa", concluiu a magistrada.
O processo tramita com o número 1078454-12.2023.8.26.0053 no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). O estado de São Paulo já recorreu da decisão.
Mirielle Carvalho
Fonte: @jotaflash
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