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STF: Maioria invalida reajuste por idade em planos de saúde antigos

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Via @portalmigalhas | Nesta quarta-feira, 8, o plenário do STF entendeu pela impossibilidade de reajustes por faixa etária em planos de saúde firmados antes da entrada em vigor do Estatuto do Idoso (lei 10.741/03).

O caso havia sido iniciado no plenário virtual, mas ministro Gilmar Mendes pediu destaque, levando o processo ao julgamento presencial.

Na sessão desta tarde, após as sustentações orais, o decano da Corte proferiu voto e formou-se maioria de sete a dois pela impossibilidade dos reajustes.

Apesar da maioria formada, o presidente do STF, ministro Edson Fachin, não proclamou o resultado. Isso porque tramita no plenário virtual, em paralelo, a ADC 90, sobre tema semelhante, e atualmente suspensa por pedido de vista do ministro Flávio Dino.

O resultado final será anunciado oportunamente, de forma conjunta, no plenário físico.

Estado da arte

Ao votar, ministro Gilmar Mendes acompanhou o entendimento da então relatora, ministra Rosa Weber (hoje aposentada), para invalidar os reajustes por faixa etária e negar provimento ao recurso do plano de saúde.

O voto da relatora já havia sido seguido, no plenário virtual, pelos ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, também aposentados.

Na sessão desta quarta, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia reafirmaram o posicionamento contrário aos reajustes, consolidando a maioria.

Divergiram da relatora os ministros Marco Aurélio (atualmente aposentado) e Dias Toffoli.

Por terem ingressado na Corte após os votos dos ministros aposentados, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Nunes Marques e André Mendonça não participaram da votação.

Também ficaram fora do julgamento Luís Roberto Barroso, que se declarou suspeito, e Luiz Fux, que está impedido.

Veja o placar:

Pode haver reajuste por faixa etária em planos de saúde anteriores ao Estatuto do Idoso?

Table with 5 columns and 11 rows. (column headers with buttons are sortable)
MinistrosSimNãoSuspeito
Rosa WeberX
Cármen LúciaX
Celso de MelloX
Alexandre de MoraesX
Gilmar MendesX
Edson FachinX
Ricardo LewandowskiX
Dias ToffoliX
Marco AurélioX
Luís Roberto BarrosoX
Luiz FuxX

Entenda

No caso concreto, consumidora contratou plano de saúde em 1999 - na vigência da lei dos planos de saúde -, portanto antes do Estatuto do Idoso.

No contrato constaria, de forma clara, que são estabelecidas sete faixas etárias, cada uma com determinada variação de percentual sobre o valor básico.

Em outubro de 2005, a consumidora teve reajustada a mensalidade, conforme o contrato, pelo ingresso na faixa etária dos 60 anos. Por essa razão, ela pediu judicialmente a aplicação do Estatuto do Idoso ao caso, a fim de não ter que pagar qualquer reajuste.

A Justiça gaúcha julgou procedente o pedido para declarar abusivos, à luz do estatuto, os aumentos na mensalidade do plano de saúde em função da idade. O TJ/RS manteve o entendimento.

No entanto, a operadora de saúde sustentou que o acórdão questionado, ao aplicar retroativamente o Estatuto do Idoso ao ato jurídico perfeito (contrato), ofendeu a regra constitucional contida no art. 5º, XXXVI, da CF, segundo o qual "a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito".

Sustentações orais

O advogado Marco Túlio De Rose, da banca De Rose Advogados, representante da ré, Unimed, defendeu a validade do reajuste por faixa etária em contratos de plano de saúde firmados antes da entrada em vigor do Estatuto do Idoso.

Sustentou que o contrato previa expressamente a majoração ao atingir 70 anos, conforme a resolução 6 do Conselho Nacional de Saúde Suplementar e o art. 15 da lei 9.656/98, e que a aplicação retroativa do Estatuto violaria o ato jurídico perfeito e a segurança jurídica.

Em nome da ANS, o procurador Federal André Rufino do Vale afirmou que o setor é regido há mais de duas décadas por um sistema normativo estável, construído com base em precedentes do STF, como a ADIn 1.931, que afastou a retroatividade da lei dos planos de saúde.

Defendeu que os contratos firmados antes de 2004 seguem regidos por suas cláusulas originais, enquanto os posteriores já preveem proibição de reajuste por idade para beneficiários acima de 60 anos. Aplicar o Estatuto de forma retroativa, disse, romperia a segurança jurídica e desorganizaria o equilíbrio regulatório do setor.

O advogado José Eduardo Cardozo, pela Fenasaúde, reforçou que o Estatuto do Idoso não pode incidir sobre contratos anteriores à sua vigência, sob pena de violar o direito adquirido.

Argumentou que a CF e a LINDB asseguram a ultratividade das leis anteriores, impedindo que novas normas atinjam contratos em curso. Cardozo alertou para os riscos econômicos e sociais de uma decisão contrária, que poderia levar à falência de operadoras e pressionar o SUS.

Pelo Idec - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, o advogado Walter José Faiad de Moura defendeu a aplicação do Estatuto do Idoso aos contratos, inclusive os firmados antes de 2004, quando houver reajustes abusivos ou discriminatórios.

Sustentou que os planos de saúde são contratos de trato sucessivo, renovados anualmente, o que autoriza a incidência imediata de normas de ordem pública em favor do consumidor.

Criticou a falta de transparência da ANS e afirmou que os aumentos abusivos, e não os direitos dos idosos, são o verdadeiro fator de desequilíbrio do setor.

Por fim, o defensor público Hélio Soares Júnior, da DPE/BA, falou em nome do GAETS - Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores, defendendo que os reajustes por faixa etária após 2004 devem observar o Estatuto do Idoso, ainda que o contrato tenha sido firmado anteriormente.

Considerou o aumento de 77% aplicado à consumidora idosa como "expulsão disfarçada" e violam a dignidade humana. "O nome disso é abandono em forma de boleto", disse.

Ainda, afirmou que o Estatuto representa "a Constituição em movimento", destinada a proteger a dignidade e o bem-estar das pessoas idosas.

Voto da relatora

No plenário virtual, a então relatora, ministra Rosa Weber (atualmente aposentada) entendeu que os contratos de planos de saúde configuram relação de consumo duradoura e, portanto, estão sujeitos à cláusula de não discriminação prevista no Estatuto do Idoso, que assegura tratamento isonômico a pessoas com 60 anos ou mais.

Segundo a ministra, o advento do estatuto alcança inclusive contratos anteriores, se o implemento da idade ocorreu após sua vigência. 

Assim, o estatuto "transforma quem era apenas consumidor em consumidor-idoso e, como tal, merecedor de especial proteção".

Rosa Weber negou provimento ao recurso e propôs a seguinte tese:

"A garantia constitucional do ato jurídico perfeito não elide a incidência da Lei 10.741/2003 - a vedar a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade -, quando o ingresso em faixa etária diferenciada for posterior à vigência do denominado Estatuto do Idoso (1º.1.2004), ainda que se trate de contratos de plano de saúde anteriormente firmados."

Voto vogal

Ainda no plenário virtual, ministro Alexandre de Moraes também votou por negar provimento ao recurso, mas por fundamentos distintos. 

Para S. Exa., o reajuste de mensalidades em contratos firmados antes do Estatuto do Idoso é válido, desde que respeite as faixas etárias e limites definidos pela ANS.

Moraes destacou que os contratos anteriores já estavam sujeitos a alterações decorrentes de normas da época e que, desde então, havia preocupação legal em evitar discriminação a idosos. 

Segundo o ministro, desde que obedecidos os marcos etários fixados pelos órgãos reguladores, não há falar em discriminação se o reajuste estiver calcado dentro dos limites da razoabilidade.

Divergência - I

Ministro Marco Aurélio (atualmente aposentado), abriu divergência no plenário virtual e votou pelo provimento do recurso, reconhecendo a validade da cláusula contratual que previa reajuste por idade. 

Para S. Exa., aplicar o Estatuto do Idoso a contratos anteriores viola a CF, ao desrespeitar o ato jurídico perfeito.

À época, propôs a seguinte tese:

"Surge incompatível, com a Constituição Federal, a observância do Estatuto do Idoso em relação a contrato de plano de saúde firmado em momento anterior à vigência do diploma."

Segundo Marco Aurélio, o TJ/RS, ao determinar a aplicação do Estatuto, extrapolou as balizas constitucionais, substituindo a vontade dos contratantes por regras não pactuadas.

Divergência - II

Ministro Dias Toffoli, que havia pedido vista e devolveu o processo, também votou pelo provimento do recurso, alinhando-se à divergência de Marco Aurélio.

Toffoli sustentou que a aplicação do Estatuto do Idoso a contratos firmados antes de sua vigência configuraria retroatividade indevida.

Para o ministro, aplicar o Estatuto a contratos anteriores ofende o art. 5º, XXXVI, da CF, que protege o ato jurídico perfeito e o direito adquirido.

"[...] na linha da jurisprudência firmada por esta Corte, entendo não ser admissível a incidência das normas do Estatuto do Idoso aos contratos firmados antes de sua vigência, nem mesmo para alcançar os efeitos pendentes de tais contratos - naquilo que se estabeleceu conforme a vontade das partes e em consonância com as normas vigentes quando da celebração do ajuste - sob pena de se conferir à Lei nº 10.741/2003 certo grau de retroatividade, ainda que mínimo, o que, a meu ver, ofende o art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal", concluiu Toffoli.

Voto do decano

Nesta quarta-feira, 8, ministro Gilmar Mendes acompanhou a relatora para declarar inválidos os reajustes por faixa etária em planos de saúde firmados antes da vigência do Estatuto do Idoso.

O voto partiu da constatação de que a própria legislação - tanto a lei 10.741/03 quanto sua atualização pela lei 14.423/22 - veda expressamente a discriminação do idoso pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade, sem qualquer modificação de conteúdo normativo.

Ao abordar a aplicação da lei no tempo, Gilmar Mendes recorreu à clássica distinção doutrinária entre retroatividade máxima, média e mínima, inspirada no voto do ministro Moreira Alves na ADIn 493 e na lição de Matos Peixoto e Baptista Machado.

Para o ministro, a hipótese em análise se enquadra na chamada retroatividade mínima - aquela em que a lei nova incide apenas sobre os efeitos futuros de relações jurídicas em curso, sem atingir atos passados ou direitos adquiridos.

Assim, como os contratos de plano de saúde são de trato sucessivo, as novas normas devem incidir a partir de sua vigência, alcançando os reajustes posteriores, o que não ofende o ato jurídico perfeito.

Gilmar Mendes ressaltou que, antes do Estatuto, era comum que consumidores idosos - em grande parte aposentados - se vissem obrigados a escolher entre pagar mensalidades majoradas, abrir mão do plano ou ajuizar ações judiciais para discutir aumentos desproporcionais.

Tal cenário, segundo o ministro, contraria o art. 230 da CF, que impõe à família, à sociedade e ao Estado o dever de amparar os idosos, garantindo-lhes dignidade, bem-estar e o direito à vida.

Para S. Exa., a majoração excessiva compromete o mínimo existencial e pode levar ao superendividamento, realidade reconhecida pela lei 14.181/21, que atualizou o CDC.

O ministro também analisou o marco regulatório da ANS, especialmente a resolução normativa 63/03, que limita o último reajuste por idade aos 59 anos e fixa teto de seis vezes entre a primeira e a última faixa etária, além de restringir a variação das três últimas faixas.

Apesar de reconhecer que o sistema ainda prevê faixas de contribuição distintas, Gilmar Mendes observou que a CF e o Estatuto do Idoso proíbem qualquer diferenciação que resulte em ônus desproporcional aos consumidores mais velhos, sobretudo quando passam a demandar mais serviços de saúde e dispõem de menor renda.

Citando o Tema 952 do STJ, o ministro reconheceu que a Corte infraconstitucional admite reajustes por faixa etária em tese, mas dentro de limites técnicos e legais.

Para S. Exa., o princípio do mutualismo e o pacto intergeracional não legitimam a transferência indevida de custos às gerações mais idosas, devendo prevalecer o equilíbrio e a solidariedade sem discriminação econômica.

Por fim, Gilmar Mendes concluiu que o Estatuto do Idoso, por expressar norma de ordem pública e caráter protetivo, deve incidir sobre os contratos antigos apenas quanto aos efeitos futuros, reafirmando a tese da retroatividade mínima.

Assim, votou pelo desprovimento do recurso extraordinário, reconhecendo a ilegalidade dos reajustes etários em planos celebrados antes da lei, sempre que impliquem discriminação contra o idoso.

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/441847/stf-maioria-invalida-reajuste-por-idade-em-planos-de-saude-antigos

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